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Quem define o que é verdade? É um questionamento corriqueiro que demonstra a distopia que vivemos. A verdade se impõe, ela é, simples assim. Verdade é constituída de fatos objetivos e verificáveis. A questão surge porque distorcemos, sem perceber, o conceito de verdade. Muitas vezes a palavra verdade é usada para descrever outra coisa, algo que seja mais palatável para um grupo, que geralmente se chama de narrativa. Aliás, acabamos de ver o presidente Lula fazer esse exercício retórico falando da ditadura da Venezuela. Nem ele nem os políticos são, no entanto, monopolistas da técnica.

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Um estudo publicado na revista Nature em janeiro de 2017 mostra que na lógica de massas, a resposta “surpreendentemente popular” tende a ser mais adotada que a verdade dos fatos. O estudo foi feito em conjunto pela Universidade de Princeton e pelo MIT, Instituto de Tecnologia de Massachussets. A técnica foi fazer perguntas a grupos específicos e ter um detalhamento a mais, diferenciando o que as pessoas acham que é a resposta correta e o que elas pensam que seria a resposta mais popular. Eles chamaram esse processo de “algoritmo do surpreendentemente popular”.

Temos vergonha de ser quem somos e temos a oportunidade de projetar nas redes a imagem do ser ideal que gostaríamos de ser.

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O mais interessante é que havia perguntas sobre as capitais dos Estados americanos. Não há nuances nem debate. Ou é a capital ou não é. Mas, ainda assim, as pessoas tendem a optar pela resposta surpreendentemente popular. Isso foi verificado porque o estudo é feito em duas fases. Primeiro se pergunta diretamente qual a capital de um Estado. Numa outra fase são feitas as duas perguntas em separado, qual você acha que é a resposta certa e qual você acha que será a resposta mais popular.

Um caso interessante é o da capital da Pensilvânia. A maior cidade e mais conhecida é a Filadélfia. Mas a capital mesmo é Harrisburg. Num primeiro momento, se pergunta às pessoas se a capital da Pensilvânia é a Filadélfia, com a resposta sim ou não. Depois, se pergunta às pessoas se a capital da Pensilvânia é a Filadélfia, mas dividindo em duas partes: qual você acha que é a resposta certa e qual você acha que é a resposta mais popular.

Quantos serão os que ainda vão escolher os fatos em detrimento da sensação de pertencimento a um grupo se tudo na vida passa a ser a dinâmica de grupo?

Foram feitas perguntas sobre todos os 50 Estados norte-americanos. Quando se divide o questionamento entre resposta certa e resposta popular, a taxa de erro cai em 48%. É assustador, mas é a realidade das sociedades humanas. As pessoas tendem a defender o que elas creem que seja a opinião majoritária. "O argumento deste artigo, em um sentido geral, é que as pessoas que esperam estar em minoria merecem uma atenção extra", afirmou o coautor Drazen Prelec, professor da Escola de Administração Sloan do MIT, assim como de economia e ciências do cérebro e cognitivas. "Em situações em que há informações suficientes na multidão para determinar a resposta correta a uma pergunta, essa resposta será aquela que supera as expectativas de popularidade."

Diante do dilema moral, nossa tendência é condenar as pessoas que optam pela corrente majoritária. Ocorre que todos nós já fizemos isso em algum momento, seja por necessidade de aceitação ou de sobrevivência. É algo que faz parte do nosso cotidiano. É melhor ser feliz ou ter razão?

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Acabamos sempre enfiados nas famosas bolhas, onde assumimos que existe uma opinião de consenso ou incrivelmente popular.

Vivemos a polarização, então nossa tendência é jogar esse raciocínio direto para a política e para as narrativas desse cenário. Mas isso permeia toda a convivência humana. Pense na sua família e amigos. É comum abandonarmos discussões infrutíferas fingindo concordar com algo de que discordamos. Isso não é uma falha, é uma tática de sobrevivência em grupo escolher nossas brigas. Pense agora na vida educacional e profissional. Esse mecanismo geralmente é descrito como engolir sapos.

O que muda nas redes sociais é o contexto. Acabamos sempre enfiados nas famosas bolhas, onde assumimos que existe uma opinião de consenso ou incrivelmente popular. Isso potencializa incrivelmente o efeito natural de desprezar o que sabemos ser a verdade para optar pelo que é mais popular dentro do grupo. Ocorre que essa prática molda nossa mente, cria um hábito. As situações em que enfrentamos o dilema entre optar pela verdade e pelo pertencimento são aumentadas num nível de normalizar a opção pela aderência ao grupo sempre.

Vivemos colados nos nossos celulares, moldamos nossa convivência e nossos diálogos por essa experiência. Passamos a reproduzir isso na convivência offline. É gigantesco o risco de nos deixarmos adestrar por essa dinâmica. Por isso o questionamento: os algoritmos das redes sociais serão o fim da verdade? Quantos serão os que ainda vão escolher os fatos em detrimento da sensação de pertencimento a um grupo se tudo na vida passa a ser a dinâmica de grupo?

Aceitar a condição humana é um desafio gigantesco. Temos vergonha de ser quem somos e temos a oportunidade de projetar nas redes a imagem do ser ideal que gostaríamos de ser. É uma tentação gigantesca para abolir a verdade. Não é possível, no entanto, ter avanços para as sociedades humanas abrindo mão da realidade objetiva. Passou da hora de refletir sobre esses temas. Quanto mais a tecnologia avança, mais precisamos entender de gente. É um processo tão doloroso quanto necessário.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]