Assim que o Reino Unido anunciou o início da vacinação contra Covid-19, em dezembro, a imprensa do país deu destaque que a Rainha Elizabeth II, de 94 anos, e o Príncipe Philip, 99 anos, não iriam “furar a fila” e teriam de esperar chegar a vez do grupo de pessoas maiores de 80 anos para serem vacinados. O fato mostra como muitos países têm organizado a vacinação diante da escassez de imunizantes, mas nos últimos dias o Brasil – que ainda não começou a vacinação pública – motivou debate mundial sobre a possibilidade de a vacina ser comprada por clínicas privadas.
Especialistas da maioria dos países e a Organização Mundial de Saúde recomendam que, enquanto não houver produção suficiente, as vacinas devem ser oferecidas prioritariamente às pessoas com maior risco de contrair a doença e de sofrer complicações graves ou morrer de covid-19. A recomendação vem sendo seguida rigorosamente em todos os países.
A fila para receber vacina é praticamente a mesma em todos os países que já iniciaram a imunização, com pequenas diferenças: pessoas morando em um lar para idosos, profissionais de saúde e assistentes sociais da linha de frente e cuidadores trabalhando em casas de repouso para idosos. Na sequência vêm pessoas com mais de 80 anos, 75 anos, 70 anos e 65 anos. Quem tem menos de 65 anos terá de esperar um pouco mais.
A pergunta que se tem feito é: impedir que a vacina seja vendida na rede privada não seria uma proibição ao livre comércio, à iniciativa privada? Quem defende o ponto de vista de que deve haver a liberação ressalta que a vacina da gripe, por exemplo, pode ser aplicada em diversas clínicas. Basta a pessoa pagar para receber o imunizante.
Para autoridades e instituições de saúde, além de pesquisadores e até empresas fabricantes de vacina, diante da escassez de vacina contra Covid não seria ético permitir que pessoas fora dos grupos de risco “pulassem a fila”. Enquanto no Brasil clínicas privadas divulgaram que estão negociando com o laboratório Bharat Biotech para compra de 5 milhões de doses da vacina indiana, as norte-americanas Pfizer e Moderna não divulgaram nenhum plano para vender sua vacina a clínicas privadas. As duas empresas dos EUA estão priorizando os contratos com governos.
A Associação Brasileira das Clínicas de Vacina (ABCVac) classificou como falácia a alegação de que o setor privado vá concorrer com o SUS. Clínicas privadas do Brasil defendem que o objetivo é complementar a oferta prevista no sistema público. Muitas empresas querem oferecer a vacina contra Covid a empregados que não estão hoje nos grupos prioritários previstos pelo Plano Nacional de Imunização. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) estuda bancar parte da campanha de vacinação para uma parcela de trabalhadores entre 20 e 50 anos.
A OMS defende que a vacina deve ser oferecida gratuitamente a todas as pessoas e que deve haver prioridade sobre quem tem direito a receber primeiro a imunização. O entendimento é que, neste momento, a vacina contra Covid-19 não é um bem de consumo como qualquer outro e não deve ser distribuída como tal. Comprar uma vacina em particular em meio à escassez implicaria necessariamente em retirá-la de outra pessoa que, do ponto de vista clínico, pode precisar dela com mais urgência.
Para alguns defensores da compra pelo setor privado, no entanto, a priorização estabelecida nos programas de vacinação não deveria ser um impeditivo para que particulares participassem da imunização. Na visão destes, diante das dificuldades de logística e de operacionalização por parte dos governos, as clínicas privadas poderiam contribuir para uma maior eficácia da vacinação.
Mas o setor privado teria de seguir o cronograma e as prioridades estabelecidas pelas instituições de saúde de cada país, sem permitir o chamado “fura fila” enquanto não houver vacina disponível para todos. Nesse modelo, o setor privado entraria como complemento da estrutura da rede pública e teria de seguir rigorosamente todos os protocolos do programa nacional de cada país.
O Ministério da Saúde informou na segunda-feira (04) que as clínicas privadas poderão comprar vacina, mas terão de seguir o cronograma e as prioridades do programa nacional de vacinação do Brasil.
Nesse cenário, a prioridade seria a vacinação pública. Embora possa parecer positivo, há objeções por parte de quem aponta o risco de se fragmentar os programas de imunização com a venda a clínicas privadas, o que poderia levar ao fracasso.
Com o controle da pandemia, em um futuro próximo, e o aumento da oferta de imunizantes, o cenário mudaria totalmente. As vacinas poderiam ser comercializadas livremente, assim como ocorre hoje com os imunizantes contra gripe.
Vai piorar antes de melhorar: reforma complica sistema de impostos nos primeiros anos
Nova York e outros estados virando território canadense? Propostas de secessão expõem divisão nos EUA
Ação sobre documentos falsos dados a indígenas é engavetada e suspeitos invadem terras
“Estarrecedor”, afirma ONG anticorrupção sobre Gilmar Mendes em entrega de rodovia
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS