Em plena guerra comercial entre Washington e Pequim, a estratégia do presidente Jair Bolsonaro (PSL) de se aproximar dos Estados Unidos e colocar comercialmente a China em segundo plano tornou-se uma equação complexa para o Brasil. Pelo menos é o que mostram os números da balança comercial brasileira com as duas maiores economias do planeta nos primeiros sete meses desse ano.
De janeiro a julho, a balança comercial do Brasil com os Estados Unidos ficou praticamente empatada. O superávit brasileiro foi de apenas US$ 456 milhões. No período, o Brasil exportou US$ 17,3 bilhões para nos norte-americanos e importou US$ 16,9 bilhões, de acordo com dados do Ministério da Economia, Indústria, Comércio Exterior e Serviços.
Quando a conta é em relação à China, os números mudam de patamar. O Brasil obteve um superávit comercial com os chineses de US$ 15,4 bilhões de janeiro a julho deste ano. O superávit representa quase o total das exportações feitas para os EUA. Foram vendidos para a China US$ 36,2 bilhões, contra um montante de US$ 20,8 bilhões de importações. A China é de longe o primeiro parceiro comercial do Brasil.
Nessa comparação, é importante observar que grande parte das exportações para a China são de produtos não industrializados, como soja e derivados (38%), petróleo (24%) e minérios de ferro e seus concentrados (18%). O produto industrializado de maior peso nas exportações para os chineses é celulose (5,9%). No sentido inverso, as importações feitas da China são, em grande parte, de produtos industrializados.
Com os Estados Unidos, a relação comercial é mais equilibrada no tocante a produtos primários e manufaturados. A venda de aviões para os americanos representou 5,9% no período e produtos semimanufaturados de ferro ou aços chegou a 10% do total exportado. Em contrapartida, 16% das importações foram de óleos combustíveis e 5% de gasolina. Medicamentos para medicina humana e veterinárias representaram 4% das importações.
Ao buscar a aproximação com os Estados Unidos, o governo Bolsonaro procura evitar que as relações com os chineses – que estão em plena guerra comercial com os americanos – se azedem. Durante conversa com jornalistas durante reunião com altos funcionários da China, Rússia, Índia e África do Sul – parte de um encontro dos BRICS no Rio de Janeiro – em julho passado, o chanceler brasileiro Ernesto Araújo disse que os esforços do Brasil para construir melhores laços com os Estados Unidos não precisam preocupar a China. Segundo o chanceler, melhores relações do Brasil com os EUA não colocam em risco as ligações com a China.
Apesar dessa visão do governo brasileiro, há quem veja riscos. No auge de uma polêmica com o escritor Olavo de Carvalho, que criticou duramente a ida de uma comitiva de parlamentares do PSL – o partido de Bolsonaro – à China, em janeiro deste ano, o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, Charles Andrew Tang, fez um alerta. “A China só investe onde é bem-vinda. O Brasil precisa desses investimentos e deve ter muito cuidado, se isso continuar o país vai sofrer", afirmou.
Os riscos da postura ideológica do Brasil também têm reflexos entre vizinhos da América do Sul. A Venezuela é um bom exemplo. O superávit da balança comercial com os venezuelanos, que chegou a US$ 4,6 bilhões em 2008, caiu para apenas US$ 122 milhões nos sete primeiros meses desde ano. A queda se deu, em parte, pela crise econômica no país vizinho, mas outra parte considerável é decorrência das ações do governo brasileiro nos últimos anos.