Com o retorno das atividades no blog, voltam também alguns pitacos sobre filmes que podem ser assistidos no conforto do seu sofá. Os textos, que não são críticas, mas sim comentários “pé no chão” sobre as obras, vão ser publicados com o título de “Cinema em Casa recomenda”. Tem alguma sugestão de filme para ser discutido ou lembrado no blog? Deixe nos comentários!
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Dez anos após um “colapso” que atingiu o mundo – ou talvez apenas o país, não se sabe – as estradas australianas se transformaram em um lugar muito perigoso para se estar. Os que sobreviveram vivem escondidos em casas decrépitas e cidades fantasmas, evitando, se possível, qualquer contato com estranhos. Comida e combustível são disputados e vendidos a preço de ouro. Homens matam e roubam impunemente.
O cenário acima poderia servir muito bem para descrever a série Mad Max, certo? Mas, neste caso, também serve como sinopse de um filme que passou despercebido do grande público ano passado e merece ser “redescoberto”, seja pelos fãs de Max Rockatansky quanto por quem está à procura de uma obra de ação mais intimista. The Rover – A Caçada (The Rover, 2014) estreou no Festival de Cannes e teve uma passagem tímida pelos cinemas brasileiros. Agora, está no Netflix.
The Rover é o segundo longa-metragem do diretor e roteirista David Michôd, após o bem-sucedido Reino Animal (Animal Kingdom), drama policial que chamou a atenção da crítica, fez uma boa carreira em festivais e chegou a receber uma indicação para o Oscar, de Melhor Atriz Coadjuvante para Jacki Weaver. A trama é econômica: em um cenário pós-apocalíptico, um homem de poucas palavras, vivido por Guy Pearce, sai atrás de uma gangue de criminosos que roubou seu carro. Ele quer o veículo a qualquer custo e, logo no início da perseguição, dá de cara com o irmão do líder da gangue, um sujeito meio abobalhado que vira seu refém e, aos poucos, uma espécie de “parceiro” durante a viagem.
A figura do homem misterioso que é inicialmente subestimado mas se revela cheio de habilidades e um osso duro de roer pra seus inimigos é figura constante no gênero de ação – Jason Statham, Charles Bronson, Steve Seagal e Arnold Schwarzenegger que o digam. Eric, o protagonista de The Rover, no entanto, foge à regra. Ele é um anti-herói de carisma zero, um sujeito atormentado sem nada a perder, tão sanguinário quanto aqueles que encontra pelo caminho. Logo no início da trama, o espectador percebe que o personagem de Guy Pearce está longe de ser um “mocinho” típico. David Michôd parece martelar o tempo todo que, em seu mundo desintegrado, não há mais espaço para heróis e a humanidade perdeu, há um bom tempo, a fé em si mesma.
E, ao fim, é justamente a busca por algum resquício de humanidade que norteia a perseguição de Eric aos ladrões do seu carro, mesmo que, para isso, ele precise se afundar cada vez mais em uma espiral de violência e insanidade. Guy Pearce está ótimo como este homem que já ultrapassou seus limites e arrasta consigo um jovem “inocente”, vivido por Robert Pattinson. O protagonista da série Crepúsculo, inclusive, é uma das boas surpresas do filme, sendo uma contraparte eficaz ao silencioso e rancoroso Eric.
Aqueles que esperam um filme de ação movimentado, com tiroteios intensos, pirotecnias e perseguições no deserto à lá Mad Max, certamente irão se decepcionar. Assim como o desfecho pode desagradar a muitos, embora seja eficiente, considerando a proposta da obra. The Rover é um filme de ambientação, que tem seu próprio ritmo, normalmente lento, ressaltado pelas longas sequências da dupla atravessando os desertos da Austrália, em silêncio, rodeados por um cenário igualmente belo e desolador.
Alguns hão de se lembrar de A Estrada (The Road, 2009), outro filme passado em um cenário pós-apocalíptico, em que dois homens tentam sobreviver lutando contra seus pares, sem que, em nenhum momento, surja uma explicação convincente sobre o que aconteceu. Assim como na obra baseada no livro de Cormac McCarthy, The Rover nos fornece um breve lampejo sobre a que ponto podemos chegar quando somos deixados à própria sorte e parece não haver sentido em se levantar e encarar o dia seguinte. O mais difícil, fica evidente, não é encher a barriga ou continuar vivo, mas sim, manter sua sanidade.
Confira abaixo o trailer do filme:
Já assistiu a The Rover? O que achou do filme? Deixe seus pitacos nos comentários!
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