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O circo de horrores que chocou Hollywood

Dentro de uma tenda de circo, uma fila de curiosos se amontoa em direção a uma caixa de madeira, que contém uma atração misteriosa. Um a um, os visitantes espiam o conteúdo da caixa, para virarem o rosto em seguida, horrorizados. O animador do circo revela: “Ela já foi uma linda mulher”. E aí, tem início, por meio de um longo flashback, o terror Monstros (Freaks, 1932), obra do diretor Tod Browing que chocou não só os poucos espectadores que se propuseram a ver o filme, mas também toda a indústria cinematográfica da década de 1930.

Hoje, oito décadas depois, Monstros ganhou o status de cult, mas recebeu na época a alcunha de “maldito” – tanto que seu diretor não se recuperou do fracasso comercial e de crítica e se aposentou precocemente sete anos depois do lançamento do filme. É considerado, talvez com certo exagero, um dos filmes mais perturbadores já lançados por um grande estúdio – no caso, a MGM.

O diretor Tod Browing cercado por seus “freaks”.

O potencial de Monstros para espantar e chocar plateias se baseia não em sua história, quase banal e com poucos sustos, mas sim na escolha do diretor em rechear o elenco com uma série de atores bastante “diferentes”. Os tais freaks do título original não usam qualquer maquiagem ou truque de cinema: são portadores de anomalias e má-formações tratados, no filme, como atrações de circo. Há aqueles nascidos sem braços ou pernas, anões, irmãs siamesas, mulher barbada e outros seres pouco capazes de despertar qualquer empatia do grande público, devido justamente a suas limitações – mesmo que se mostrem íntegros, amigos e apaixonados pelo que fazem.

 A trama gira em torno de um elegante anão de circo que recebe uma fortuna como herança e, logo, atrai a ambição de uma trapezista e seu comparsa, o “Homem-Músculos” da trupe. Os dois são os únicos integrantes ditos “normais” do grupo. Jogando todo seu charme para o ingênuo anão, a trapezista se casa com o pequeno e arma um plano para envenenar o recém-marido. Os “monstros”, porém, descobrem o golpe e armam uma vingança terrível.

Para compreender como um estúdio como a MGM bancou a produção de um filme tão controverso é preciso voltar um pouco no tempo. O início da década de 1930 em Hollywood ficou marcado justamente por uma avalanche de filmes de terror gótico, que se mostraram bastante populares entre o público. As duas obras que deram a largada para esta onda foram Frankenstein (1931) de James Whale, e Drácula (1931), adaptação de peça da Broadway que buscou nos palcos seu protagonista, Bela Lugosi – a direção ficou por conta justamente de Tod Browing.

Os dois filmes foram lançados pela Universal, que se notabilizou por investir no gênero ao longo da década, com uma série de outras produções, como A Múmia (The Mummy, 1932) e A Noiva de Frankenstein (Bride of Frankenstein,1935). A MGM não quis ficar para trás e deu carta branca para Browing produzir um filme tão ou mais aterrorizante do que os do estúdio rival. “Quero que façam algo mais apavorante do que Frankenstein”, teria reforçado um dos chefões da MGM, Irving Thalberg.

A trapezista Cleópatra, vilã do filme.

Browing então se aproveitou para reviver os velhos tempos da adolescência, em que abandonou os pais ricos para se juntar a um circo itinerante. As ditas aberrações do filme foram contratadas pelo diretor em produções undergrounds do show business europeu e americano. Eram de fato atores, artistas que não viram problema algum em entrar para a empreitada. Durante a filmagem, que durou dois meses, ficaram hospedados no estúdio da MGM em Hollywood, com direito a camarins individuais e maquiadores.

Apesar da boa intenção do diretor e de seu elenco, a recepção foi horrorosa. Tanto pelo asco que, infelizmente, os atores causavam no público, quanto pelo tom um pouco pesado demais, mesmo com o sucesso dos filmes de terror da época. O desfecho de Monstros, que mostra a vingança da trupe contra a trapezista e o “Homem-Músculo”, é mesmo violento e macabro e, ainda assim, mais leve do que o final original filmado por Browing. Uma sequência alternativa, com um escancarado final feliz para o anão ludibriado, também foi acrescentado por ordem do estúdio.

Assim como ocorre com muitos outros filmes execrados na época em que foram lançados, Monstros foi atacado e esquecido para então ser resgatado tempo depois, a partir dos anos 1960 – há críticos que inclusive o consideram um filme de vanguarda, na tradição dos europeus Luis Buñuel e Alain Robbe-Grillet. Por outro lado, há quem continue o achando apelativo ou demasiado bizarro. Aí, vai da percepção de cada um. Mas é preciso reconhecer: independente de seus méritos ou falhas, é um filme corajoso. E que, para os curiosos, pode ser encontrado hoje com facilidade em lojas especializadas ou na internet.

Quer ter um gostinho? Veja abaixo o trailer do filme!

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