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2013 foi um ano de altos e baixos para a indústria cinematográfica norte-americana. Filmes de grande orçamento e com elenco estrelado, como O Cavaleiro Solitário (The Lone Ranger) e Depois da Terra (After Earth) penaram para conseguir ao menos cobrir os custos de produção. Por outro lado, filmes menores, de investimento enxuto, se transformaram em rentáveis sucessos de bilheteria, como a comédia nonsense É o Fim (This Is the End) e o terror A Invocação do Mal (The Conjuring).

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Neste cenário, nenhum outro filme foi tão bem-sucedido (ao menos em termos de arrecadação) como o suspense Uma Noite de Crime (The Purge), dirigido e escrito por James DeMonaco e protagonizado por Ethan Hawke. Até semana passada, o filme havia arrecadado em todo o mundo cerca de US$ 90 milhões. Pouco, se formos pensar no padrão dos blockbusters hollywoodianos. A questão é que o thriller futurista custou apenas US$ 3 milhões. Com isso, Uma Noite de Crime conquistou o troféu de produção mais rentável do verão americano (o lançamento por lá foi em junho) nos últimos 25 anos.

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O título brasileiro praticamente entrega a interessante – e mal aproveitada – premissa do filme. Em um futuro próximo, os Estados Unidos sucumbiram a uma esmagadora onda de crimes e prisões superlotadas (cenário não muito diferente do atual, tanto por lá quanto no Brasil). A saída dos governantes foi sancionar o “dia do expurgo” ( o tal “the purge” do título), uma data anual em que, por 12 horas, qualquer habitante do país tem autorização para cometer crimes, incluindo assassinato, sem ser impedido pelas forças de segurança e sem sofrer qualquer punição posterior. Na lógica um tanto quanto distorcida do thriller, a medida é bem-sucedida e logo as taxas de criminalidade despencam. A paz, a princípio, foi restaurada.

Uma Noite de Crime inicia justamente nas horas anteriores ao expurgo anual. A família que é foco do suspense tem uma peculiaridade: o marido e pai de dois filhos, vivido por Ethan Hawke, ganha a vida justamente vendendo sistemas de segurança caríssimos para moradores abastados que querem garantir a segurança durante as 12 horas em que a violência explode todos os anos. Logo fica evidente um “efeito colateral” que permeia o expurgo. Ao fim, a medida assume a tarefa de “limpeza social”: quem pode pagar por isso, se isola em fortalezas impenetráveis, enquanto os pobres são caçados pelas ruas justamente pelos ricos, armados até os dentes e movidos por uma sede de sangue insaciável.

Ao mesmo tempo, as 12 horas de crimes trazem à tona uma questão que já foi tema de filmes, livros e teses acadêmicas por aí: a fascinação pela violência e o efeito que ela pode exercer nos seres humanos, quanto estes não estão presos a regras morais ou legais. Alguém já deve ter lhe feito esta pergunta, mesmo por brincadeira – se você soubesse que não seria punido nem descoberto, cometeria um crime, mesmo que fosse uma infração “menor”, como um furto? E se pudesse cometer assassinato sem pagar por isso?

De fato são questões pertinentes. Ótimas obras cinematográficas já discutiram a respeito, cada uma a seu modo, como Laranja Mecânica (The Clockwork Orange, 1971), Violência Gratuita (Funny Games, 1997), Clube da Luta (Fight Club, 1999), Sob o Domínio do Medo (Straw Dogs, 1971), Dogville (2003) e A Onda (Die Welle, 2008). Uma Noite de Crime tinha potencial para entrar nesse grupo, mas opta pelo caminho “mais fácil”, ao transformar-se, principalmente na segunda metade do filme, em um mero suspense de perseguição doméstica, com furos no roteiro, situações forçadas e um desfecho politicamente correto.

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A história tem como ponto focal uma atitude do filho do casal protagonista que traz até a porta da família um grupo de jovens ricaços praticando o “expurgo”. O garoto, num rompante de solidariedade, desativa o sistema de segurança da casa para receber um homem negro que estava sendo perseguido pelo grupo. Os assassinos, então, fazem uma oferta à família: eles precisam entregar o homem desconhecido para ser morto ou então a casa será invadida e todos ali dentro também sofrerão a fúria homicida.

Aqui, mais um dilema moral surge e, assim como as outras questões, é tratado de forma rasa e apressada. Em vários momentos da trama, o diretor e roteirista dá aquela “contribuição mágica”, mudando inesperadamente o comportamento dos personagens e criando situações atípicas, tudo para que a história possa prosseguir. E, ao fazer isso, usa e abusa de um clichê típico dos filmes de suspense. Em várias ocasiões, um dos integrantes da família está prestes a ser morto quando o assassino é atingido de surpresa por trás, com tiros. A cena funcionaria uma vez. Quatro ou cinco vezes, exatamente da mesma forma, já parece tiração de sarro.

A aceitação pelo público (transformada em lucro nas bilheterias) fez com que o óbvio acontecesse: Uma Noite de Crime vai ganhar continuação, com James DeMonaco novamente na direção. Segundo matéria da Variety publicada semana passada, a Universal já cravou até a data de estreia da sequência, que chegará aos cinemas em 20 de junho de 2014. A intenção, a princípio, é que as filmagens comecem ainda neste ano, apesar de que não há por enquanto qualquer anúncio sobre o roteiro ou os elencos envolvidos. Quem sabe seja uma oportunidade para discutir mais a fundo os elementos que foram subvalorizados no primeiro filme… ou quem sabe seja só mais uma oportunidade para apresentar outro filme raso, que, mesmo assim, vai ao menos cobrir com folga os custos. E assim a vida segue…

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