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“Não há solução rápida para a crise”, dizem especialistas europeus

Apesar das propostas de soluções para a grave crise em que mergulharam os principais países latino-americanos serem muitas, um time de peso de estudiosos europeus é unânime em afirmar que a região vai demorar para voltar a ter estabilidade.

Nessa equipe dos que não veem uma solução a curto prazo está Jean-Jacques Kourliandsky, pesquisador do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), com sede na França, que tem um amplo estudo sobre os problemas na região. Também integra o grupo Andrés Malamud, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, um estudioso de política latino-americana.

Kourliandsky e Malamud têm um mesmo diagnóstico para a crise dos países da América Latina: queda nas exportações matérias primárias, baixo preço do petróleo e a desaceleração da demanda chinesa. Veja a opinião dos dois pesquisadores:

 

Foto: Iris

Jean-Jacques Kourliandsky, cientista político, doutor em história e pesquisador do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), com sede na França.

 

Por que os países latino-americanos – Brasil, Venezuela, Argentina e outros – tiveram um período de crescimento e estabilidade, mas nos últimos dois anos entraram em uma grave crise política e econômica?

Os países latino-americanos exportadores de matérias primárias (agrícolas, energéticas, minerais) foram beneficiados pelo aumento dos preços uma dezena de anos. A crise nos EUA, a morosidade europeia, a desaceleração da demanda chinesa e a concorrência de gás de xisto, no entanto, provocaram uma reviravolta na conjuntura, mais fortemente entre 2010 e 2011. O valor do carvão, do cobre, do ferro, do óleo, etc., sofreu quedas brutais. A falta de investimento de parte do dinheiro ganho com as exportações de matérias-primas em setores produtivos com alto valor agregado levou os países da América Latina a entrarem em nova uma crise econômica, financeira e orçamental. A crise política e social é a consequência. Ela se aplica a todos os países, independentemente da sua orientação ideológica, a todos aqueles em que perpetua uma economia estritamente rentista (obtenção de lucro financeiro por meio da aplicação de capitais).

Alguns analistas dizem que o maior problema foram as políticas populistas. Outros analistas defendem as políticas populares e enfatizam as conquistas sociais, tais como a redução da pobreza e inclusão social. Quem está com a razão?

A crise que atinge os países da América Latina tem apenas marginalmente uma origem ideológica. Bolivarianos, liberais, todos eles seguiram as mesmas políticas econômicas. Todos eles obtinham renda a partir da exportação de matérias-primas. Uma parcela das receitas provenientes das exportações destes produtos foi investida no social. Isso vale para todos os países, sejam bolivarianos, como a Venezuela, justicialistas (peronistas), como a Argentina, ou liberais, como o Chile e o México. Mas os ganhos sociais dos anos de boom acabaram.

Qual é a solução mais rápida para esta crise?

Infelizmente não há nenhuma solução rápida. Os governos, quaisquer que sejam, precisam aprender a gerir o futuro, precisam superar a gestão do dia a dia. Isso requer a mobilização de recursos financeiros e intelectuais para construir os pilares de uma economia sustentável. Só ela pode permitir a superação de uma economia rentista. Resta uma emergência, que é a preservação da coesão social e a democracia. Isso implica um forte sentido de solidariedade nacional. Brasil e Venezuela em 2017 são vítimas do exercício e do egoísmo desestabilizador provocados por aqueles que agora detêm o poder em ambos os países.

 

Foto: Instituto Amaro da Costa

Andrés Malamud, cientista político e pesquisador do Instituto de Ciências Sociais, na Universidade de Lisboa, com estudos em política latino-americana.

 

Por que os países da América Latina tiveram uma década de crescimento econômico e ganhos sociais e agora mergulharam em uma grande crise?

Porque baixaram os preços dos recursos naturais que estes países exportam e porque diminuiu o crescimento da China, o seu maior importador.

A crise econômica é consequência exclusiva do impasse político que se instalou em vários países da América Latina, como o Brasil e a Venezuela?

Não, é o contrário: a crise política deriva da crise econômica. O mensalão acabou em pizza porque a economia estava a crescer e o Petrolão/Lava Jato derruba presidentes porque a economia afunda.

Muitos analistas afirmam que políticas populistas de governos de esquerda levaram à derrocada das economias de vários países na América Latina, especialmente na América do Sul. Outros, no entanto, rechaçam o termo populista e ressaltam políticas sociais, que propiciaram avanços como redução da pobreza, mais estudantes em universidades, melhores condições de saúde e conquistas em direitos civis. Quem está com a razão?

A década de bonança (mais ou menos entre 2002 e 2012) permitiu a implementação de políticas sociais redistributivas, o que foi bom, mas a política fiscal foi pró-cíclica (gastaram- se os altos rendimentos sem poupar nada e investindo pouco) e não criou condições para resistir uma etapa econômica adversa.

As soluções apontadas para sair da crise são políticas de austeridade, amargas para a maioria da população, com cortes de gastos em várias áreas, mudanças nas leis trabalhistas e na Previdência. Vários países da Europa viveram essa situação. Essa é a saída?

Sim e não. No Brasil, os salários e aposentadorias dos funcionários públicos são escandalosos e devem ser ajustados, mas sem crescimento econômico a crise não acaba. O problema é que o crescimento depende menos do que faça o governo e muito mais de condições externas como os juros dos EUA e o crescimento chinês.

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