Começou esta semana nos Estados Unidos um rumoroso caso antitruste contra o Google. O Departamento de Justiça alega que a empresa usou de práticas predatórias para monopolizar o mercado de anúncios. Não estamos falando de pouca coisa. O processo diz que o faturamento anual da empresa é de US$ 160 bilhões. Isso mesmo, BI. A maior parte disso vem das ferramentas de anúncios. O governo dos EUA alega que a empresa chegou à posição de mercado que tem hoje por meio de práticas predatórias de concorrência, aniquilando ou se fundindo sistematicamente com os competidores.
Existe um resultado que nós debatemos com frequência, o de que o Google se tornou o gatekeeper da internet. Não sabemos se ele mostra nas nossas buscas o que buscamos ou só o que interessa aos anunciantes dele. Quando se torna praticamente um monopólio, isso também quer dizer que a empresa terá o condão de decidir o que as pessoas veem ou não na internet.
É evidente que, respeitando a livre concorrência, teríamos muito mais opções.
Não é a primeira vez que algo semelhante acontece na área das Big Techs. Aliás, num país fundado sobre a liberdade econômica como os EUA, é difícil entender que se tenha formado um mercado baseado em inovação mas com um número de players tão limitado. É evidente que, respeitando a livre concorrência, teríamos muito mais opções.
A grande questão é como lidar com essas práticas e colocar esse mercado nos trilhos da liberdade econômica. A União Europeia fez, em 2017, com que o Google pagasse uma multa de € 2,42 bilhões num processo antitruste também relacionado a esse mercado de anúncios. A União Europeia concluiu que havia concorrência desleal no mercado de comparação de mercadorias, onde entrou o Google Shopping. Ali, se entendeu que o Google cometeu um abuso capaz de esmagar seus concorrentes. Qual seria ele? Dar, na busca de palavras, prioridade ao Google Shopping, que seria um serviço separado, competindo com vários outros.
A concorrência desleal e busca pelo monopólio tem sido uma realidade no mercado das Big Techs.
O processo dos EUA é diferente porque mira nos bilhões que o Google pagou à Apple, Samsung e Mozilla para ser instalado como a ferramenta de busca padrão. Essa prática, durante os últimos 15 anos, é vista como predatória.
Perceba que os dois casos se somam e explicam como só algumas poucas empresas controlam um mercado que teria tudo para abrigar uma multiplicidade jamais vista de iniciativas empreendedoras e opções.
Primeiro, segundo o processo dos EUA, o Google paga empresas para ser instalado como ferramenta de busca padrão. Depois, como mostrou o processo da UE, usa essa ferramenta de busca para privilegiar outro produto seu, o Google shopping. Não podemos cair no erro de pensar que o Google é um grande vilão e ponto. A concorrência desleal e busca pelo monopólio tem sido uma realidade no mercado das Big Techs.
Em 1998 o Departamento de Justiça dos EUA moveu um caso gigantesco e rumoroso contra a Microsoft. Coincidentemente, era o ano em que o Google foi fundado por dois estudantes de Stanford.
Na época, o wi-fi estava começando a se popularizar nos EUA. O navegador mais usado era o Netscape Navigator (quem lembra?) e a Microsoft fez um concorrente, o Internet Explorer, lançado junto com o Windows 98.
Não podemos cair no erro de pensar que o Google é um grande vilão e ponto.
A Netscape fazia só o browser. A Microsoft já fazia muito mais coisas e resolveu usar seu peso nessa concorrência específica. Naquela época, você precisava ter um provedor de internet. Aqui tínhamos primeiro Mandic e STI e depois vieram UOL, AOL, Terra e correlatos. Nos Estados Unidos havia muito mais. A Microsoft começou a fechar acordos com os provedores de internet para que privilegiassem seu software sobre o da Netscape. Mas a outra empresa não poderia fazer o mesmo e oferecer acordos melhores? Não. Ela não produzia sistemas operacionais como a Microsoft, produzia só o software.
A sentença determinou que a Microsoft fosse dividida em dois para evitar práticas predatórias de mercado. Uma empresa deveria ser do segmento de software e outra de produção de sistemas operacionais. Se chegou à conclusão de que a soma das duas atividades sabota a concorrência e a competitividade. Como você sabe, a Microsoft continua fazendo as duas coisas. A empresa conseguiu reverter a sentença. Agora, o governo dos EUA também tenta fazer com que o Google seja quebrado, revertendo fusões de 15 anos atrás.
Só sabemos que não é possível haver liberdade real sem liberdade econômica e ela depende de práticas saudáveis de livre concorrência.
A argumentação do Google é bem interessante. Um exército de advogados top de linha argumenta que o caso é muito diferente daquele da Microsoft. A empresa alega que as pessoas optavam pelo navegador da Microsoft mas preferiam o da Netscape e isso só acontecia devido aos acordos que desafiavam a livre concorrência. No caso do Google seria diferente. As pessoas usam o Chrome porque preferem mesmo, não querem concorrentes como o Bing.
Verdade seja dita, o maior problema de concorrência que o Google vem tendo é devido ao surgimento de tecnologias de inteligência artificial como o Chat GPT. A empresa tenta emplacar seu Bard usando todo tipo de estratégia concorrencial, mas não tem conseguido.
Ainda não sabemos no que vai dar o julgamento. Também não sabemos se a entrada da IA no mercado das Big Techs trará mais liberdade econômica ou mais monopólio.
Só sabemos que não é possível haver liberdade real sem liberdade econômica e ela depende de práticas saudáveis de livre concorrência. As Big Techs serão postas nos trilhos pelas regulações estatais ou pela mão invisível do mercado? Façam suas apostas. Aliás, bom apostar também se elas entram nos trilhos ou vão se agigantar ainda mais.
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