O Brasil atravessa um momento peculiar em que, sob a justificativa de combater intolerância religiosa, o próprio poder público se torna agente de perseguição.
O caso de Claudia Leitte, acusada pelo Ministério Público da Bahia de intolerância religiosa por adaptar uma música conforme suas crenças, revela algo ainda mais alarmante: a tentativa de impor uma agenda ideológica que beira o absurdo. Trocar "jogar flores para Iemanjá" por "só louvo ao meu Rei Yeshuá" em uma música foi suficiente para mobilizar recursos públicos e ações judiciais. A pergunta que fica é: onde está o limite?
Jean Regina, especialista em direito religioso e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Religião, descreveu bem a incongruência dessa polêmica: “Não existe racismo religioso ou intolerância religiosa quando se faz um movimento desse para expressar a sua fé, para não cantar algo que comprometa sua consciência.” Ele pontua ainda que a diferença entre religiões e cosmovisões “é algo que para o direito e para a sociedade deve ser celebrado”. Em vez de condenar o pluralismo, deveríamos valorizar a liberdade de expressão religiosa como um reflexo da diversidade que compõe nossa sociedade.
O caso torna-se ainda mais grave ao observarmos o contexto de atuação do Ministério Público da Bahia. Deltan Dallagnol, ex-procurador da Lava Jato, foi enfático em criticar a atenção dada pelo órgão ao caso enquanto o estado enfrenta problemas crônicos. Temos a polícia que mais mata no Brasil e facções criminosas que controlam territórios inteiros. Como justificar a mobilização de recursos públicos para investigar uma cantora de axé por mudar a letra de uma música? Essa inversão de prioridades não apenas desmoraliza a Justiça, também amplia a distância entre as instituições públicas e a população.
A polêmica em torno da adaptação feita por Claudia Leitte é um exemplo claro de como o conceito de fake news ou intolerância pode ser usado de maneira enviesada e distorcida. Quando o Ministério Público processa criminalmente uma cantora por exercer sua liberdade de crença e expressão, ele ultrapassa os limites do razoável.
Quando o Ministério Público processa criminalmente uma cantora por exercer sua liberdade de crença e expressão, ele ultrapassa os limites do razoável
Não há qualquer evidência de que a atitude de Claudia Leitte tenha incitado ódio, discriminação ou mesmo ofendido adeptos do candomblé. Pelo contrário, figuras respeitadas como Carlinhos Brown saíram em sua defesa, ressaltando a inexistência de qualquer ataque à fé alheia.
A perseguição judicial contra Claudia Leitte expõe, mais uma vez, o avanço de uma agenda ideológica na Justiça. Esse tipo de ação não apenas desgasta a relação entre a população e o poder público, mas também banaliza a luta contra a intolerância real. Estamos diante de uma tentativa de impor uma seita ideológica disfarçada de política pública. A judicialização de questões como essa reduz a confiança no sistema legal e afasta a Justiça de suas verdadeiras prioridades.
A defesa da liberdade religiosa deve ser incondicional e isso inclui respeitar as escolhas individuais de expressão da fé. Claudia Leitte tem o direito de adaptar sua música para alinhar-se às suas crenças cristãs, assim como qualquer pessoa tem o direito de venerar ou não Iemanjá. Forçar a cantora a cantar o nome de uma divindade que não venera é a própria definição de intolerância religiosa, algo que, ironicamente, o Ministério Público deveria combater.
Esse episódio também reflete a maneira como o termo “intolerância” tem sido usado como ferramenta para censurar e controlar. É a distorção de um conceito legítimo em um instrumento de repressão ideológica. Quando o governo ou o poder público se tornam agentes dessa distorção, cria-se um ambiente em que a liberdade está em risco. Hoje a vítima é Claudia Leitte, amanhã, pode ser qualquer um de nós.
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