Nem Freud explicaria os valores embutidos nas principais discussões políticas do momento. O que é sigilo e mordaça para uns, é um melhor-deixar-pra-lá para outros. Há os que acreditam que privilegiar parentes em cargos públicos é uma questão de mérito – e os que enxergam o fato simplesmente como nepotismo.
É ambíguo, mas tem lá a sua lógica: o que “eu” faço é de bom coração. Já o que “eles” fazem sempre cheira a sacanagem. Mesmo que seja exatamente o que “nós” fizemos no passado (ou faremos no futuro).
A começar pelo decano da política nacional. Com 56 anos seguidos de mandatos eletivos nas costas, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tem sido ao lado do colega Fernando Collor (PTB-AL) o principal obstáculo para a aprovação do projeto que acaba com o sigilo eterno de documentos oficiais. Segundo ele, não é certo fazer “wikileaks” da história do Brasil – ou seja, é melhor para todos nós que continuemos não tendo informações sobre algunas cositas de nuestras fronteras.
O mesmo Sarney, por outro lado, virou um leão na defesa da transparência ao criticar o governo por tentar aprovar um dispositivo que garante segredo sobre as licitações de obras para a Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016. Argumentou que a proposta “inevitavelmente” levanta dúvidas sobre os orçamentos da Copa.
Os mesmos dois assuntos fazem o governo andar em ziguezague. A nova ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, já foi a favor do sigilo eterno para os documentos oficiais, mas mudou de ideia na semana passada. Nem por isso defendeu transparência total para as obras da Copa.
No Paraná, mudam-se os assuntos, repetem-se as práticas. Em maio, o governador Beto Richa e o presidente da Assembleia Legislativa, Valdir Rossoni, ambos do PSDB, anularam a nomeação de Maurício Requião (irmão do ex-governador Roberto Requião) para a vaga de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Ninguém nega razão aos tucanos – o processo que levou à escolha de Maurício tem mesmo sinais claros de nepotismo.
O estranho é que, na semana passada, o mesmo Legislativo presidido por Rossoni aprovou a proposta de Beto para a criação de duas supersecretarias. A pasta da Família e Desenvolvimento Social é comandada pela esposa do governador, Fernanda Richa, e a da Infraestrutura e Logística está nas mãos do irmão dele, Pepe Richa. Juntas, elas têm 80% da capacidade de investimento do governo.
Todos esses casos, nacionais e locais, têm bem mais semelhanças do que diferenças. São iguaizinhos na manipulação dos conceitos de certo e errado. E também no fato de que essa é uma prática suprapartidária.
Não que a política precise ser uma novela maniqueísta, de mocinhos e bandidos, mas seria verdadeiramente útil saber o que esperar dos políticos. Puritanismo à parte, eles prestariam um serviço à democracia se pelo menos de vez em quando tentassem se diferenciar para valer uns dos outros.
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