A decisão do STF sobre liberdade de imprensa tem um desdobramento além dela, fustigou grupos que já se energizavam atacando jornalistas. Existem reclamações justas dos cidadãos contra boa parte da imprensa, não podemos negar. Mas esse movimento vai além disso, já que substitui a realidade por fantasias sobre a atuação de jornalistas.
Existe um sentimento que domina a ação de muitas pessoas nas redes sociais, o Schadenfreude. É uma palavra que existe somente em alemão e descreve o prazer que temos em ver alguém de quem não gostamos se dar mal. Não há dúvidas de que isso é bem mais forte que a defesa da liberdade de expressão.
Precisamos de uma união nacional em favor da liberdade de imprensa. Infelizmente, tudo indica que estamos longe disso. Os poderosos agradecem.
O STF entende agora que o veículo e o jornalista são responsáveis por declarações dos entrevistados. Cabe agora a um juiz decidir se houve ou não dolo em veicular as declarações. Também compete ao Judiciário verificar se houve ou não negligência na checagem da informação. Na prática, é a receita perfeita para a autocensura. Quem vai querer ser jornalista diante dessas condições?
Pensemos na entrevista de Pedro Collor sobre o irmão, então presidente da República. Ele perdeu o mandato, mas foi absolvido de todas as acusações. Caso a regra fosse vigente, o jornalista e o veículo poderiam ser processados. Quem vai querer assumir esse risco agora?
Há diversas questões a serem esclarecidas. Suponha um debate eleitoral. Sabemos que os políticos apelam a todas as estratégias possíveis para vencer. Não sabemos se os veículos de comunicação podem ser responsabilizados, mas seria uma tentativa compreensível apelar contra eles.
Temos mais um episódio patético em que discussões importantes são sugadas pela polarização e completamente imbecilizadas.
Todo o jornalismo policial tem diante de si questionamentos importantes. Caso alguém seja acusado por uma autoridade e depois não venha a ser condenado, o que acontece?
O mercado de podcasts espera saber qual será seu destino. A avaliação sobre como atuam para ouvir o outro lado ou esclarecer a verdade caberá a um juiz. Impossível saber como serão as decisões.
Entidades representativas dos jornalistas entraram no debate de forma tardia. Questionam como as coisas aconteceriam na prática. Ainda não há respostas. Era esperado que as forças defensoras da liberdade de expressão surfassem nessa onda. São adultos que finalmente veriam a oportunidade de fazer suas teses prosperarem. No entanto, nosso vício em embates emocionais parece prevalecer.
Agora há muita gente buscando culpados em vez de aliados. Há quem tenha resolvido perseguir jornalistas no lugar de apoiar um levante a favor da liberdade de expressão. Falar que avisou ou tinha razão, estranhamente, passa a ser mais importante que fazer valer o próprio ponto de vista.
Os poderosos devem estar comemorando. Poderia existir um levante nacional a favor da liberdade de expressão e liberdade de imprensa. Temos, no entanto, mais um episódio patético em que discussões importantes são sugadas pela polarização e completamente imbecilizadas.
Poder atacar jornalistas e sentir prazer com uma suposta vingança é a prioridade nas redes sociais. Há casos em que o jornalista realmente errou. Há outros em que o jornalista fez uma defesa consistente da liberdade de expressão mas é acusado de não ter feito. A realidade pouco importa diante do prazer de atacar alguém e alegar que tinha razão. Precisamos de uma união nacional em favor da liberdade de imprensa. Infelizmente, tudo indica que estamos longe disso. Os poderosos agradecem.
Julgamento do Marco Civil da Internet e PL da IA colocam inovação em tecnologia em risco
Militares acusados de suposto golpe se movem no STF para tentar escapar de Moraes e da PF
Uma inelegibilidade bastante desproporcional
Quando a nostalgia vence a lacração: a volta do “pele-vermelha” à liga do futebol americano
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS