Lembro com carinho de uma certa noite na faculdade, em Itajaí (SC), quando algum professor passou para a turma Cidade dos Sonhos (Mulholland Dr., 2001), um dos filmes mais cultuados e discutidos de David Lynch. Prato cheio pra rapaziada ficar discutindo por horas, buscando os significados ocultos da obra e as pistas deixadas pelo diretor para botar ordem na cabeça do espectador. É um filme belo, intrigante e desafiador, sem dúvida.
Descrever a sinopse do filme é uma tarefa um tanto quanto árdua e talvez até irrelevante, considerando-se a proposta da obra, mas vamos lá. Em Eraserhead, somos apresentados a Henry (interpretado por Jack Nance), um rapaz que trabalha em uma fábrica de impressão e recebe a notícia de que sua namorada teve um filho prematuro. Os dois vão morar no minúsculo apartamento de Henry, mas a garota o abandona logo em seguida, deixando-o sozinho com o bebê. OK, não é bem um bebê, mas sim uma espécie de mutante com cabeça de réptil que permanece com o corpo enfaixado em cima de uma escrivaninha.
O editor-geral do livro 1001 Filmes para Ver Antes de Morrer, Steven Jay Schneider, conclui sua análise sobre Eraserhead com um parágrafo que deixa claro o impacto da obra de David Lynch: “Nenhum resumo da trama de Eraserhead, por mais ‘exato’ que seja, será capaz de comunicar o tom deste filme único e desafiador. As sensações de profundo incômodo ou mesmo horror provocadas pelo filme, que só aumentam quando ele é visto repetidas vezes, são simplesmente inesquecíveis”.
O crítico do The Guardian, Peter Bradshaw, em uma sucinta análise, definiu Eraserhead como um “pesadelo em preto e branco de horror e ansiedade”, para em seguida descreve-lo como “belo e estranho”. Essa última observação de Bradshaw vem a calhar. O fato de ser constantemente tachado por críticos e espectadores como “perturbador” não significa que o filme seja intragável ou grotesco. Pelo contrário. Eraserhead perturba por conseguir transpor tão bem para a tela aquelas imagens e sensações que só sentimos quando estamos dormindo e sofrendo de algum pesadelo incômodo.
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