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Twitter processa ONG britânica por cancelamento

(Foto: Reprodução do perfil de Elon Musk no X)

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Esta semana, o Twitter, que agora se chama X, processou a ONG britânica CCDC. O Center for Countering Digital Hate produz relatórios de muito impacto sobre a forma como as redes sociais potencializam ataques e ações de ódio. Isso realmente é verdade. A questão agora é outra, os métodos que a ONG tem utilizado para enfrentar a questão.

O mais parecido com essa situação que conhecemos aqui no Brasil é o Sleeping Giants. Falamos, no entanto, de organizações de natureza muito diferente. Enquanto a origem da brasileira é duvidosa e até hoje mal explicada (aqui um artigo com 20 perguntas jamais respondidas), a britânica é bem conhecida.

O staff é formado por pesquisadores conhecidos ligados ao Labour Party do Reino Unido. A instituição faz relatórios muito interessantes falando de um problema que realmente existe, o impacto social e político do business das Big Techs no mundo todo.

Um problema grave que ainda não sabemos como enfrentar é a distância entre o funcionamento real das Big Techs e o que as pessoas pensam que seja esse funcionamento. É por meio desse desconhecimento que muitas pessoas são manipuladas emocionalmente.

O exemplo clássico de algo que não sabíamos há alguns anos e agora já percebemos é a venda de anúncios segmentados. Você já deve ter tido a experiência de procurar algo que queria comprar e depois passar a ver inúmeros anúncios disso em todas as páginas que entram. 

Um problema grave que ainda não sabemos como enfrentar é a distância entre o funcionamento real das Big Techs e o que as pessoas pensam que seja esse funcionamento

Há até vídeos anedóticos no Tiktok de meninas ensinando como fazer os namorados comprarem presentes. Elas falam perto do celular deles frases como “por que você deve comprar flores para sua namorada”, “quais os melhores restaurantes para surpreender sua namorada”, “como descobrir os presentes que sua namorada deseja”. Depois elas mostram os anúncios aparecendo nas redes deles.

Esse é o negócio, a venda de anúncios hipersegmentados, direcionados exatamente à pessoa que pode comprar. O problema é outro, como as plataformas conseguem as informações para posicionar esses anúncios corretamente. É preciso manter os usuários na plataforma o maior tempo possível.

Como fazer isso? Usando sentimentos. Nós amamos odiar. Ódio e medo mantém as pessoas na rede. Todos nós já tivemos a experiência de permanecer respondendo algo e depois nos questionar por que estávamos batendo boca com estranhos. 

Postagens de ataques a uma pessoa ou a um grupo têm 67,5% mais chances de viralizar. As pessoas pensam que seguem determinados perfis e recebem o que aqueles perfis postam, esse é o problema. Todos nós seguimos amigos cujas postagens não vemos e, de repente, são pessoas que postam todos os dias. Ao mesmo tempo, vemos postagens de pessoas que não seguimos. 

As redes nos apresentam as postagens que têm mais chances de nos manter usando a plataforma, não aquilo que seguimos. Quando entendemos esse mecanismo, o problema diminui. É o engano que leva as pessoas a serem manipuladas. Isso tem impacto social e político.

Como resolver esse problema? Concretamente não há uma solução, mas diversas tentativas no mundo todo. No meio desse processo, muitas pessoas, organizações e instituições se meteram a um tipo de heroísmo esquisito fundamentado em bullying, distorção da realidade e censura.

Todos nós já tivemos a experiência de permanecer respondendo algo e depois nos questionar por que estávamos batendo boca com estranhos

A lógica desses grupos é a urgência para conter o ódio direcionado a pessoas ou grupos, que é ativamente promovido porque engaja. O problema é que usam exatamente os mesmos métodos de ataque para tentar conter os ataques. Apagar fogo com gasolina geralmente dá errado.

Aqui no Brasil, a Rádio Jovem Pan tentou uma ação do tipo contra o Sleeping Giants, a quem havia cedido anos atrás, promovendo demissões. Não teve sucesso. No caso do Twitter contra o CCDC ainda não sabemos qual será o resultado, mas é interessante acompanhar. 

A primeira alegação do Twitter é que a ONG fez um relatório utilizando de forma ilegal dados da empresa. Teria de ter pedido acesso, mas isso foi feito sem a concessão. Além disso, alega que os dados teriam sido distorcidos.

O relatório do CCDC relata a falta de ação contra perfis verificados da rede. São elencadas postagens denunciadas como de ódio e, em 99% dos casos, a plataforma não teria tomado nenhuma atitude para estancar os ataques direcionados. O Twitter alega que a maioria das reações às postagens eram comentários positivos, não ataques.

É uma situação complexa. As plataformas realmente deixam rolar os ataques direcionados. O sucesso do Sleeping Giants no Brasil é um caso lapidar. O grupo alega combater discurso de ódio mas o método é o bullyng direcionado, com uma justificativa moral e sem uma relação clara de causa e consequência. 

Ninguém sabe exatamente de que forma a desmonetização da Rádio Jovem Pan diminuiria o discurso de ódio nas redes. Por que não mirar, por exemplo, nos inúmeros grupos neonazistas que se multiplicam pelo país?

Muitas vezes vemos até na imprensa relatos de que o grupo teria tido sucesso combatendo discurso de ódio. A grande questão é a métrica. Se utiliza o montante de patrocínios cancelados. Mas não há um cotejamento entre a ação do grupo e a real diminuição de ataques, até porque o método do grupo é exatamente o mesmo daqueles que ele diz combater.

O Twitter alega algo semelhante com relação ao CCDC, que tem uma atuação mais abrangente, com pesquisas, produção de manual e de estudos sérios. Diz que a ONG partiu para o bullying tentando o silenciamento e censura dos discordantes. 

Num comunicado oficial, a rede social menciona quatro pontos em que a ação do CCDC excede a tentativa de conter ódio digital e passa à censura:

  • Atacando pessoas em todas as plataformas que falam sobre questões com as quais o CCDH não concorda.
  • Tentando coagir a remoção de usuários cujas opiniões não se conformam com a agenda ideológica do CCDH.
  • Atacando organizações de liberdade de expressão ao focar em suas fontes de receita para remover serviços gratuitos para as pessoas.
  • Tentando ilegalmente obter acesso não autorizado aos dados das plataformas de mídia social e usar esses dados de forma indevida.

Em um post, o Twitter declarou o seguinte:

“A liberdade de expressão é fundamental para o funcionamento saudável de uma sociedade global - e se ela for retirada, é quase impossível recuperá-la. É por isso que continuaremos a defender os direitos das pessoas, incluindo os mais de meio bilhão de vocês que continuamente recorrem à nossa plataforma.

A liberdade de expressão e a segurança da plataforma não estão em conflito. Apesar de nosso progresso contínuo, o Center for Countering Digital Hate (CCDH) e seus apoiadores têm trabalhado ativamente para fazer alegações falsas e enganosas sobre X e impedir o diálogo público.

É por isso que X entrou com uma ação legal contra o CCDH e seus apoiadores”.

O Center for Countering Digital Hate não se manifestou sobre o caso.

Temos muita dificuldade em defender a liberdade que recebemos de graça. Pessoas criadas em ambientes sem liberdade de expressão geralmente detectam imediatamente quando ela está ameaçada. Nós, que entramos na idade adulta numa realidade de liberdade de expressão, podemos tender a pensar que ela é um elemento da natureza.

A realidade é que cada geração precisa lutar pelas liberdades porque a tentativa de supressão delas é uma tentação latente para os que têm poder. Aqui falo do Estado, dos políticos e também dos poderosos, como as Big Techs. 

Não há dúvidas de que o caso do Twitter contra o CCDC vale ser acompanhado. Resta saber de que forma nós, como sociedade, poderemos nos organizar para garantir as liberdades individuais dos cidadãos nesse caldo de interesses poderosos.

Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima

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