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Eleição é uma coisa, governar é outra

Não é preciso forçar muito a memória para lembrar três temas cruciais das últimas eleições presidenciais: aborto, segurança pública e privatizações. O PT de Dilma Rousseff cravou posições em todas. E nesta semana mostrou que o discurso eleitoral é bem diferente da prática governamental.

Dizem alguns especialistas em pesquisas que a petista só não ganhou no primeiro turno em 2010 porque foi vítima de uma revolta conservadora. Líderes religiosos bombardearam o posicionamento histórico do PT a favor da descriminalização do aborto. No segundo turno, Dilma garantiu que enterraria a bandeira e conseguiu esfriar o assunto.

Na terça-feira passada, Eleonora Menicucci tomou posse como ministra da Secretaria de Política para as Mulheres e defendeu que o aborto seja discutido como uma questão de saúde pública. Por outro lado, ressaltou que essa é uma posição pessoal, que não interessaria a partir do momento em que ela assumisse o cargo. Faz sentido, mas ainda assim não se encaixa com o discurso de 2010.

Um dia antes das declarações, houve o leilão para a privatização dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília. O processo foi considerado um sucesso financeiro – o governo federal vai arrecadar R$ 24,5 bilhões, 373% a mais do que o preço mínimo previsto. Tudo perfeito, não fosse uma nova quebra do discurso histórico antiprivatista do PT, que também esteve fortemente presente na campanha de Dilma.

Por último, aconteceu a greve dos policiais militares na Bahia. O PT, concebido com os dois pés no movimento sindical e na luta pela valorização dos trabalhadores, ficou contra os manifestantes. Em 2001, entretanto, uma paralisação similar foi apoiada pelo então eterno candidato Lula, enquanto Dilma se apegou à bandeira da “segurança pública com cidadania”.

Os três episódios servem como uma reflexão sobre o que é ideologia política, marketing eleitoral e exercício do poder. Quase nunca uma prática é compatível como a outra. Forma-se então um jogo de “me engana que eu gosto”.

Petistas de carteirinha com certeza não aprovaram a jogada para afastar Dilma das polêmicas ético-religiosas da campanha. Mas relevaram porque essa era uma estratégia para evitar que os “tucanos privatistas” voltassem ao poder. Agora é Dilma quem privatiza…

No Senado, Alvaro Dias (PSDB) foi ligeiro no ataque e classificou a concessão dos aeroportos como “estelionato eleitoral”. Está certo por um lado, mas por outro se esquece do passado tucano. Aliás, um passado escondido no armário de José Serra durante a campanha eleitoral.

Cada vez mais se percebe uma inversão de papéis e valores. O PSDB quer ficar mais parecido com o PT – e vice-versa. Uma confusão só.

Nada contra um candidato ser a favor da descriminalização do aborto, das privatizações e da repressão das manifestações de policiais. Afinal, essas são sim questões de ideologia. O doído é não falar isso na hora que mais importante, a eleição.

O problema está nesse simples equívoco de prometer uma coisa e fazer outra. É uma dissimulação joga todos os partidos em geral na vala comum. Rever posições não é uma traição (faz parte do processo de amadurecimento político), desde que a mudança seja bem explicada.

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