Entrevistei na semana passada o cientista político Bolívar Lamounier, um dos maiores ideólogos do PSDB, sobre os 20 anos de polarização da disputa presidencial entre petistas e tucanos. Ao contrário do que afirmaram Paulo Bernardo e Dr. Rosinha (veja aqui) para a mesma reportagem, para ele, o PSDB continua sendo o mais legítimo representante da social-democracia no Brasil. Veja a íntegra do que ele falou:
Em 1989, um ano depois da fundação, o PSDB apoiou Lula no segundo turno da eleição presidencial. Tucanos e petistas compartilhavam algumas ideias à esquerda. O que foi preponderante para o início do afastamento entre os dois partidos, em 1994?
O apoio a Lula em 1989 se deu por contraste com o candidato Fernando Collor, que se apresentara como um paraquedista tornado candidato pelas circunstâncias da época, que acolheram sua plataforma populista. O PSDB não tinha dúvidas quanto ao modo de agir autoritário e só muito raramente responsável dos petistas.
PT e PSDB poderiam ter sido parceiros?
É uma crença difundida, mas eu, particularmente, nunca acreditei nisso. As coisas que aparentemente unem os dois partidos são muito menos importantes que as que os separam. O PSDB teria prestado um desserviço ao Brasil se tivesse procurado algum tipo de união com o PT. Um exemplo basta: em 1993, Lula e seus economistas imaginavam chegar à presidência sem precisar enfrentar a inflação. Para eles, não era uma prioridade. E bateram de frente com Fernando Henrique quando o Plano Real começou a ser implementado. Quer dizer, não sabiam que o país marchava aceleradamente para uma hiperinflação.
Como o sr. avalia a guinada do PSDB mais à direita, a partir da aliança com o PFL?
Sem a sua definição de “direita”, fica difícil responder. Tomando o termo no sentido mais comum, não me parece que tal guinada tenha acontecido.
Por que nenhum outro partido conseguiu se consolidar como alternativa à polarização entre PT e PSDB ao longo desses 20 anos?
Num rápido apanhado, sabemos que o PMDB é uma federação de máquinas eleitorais e clientelistas estaduais, não se propõe ser um partido programático. No PFL, o Marco Maciel e o Jorge Bornhausen tinham tal propósito, o Antonio Carlos Magalhães não tinha, e o mandonismo dele impedia o partido de escolher um rumo. O PPS tinha e tem caráter programático, mas não tem volume. Agora vamos ver o novo PSB, o PSB de Eduardo Campos, que comportamento vai assumir.
Hoje, quem representa mais o conceito original de social-democracia, PT ou PSDB?
É lógico que é o PSDB. Politicamente, o PT é uma federação de lideranças relativamente modestas que se mantém unidas pela figura populista do Lula. Economicamente, como chamar de social-democrata um partido que em 1993 aceitava a super-mega-inflação brasileira, velha de 33 anos, e que hoje pega montanhas de dinheiro do Tesouro e entrega ao BNDES para distribuir entre os escolhidos do rei, ou da rainha, como queira?
Qual é o futuro dessa polarização? Ela se sustenta em 2014 com a formação da chapa Eduardo Campos/Marina Silva?
É uma boa pergunta para se fazer ao Eduardo e à Marina. Se eles de fato pretendem – e eu acho que pretendem- desempenhar um papel relevante na eleição, terão que assumir uma posição oposicionista nítida. Lula e seu círculo mais próximo têm um projeto de poder de longo prazo; comportam-se como militantes, fazendo política de manhã à noite, todos os dias do ano, para ganhar a próxima eleição, seja ela qual for. Com esse objetivo, eles põem em prática os programas mais inacreditáveis e não se ruborizam com as inverdades que dizem (o governo não ia pôr nem um centavo de dinheiro público para dar lucro à Fifa, lembra-se?). Daí a minha afirmação: temos que enfrentá-los seriamente nas urnas, e isso só é concebível com uma postura nítida de oposição.
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