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Depois de países da Ásia e da Oceania – que primeiro conseguiram controlar o novo coronavírus e estão fazendo uma abertura cuidadosa das atividades econômicas e sociais –, agora é a vez dos europeus. Grande parte dos países da Europa, até mesmo Itália, Espanha e França, que foram duramente afetados pela pandemia, deram início a ‘medidas responsáveis’ para a volta da normalidade.
A reabertura está sendo adotada após avaliações seguras de que a queda do número diário de infectados e de mortes é permanente. E medidas de prevenção estão sendo tomados diante dos riscos de uma segunda onda de contágios. Autoridades de saúde alertam que uma possível volta do ciclo de infecções poderia exigir novo período de isolamento, o que seria catastrófico.
A preocupação com a possibilidade de um ‘segundo round’ se justifica, apesar de não haver comprovação de que ela vá ocorrer. Países que adotaram medidas consideradas mais eficazes para combater o viríus – como a Coreia do Sul e o Japão – registraram novos picos de infecção após o relaxamento de restrições. Na Europa, a Alemanha também registrou casos de elevação de pessoas contaminadas em alguns locais após a abertura.
A Organização Mundial de Saúde (OMS), por meio de sua diretora de Saúde Pública da OMS, María Neira, pediu cautela extrema durante a reabertura. Em entrevista à rádio RAC 1, de Barcelona, Neira fez uma apelo pelo “bom senso” para que todas as medidas de retorno à normalidade sejam feitas de forma segura.
A equipe de resposta à pandemia do novo coronavírus na União Europeia – o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC, na sigla em inglês) – não descarta uma segunda onda. Andrea Ammon, diretora da equipe, alertou para que os países estejam preparados e tomem todas as medidas preventivas durante a abertura. Na avaliação da equipe, se houver responsabilidade, uma segunda onda poderá ser evitada ou controlada localmente antes que se espalhe.
A porta-voz da Comissão Europeia para saúde pública, Stefan de Keersmaecker, declarou que “os governos devem informar claramente à população que a possibilidade de uma segunda onda existe, mesmo que a pandemia tenha sido vencida agora”.
Abertura gradual e responsável
As primeiras medidas de abertura anunciadas na Europa têm levado seriamente em conta esse risco. Na Espanha, por exemplo, moradores de outros países poderão voltar a visitar o país somente a partir de julho, segundo anunciou o presidente espanhol Pedro Sánchez. O governo espanhol anunciou também que a liga espanhola de futebol recomeçará na semana de 8 de junho, depois de quase três meses de interrupção.
No último dia 4, o governo espanhol deu início ao fim gradual do confinamento, com a abertura de pequenas lojas e estabelecimentos de hotelaria, embora com limitações. Foi elaborado um cronograma, que prevê uma série de medidas até o final de junho. Nesse período, diante de qualquer possível recaída, o governo poderá fazer uma revisão das normas.
Na França, empresas e lojas de setores considerados não essenciais, como salões de beleza, floriculturas, livrarias e lojas de roupas, reabriram após 55 dias de confinamento. Um decreto assinado no sábado (23) pelo governo autorizou a realização de cerimônias religiosas, mas é obrigatório o uso de desinfetante para as mãos e de máscara, além do controle da entrada de fiéis. Quem organiza as cerimônias terá que garantir que as pessoas obedeçam às regras.
A população já pode voltar às ruas sem explicar oficialmente o motivo. O uso de máscaras, no entanto, é obrigatório nos transportes públicos. As lojas podem reabrir e cerca de 90% das escolas estão retomando atividades.
No auge do isolamento, a circulação de pessoas diminuiu 81% em toda a França, bem superior à média na Europa, de 59%. Agora, levantamento do Google mostra que a redução caiu para menos de 50%. Em todos os países europeus o Google registrou aumento da movimentação de pessoas na última semana.
As autoridades francesas estão alertas para os ricos. Tanto que o ministro da Educação, Jean-Michel Blanquer, anunciou na segunda-feira (18) o fechamento de 70 escolas do país uma semana após a volta às aulas, devido ao surgimento de casos confirmados e suspeitos de covid-19, a doença provocada pelo novo coronavírus. Ao todo, 40 mil escolas voltaram às aulas na França em 11 de maio.
Na Itália, os cidadãos puderam voltar às praias neste fim de semana para praticar esportes, caminhar e nadar. Mas nem tudo é permitido. Deitar na areia ou usar uma espreguiçadeira, por exemplo, são atividades não permitidas. O país também começou a autorizar a reabertura de lojas, bares e restaurantes. A retomada está sendo feita por regiões. O mínimo de distância entre as pessoas e a não aglomeração é uma regra comum.
No Reino Unido, o governo elaborou um plano detalhado, de 60 páginas, para a retomada da atividade econômica de forma progressiva e cuidadosa. Caso os números de novos doentes por covid-19 voltem a subir, as restrições poderão ser reimpostas. O plano é ir relaxando o isolamento até junho, quando haverá a volta das escolas do ensino fundamental. Eventos esportivos e culturais também serão permitidos, desde que de portas fechadas. A meta é que até quatro de junho todo o comércio esteja reaberto.
EUA ainda tem alta taxa de infecções
Os Estados Unidos, pais com o maior número de infectados (1,6 milhão até esta segunda-feira, 26) e mais de 98 mil mortes, vem retomando as atividades desde o início de maio. O país chegou a ter um pico de mais de 2 mil mortes em 24 horas. Nos últimos dias o triste número ficou abaixo de mil mortes.
O governador de Nova York, Andrew Cuomo, emitiu na noite de sexta-feira (22) uma ordem executiva autorizando as reuniões de até 10 pessoas em qualquer parte do estado – incluindo a cidade de Nova York, epicentro da crise – por qualquer propósito ou motivo. A medida gerou críticas, diante da alta de taxa de infecções em várias regiões do país, mas vai no embalo de outros estados que estão abrindo.
O presidente norte-americano Donald Trump pediu também na sexta-feira aos governadores dos estados que autorizem “imediatamente” a abertura de locais de culto. Trump ameaçou forçar a reabertura por conta própria, caso algum governador não cumpra.
Apesar da campanha de Trump, funcionários do próprio governo temem uma piora caso medidas de prevenção não sejam tomadas. Deborah Birx, coordenadora de resposta ao coronavírus da Casa Branca, declarou estar “muito preocupada com as pessoas que saem sem distanciamento social", ficando a pelo menos dois metros das outras para reduzir as chances de transmitir ou ser infectada pelo vírus, segundo publicou no domingo a Voz da América, órgão de comunicação do governo norte-americano. "Temos que ter distanciamento social se as pessoas estiverem em grupos", disse ao defender que as pessoas voltem a “caminhar, jogar golfe, jogar tênis".
Brasil enfrenta auge da doença
O Brasil também deu início a medidas de retomada de atividades econômicas em várias cidades e estados e busca afrouxar o confinamento. A diferença da postura brasileira, quando comparada com europeus e asiáticos, é que o relaxamento está ocorrendo sem que houvesse certeza de recuo do ciclo de contaminações e de mortes.
Nos últimos dias o Brasil tem batido recordes do número de novos contaminados e de óbitos por covid-19. Na segunda-feira (25), pelo segundo dia consecutivo, o Brasil foi o país que teve maior número de mortes diárias, passando os Estados Unidos.
O mais recente boletim "Covid-19 em Dados: Projeções", produzido por estudiosos da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), estima que, se não houver medidas mais severas de controle do novo coronavírus no Brasil, o país chegará a 1 milhão de pessoas infectadas até 22 de junho. Na segunda-feira (25), o país passou de 374 mil contaminados e superou 23 mil mortes.
Sem achatar a curva de contágios nem reduzir as mortes, o Brasil começa a ser isolado de outros países que estão saindo da quarentena. Canadá e Estados Unidos proibiram a entrada de pessoas oriundas do território brasileiro. O Uruguai redobrou as medidas de vigilância em cidades que ficam na fronteira.