O empresário Milton Ribeiro, diretor da Axis 21 Imóveis, há algum tempo se preocupava com o alto gasto com energia na sede da empresa, localizada no bairro Bigorrilho, em Curitiba. Uma alternativa para reduzir as despesas seria a instalação de painéis fotovoltaicos, mas o céu cinza de Curitiba em grande parte dos dias trazia dúvidas. No ano passado, ao participar de uma feira de habitação, Ribeiro conheceu um projeto da Itaipu para incentivar a geração de energia solar que o fez mudar de ideia.
“Eu disse para eles, mas em Curitiba não dá, a cidade fica nublada. Então o pessoal da Itaipu me apresentou estudos que mostram que a diferença da nossa cidade para Salvador, por exemplo, em termos de eficiência na geração de energia solar, é muito pequena. A partir daí eu procurei ler sobre o assunto e descobri que não passa de mito essa crença de que Curitiba não serve para o uso de painéis fotovoltaicos”, conta o empresário.
A mudança de matriz energética na imobiliária de Ribeiro foi feita há pouco mais de um mês. Ele gastou em torno de R$ 60 mil para garantir a geração de energia necessária para o funcionamento da empresa. Agora em maio chegou a primeira fatura após a implantação dos painéis e o resultado foi satisfatório, na avaliação do empresário. A conta de luz caiu de uma média mensal de R$ 1,2 mil para R$ R$ 179 em abril, uma redução de mais de mil reais. Com essa economia, a projeção é que em pouco mais de quatro anos ele recuperará o investimento.
“A energia solar é mais limpa que a energia das hidrelétricas, que, mesmo sendo renovável, causa impacta ambiental. Além disso, o que precisamos é a descentralização, o que inclui outras matrizes. A energia sempre foi um monopólio e isso não é bom.”
Eloy Casagrande, professor da Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR).
O caso de Ribeiro retrata a crescente procura por energia solar em Curitiba e desfaz o mal-entendido de que os dias nublados na cidade tornam inviável a substituição da energia hidrelétrica por energia solar. Os frequentes aumentos da tarifa, como ocorreu agora em maio, quando o governo federal adotou a bandeira amarela – que deixou a conta de luz mais cara –, estão entre os fatores que levam muitas pessoas a buscar alternativas.
“Temos que olhar não só a radiação de um determinado dia, mas a média ao longo do ano. Em Curitiba e qualquer lugar do Paraná consegue-se gerar energia solar com valores significativos, maiores do que em muitos países europeus”, explica o engenheiro industrial Elétrico Gerson Máximo Tiepolo, especialista no assunto e conselheiro do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Paraná (Crea-PR).
O professor da Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR), Eloy Casagrande, responsável pela implantação do primeiro sistema solar fotovoltaico conectado à rede da Copel – conhecido como Escritório Verde –, explica que não são necessários dias ensolarados para gerar energia solar. “O que você precisa é de radiação solar. Mesmo com o tempo nublado os raios solares continuam passando pelas nuvens. Então, esses raios atingem os painéis fotovoltaicos e geram energia”, diz.
Outra crença que não procede é que nos dias frios, como ocorrem no inverno em Curitiba, torna-se inviável produzir energia por sistemas solares. Segundo o professor Casagrande, a temperatura não influencia. “Nos dias muito frios, mas ensolarados, com céu azul, é possível gerar energia tanto quanto em dias quentes de verão com a vantagem de não superaquecer as placas. Essa é uma vantagem que existe nos estados da região sul do Brasil, que tem clima mais temperado, com verões menos quentes. Isso faz com que os painéis fotovoltaicos não sofram superaquecimento. Quando eles superaquecem, eles perdem desempenho. Esse é um ponto negativo para regiões muito quentes. Ao mesmo tempo que nesses estados há muita radiação, as temperaturas muito altas fazem com que o painel perca eficiência e tempo de vida útil. Nas regiões de clima temperado o tempo de vida útil dos painéis fotovoltaicos é maior”, compara.
Eficiência e preservação
O professor Casagrande destaca que a instalação de painéis fotovoltaicos deve ser feita em conjunto com um projeto de eficiência energética. “Por exemplo, deve ser projetada mais entrada de iluminação natural no ambiente, substituir todas as lâmpadas antigas por lâmpadas LED”, sugere. Outro ponto importante, segundo o pesquisador, é construir casas termicamente mais eficientes, com proteção ao calor e ao frio. “Paredes duplas, isolamento nas paredes, medidas que evitem ar condicionado ou a necessidade de muito aquecimento no inverno. O ideal é que a energia solar seja projetada conjuntamente com uma arquitetura sustentável”, observa.
Para o engenheiro Tiepolo, além de economia, o uso do sol como fonte de eletricidade é uma questão de sobrevivência energética. “O aumento no preço da gasolina e do diesel, e o próprio uso destes combustíveis fósseis no transporte e em usinas termelétricas, cuja influência nas mudanças climáticas vem sendo estudada à exaustão pela ciência, têm despertado o interesse por formas limpas de se gerar energia”, diz. Para o especialista, a complementação por fontes renováveis, como eólica e solar, é imprescindível. “Hoje, temos em torno de 60% da matriz de energia vinda das hidrelétricas. Mas um dos problemas é que os grandes potenciais para a instalação de novas usinas já foram usados. O que ainda existe está no Norte e estamos falando de impactos ambientais”, ressalta.
Há consenso entre os técnicos e pesquisadores de que a diversificação da matriz energética do país, com maior uso de energia solar e eólica, depende de incentivos governamentais, como linhas de financiamento, descontos no IPTU e remuneração pela energia excedente.
“No Brasil, quem quer instalar painéis fotovoltaicos em sua casa, o máximo que consegue é redução de ICMS. Não há apoio financeiro, a não ser uma linha do BNDES, mas a burocracia é muito grande. E tem ainda o lobby das concessionárias, que não deixa avançar. As concessionárias, uma vez que são empresas de economia mista, elas precisam gerar lucros. Se a demanda cai, elas perdem lucratividade. Então não há interesse”, critica Casagrande.
No lado positivo, os especialistas destacam o sistema em que a Copel usa o excedente produzido pelas unidades com painéis fotovoltaicos e dá crédito que são abatidos na conta de luz. O modelo foi regulamentado em 2012.
Tempo para recuperar investimento depende do consumo
Um dos fatores que limitam a expansão do uso da energia solar não só em Curitiba e no Paraná, mas em todo o país, é a incerteza sobre o retorno que o investimento em um sistema fotovoltaico pode trazer. Para o engenheiro eletricista Sérgio Inácio Gomes, conselheiro do Crea-PR, os sistemas fotovoltaicos podem ser uma boa alternativa para economizar na conta de luz, mas, antes, é preciso ter tudo na ponta do lápis. Gomes explica que cada consumidor pertence a uma categoria tarifária, que impacta na quantia paga pelo quilowatt/hora, de acordo com as classes.
“Vários fatores são colocados na análise para se chegar à conclusão do payback, que é o tempo estimado para a compensação do retorno do investimento. Por isso, é importante ter um engenheiro eletricista como responsável técnico do projeto”, recomenda.
O engenheiro Felipe Rauen, proprietário da Solar Green, uma das empresas especializadas na instalação de painéis fotovoltaicos em Curitiba, diz que o tempo de retorno do investimento depende do gasto de cada unidade. “Quando maior o gasto com energia em uma casa ou empresa, menor será o tempo para que a pessoas recupere o que investiu”, afirma ao revelar que a faixa de consumo mais procurada hoje na empresa dele está entre R$ 800 e R$ 3 mil de gasto mensal.
“O interessante é a pessoa buscar financiamento. Aí está o segredo do investimento. Se você paga, por exemplo, R$ 600 para a Copel, a parcela do financiamento de cinco anos vai ficar próxima desse valor. Assim, você deixa de pagar a Copel e quita a parcela do financiamento.”
Felipe Rauen, engenheiro, proprietário da Solar Green.
A pedido da reportagem, a Solar Green fez um projeto para atender uma unidade que gasta em média R$ 1,2 mil por mês com energia. O custo final do sistema foi orçado pelos técnicos em R$ 60,4 mil. Pelos estudos da empresa, a economia no primeiro ano seria de R$ 14,4 mil e a previsão de retorno financeiro foi estimado em três anos e dez meses.
Esse tempo para recuperar os valores investidos – relativamente curto – não se repete para unidades com gastos mais baixos. Um outro projeto, elaborado pela Instalo Solar, empresa também especializada em sistemas fotovoltaicos em Curitiba, se baseou em uma casa residencial com gasto médio mensal de cerca de R$ 180 reais. O custo final do sistema foi estimado em R$ 10 mil, com uma economia prevista de R$ 1,45 mil no primeiro ano. Com isso, o tempo previsto para recuperar o investimento ficou em seis anos e três meses. Com garantia de 25 anos do equipamento, a empresa calculou em R$ 50,7 mil a economia no período.
O retorno poderia ser maior não fosse a taxa mínima cobrada pela Copel. Mesmo que uma unidade (casa, apartamento ou empresa) fique um mês inteiro sem consumir energia da rede estatal, a companhia cobra valores que vão de R$ 40 a R$ 85. “O valor da tarifa mínima depende do tipo de ligação da unidade consumidora. Para ligação trifásica a taxa mínima é maior que bifásica ou monofásica’, explica Rauen.
Melhor que na Europa
O potencial médio de geração de energia solar em Curitiba é superior a 24 de 33 países europeus citados no ‘Atlas de Energia Solar do Estado do Paraná’. No estado todo, a média é 2,2% superior à registrada na Itália e fica 43% acima da média na Alemanha, país com maior capacidade instalada de geração de energia solar na União Europeia. O atlas foi elaborado em uma parceria entre a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e a Itaipu.