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No período eleitoral, que parece ser eterno, nossas famílias ficam ainda mais abaladas pela criação de universos paralelos via redes sociais. Muita gente é sugada pelos grupos, principalmente de WhatsApp e Facebook.

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Todo mundo conhece o caso de alguém que não consegue resolver questões práticas e profissionais porque dedica tempo demais a esses grupos.

Entender esse fenômeno é complicado demais porque política envolve paixões, princípios e moralidade. Seria bem mais fácil se a gente lidasse com algo mais objetivo.

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Isso existe e está colocando as Big Techs em pé de guerra entre si. A criação de universos paralelos é um grande mercado das empresas de tecnologia, que causa prejuízos a indivíduos, outros ramos econômicos e às democracias. Agora, começa a causar prejuízos a elas próprias.

Nessa briga de tubarões, que foi parar na Justiça esta semana, podemos ter uma luz sobre como buscar soluções para outros problemas.

A Amazon processou 10 mil administradores de grupos do Facebook por revisões fraudulentas de produtos em suas plataformas. Parece anedótico. Custa uma fortuna.

A criação de universos paralelos é um grande mercado das empresas de tecnologia, que causa prejuízos a indivíduos, outros ramos econômicos e às democracias. Agora, começa a causar prejuízos a elas próprias

Todo mundo já caiu em propaganda enganosa. Eu admito que, em outra era geológica, comprei pela televisão um conjunto de facas Ginsu acreditando mesmo que eram capazes de cortar um sapato como se fosse uma barra de manteiga. Fiquei com tanta vergonha que nem tive coragem de devolver pedindo o reembolso.

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Com o tempo, nos acostumamos a identificar propagandas tendenciosas e a internet maximizou a experiência que sempre foi a mais segura, o boca-a-boca.

Muita gente, eu inclusive, tem o hábito de conferir o que outros consumidores falam sobre um produto antes de decidir pela compra. Talvez você tenha reparado que, ultimamente, pelo menos nos livros, a Amazon diferencia a revisão comum da compra confirmada.

Percebi nos meus ebooks. Algumas das experiências de consumidor têm um selo especial indicando que aquela pessoa realmente adquiriu o livro. Resolvi ir atrás. Quando a esmola é demais, o santo desconfia.

Soube que, em 2018, o Washington Post publicou o escândalo das revisões de produtos da Amazon. Nos setores de suplementos alimentares e fones bluetooth, a gigantesca maioria dos comentários de consumidores eram falsos.

A coisa ia muito além. Existia em plataformas como o Facebook um mercado paralelo de compra e venda de revisões positivas e negativas, que afetava toda a percepção sobre produtos e marcas específicos.

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O primeiro questionamento caiu sobre a Amazon. Como é que a empresa não havia percebido, pelos algoritmos, que a maioria dos comentários avaliando produtos era de quem nem comprou o produto lá? Esses dados existem e podem ser cruzados por inteligência artificial.

Então a empresa avisou que iria fazer um trabalho específico sobre o tema e derrubou uma quantidade absurda de revisões falsas de produtos.

A revisão falsa só é um problema se os consumidores descobrem a falsidade. Antes que descobrissem, não era. Percepções sobre um mesmo produto variam muito porque dependem principalmente da expectativa. Se não forem mentiras muito absurdas, todas passam por verídicas.

O que a Amazon ganha com isso? Uma quantidade enorme de revisões de produto é muito bom para a plataforma porque gera confiabilidade para a realização da compra ali.

Para se ter ideia da quantidade, somente em 2020, a Amazon diz ter tirado do ar 200 milhões de revisões falsas sobre produtos em sua plataforma. Isso mesmo: 200 milhões. Anualmente, são feitas 520 milhões de revisões de produtos.

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Ocorre que derrubar era como enxugar gelo. Reapareciam os mesmos posts, às vezes com copia e cola, vindos dos mesmos IPs, dizendo as mesmas coisas. Então a empresa entendeu que um grupo pequeno e determinado era responsável pela gigantesca maioria das revisões falsas.

Achou no Facebook os grupos organizados financeiramente em torno do tema. Foram trezentos grupos denunciados ao Facebook em 2020 e mil grupos em 2021.

O número parece grande? Não é. Somente no Reino Unido, a CMA, Autoridade de Mercado e Competitividade, ordenou a derrubada de 16 mil grupos que organizavam revisões falsas de todo tipo de produto em plataformas.

Por que isso é importante? Porque frauda a livre concorrência. Em vez de concorrer buscando identidade com o consumidor e melhorando o produto, a empresa passa a investir em mentir sobre o produto e até sobre os concorrentes. Isso piora a qualidade do setor econômico e até da economia como um todo.

Agora, autoridades de defesa do consumidor dos Estados Unidos e Europa começaram a questionar as Big Techs sobre a inação diante de ataques ao livre mercado em outros setores econômicos.

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Em vez de concorrer buscando identidade com o consumidor e melhorando o produto, a empresa passa a investir em mentir sobre o produto e até sobre os concorrentes

A Amazon já se blindou. Abriu uma ação judicial contra 10 mil administradores de grupos do Facebook que promoviam comercialização de revisões falsas de produtos.

A maioria dos grupos é fechada, mas diz de forma aberta, até no próprio nome, a atividade a que se dedica.

Agora a bola foi passada à Justiça dos Estados Unidos. Qual a responsabilidade desses administradores de grupos? E por que o Facebook foi simplesmente esquecido pela Amazon? Por enquanto, tenho só as perguntas.

O fato aqui é que vamos muito além de promover produtos ruins ou falar mal de bons produtos. Este mercado é o da criação de um universo paralelo.

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O consumidor pensa que está lendo relatos de outros consumidores e constrói imagens sobre as marcas a partir disso. Também constrói sua ideia sobre o tamanho e a credibilidade de plataformas como a Amazon a partir desse ambiente.

As compras são feitas pensando que a empresa investe no produto e na relação com o cliente. Na verdade, ela pode estar investindo em dar brindes a quem falar bem dela. O falseamento de contextos é o grande negócio.

Iludidas e desconectadas da realidade, as pessoas tomam decisões que talvez não tomariam se estivessem ancoradas na racionalidade. É muito poder para um punhado de empresas.

Não imagino soluções fáceis, mas creio que a primeira é começar a tomar consciência dos efeitos desse novo mundo sobre o nosso comportamento.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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