No final do filme "O Poderoso Chefão", Michael Corleone está no seu escritório enquanto sua esposa Kay sai para preparar um drinque após uma conversa difícil. Seus caporegimes Clemenza, Lampone e Neri surgem para homenageá-lo como o novo Don Corleone. Neri então fecha a porta sob o olhar triste de Kay. Uma cena antológica.
Quando Michael e Kay aparecem na história pela primeira vez ainda como namorados, ele conta a ela os detalhes por vezes brutais do negócio dos Corleone, mas deixa claro que “isso é a minha família, não eu.” Traçada por seu pai, a trajetória de vida dele seria diferente dos outros filhos: recém-condecorado como herói de guerra, ele seria um político influente.
Mas quando chegamos à cena final, Michael já é uma outra pessoa. Ele matou duas pessoas a sangue frio, fugiu de seu país, viu sua primeira esposa morrer numa explosão de um carro, lidou com o assassinato de seu irmão mais velho Santino e com a morte de seu pai e consigliere, Vito Corleone.
É uma sucessão de acontecimentos que obviamente muda qualquer um. Michael se transforma no gangster que ordena os assassinatos de todos os mafiosos rivais e assume o controle da Máfia de Nova York.
Mas o real significado da última cena do "O Poderoso Chefão" não é que Kay foi barrada dos negócios de seu marido, e sim que Michael é quem se isola do mundo exterior.
Ele faz isso pois tem nos ombros a responsabilidade de transformar o negócio dos Corleone em algo legítimo (que é o seu foco nos dois filmes da sequência).
Será que então o novo chefão da Máfia não sabia nada sobre o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal (work-life balance)?
Work-Life Balance?
Sempre ouvi falar na busca do equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, mas nunca consegui me "achar" dentro dessa ideologia; e por isso me sentia meio workaholic, pois eram sempre mais horas no trabalho do que em casa.
Outros como eu, para compensar esse sentimento de culpa de não priorizar o lado pessoal, adotavam ideologias como "trabalhar duro e se divertir mais ainda" (Work Hard, Play Harder) — combinando longas horas de trabalho com uma agenda social e de lazer super intensa — mas, convenhamos, ninguém tem pique pra fazer isso o tempo todo.
Até que um dia me deparei com uma entrevista com o fundador da Amazon, Jeff Bezos, na qual ele dizia que o conceito de work-life balance era debilitante pois partia do princípio de que sempre há um trade-off — ou seja, uma decisão que consiste na escolha de uma opção em detrimento de outra.
Na sua visão um pouco diferente da relação entre trabalho e vida pessoal, ele disse:
"Se eu estou feliz em casa, eu vou ao escritório com uma tremenda energia. E se estou feliz no trabalho, eu volto para casa com uma tremenda energia. É na verdade um círculo, não é um equilíbrio."
E isso fez total sentido para mim: um círculo no qual uma parte alimenta a outra (para o bem ou para o mal — no exemplo dele, falou-se apenas no lado positivo); no qual não há uma escolha binária entre trabalho e vida pessoal e sim a influência que a sua vida pessoal tem no seu trabalho e vice-versa.
E, para que esse círculo seja sempre virtuoso, é importante:
- Separar as coisas. Pode ser difícil — ainda mais nos dias de hoje com home office — não levar o trabalho e todas as suas emoções para casa, mas é preciso praticar isso. E se algo em casa não estiver indo bem, é importante resolver a situação para não deixar que isso afete o seu trabalho — nem que seja pra tirar uns dias de folga.
- Celebrar as conquistas, grandes ou pequenas. A caminhada para o sucesso é longa e cheia de percalços — então vale muito a pena comemorar os pequenos e grandes sucessos ao longo do caminho — para continuar seguindo em frente.
- Contar com ajuda. Encontre alguém em quem pode confiar para falar sobre os problemas — o seu conselheiro pessoal.
Como disse C.S. Lewis: “as portas do inferno são trancadas por dentro” — ou seja, a escolha de estar lá é de cada pessoa.
A última cena do filme ilustra a escolha que Michael Corleone fez de priorizar os negócios sobre a própria família.
Na vida real, entretanto, talvez não seja necessário sempre ter que fazer uma escolha em detrimento da outra.
Não feche a porta e não se isole! Ao invés disso, procure criar um círculo virtuoso entre vida pessoal e trabalho!
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*Murilo Menezes é investidor anjo e conselheiro de startups. Trabalha há mais de 15 anos em posições executivas em startups de Israel e do Vale do Silício e tem 20 anos de experiência ajudando a lançar do zero negócios B2B e B2B2C nas áreas de serviços financeiros, telecomunicações, Internet, turismo e entretenimento na América Latina. É engenheiro de produção formado na POLI-USP e tem mestrado executivo em vendas e marketing pela SDA Bocconi em Milão e ESADE em Barcelona.
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