Os episódios que culminaram com o pedido de demissão do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro e a nova polarização que surgiu entre os brasileiros (aqueles que defendem pessoas e aqueles que defendem ideias) é uma excelente oportunidade para falar de conceitos que hoje são jogados ao vento nas discussões políticas causando uma enorme confusão.

CARREGANDO :)

É inacreditável, por exemplo, que o maior pilar da Democracia, o Estado Democrático de Direito, acabe se perdendo no vazio de xingamentos em meio a defesas apaixonadas pelos políticos de estimação. Como ele foi citado em pronunciamentos públicos recentes por Sérgio Moro e André Mendonça, o ex e o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, acho pertinente uma reflexão sobre o significado e a importância deste e de alguns outros termos políticos.

Estado Democrático de Direito X Populismo

Proponho um exercício mental simples para começar a clarear ideias hoje envoltas numa nuvem de desinformação. Trace uma linha imaginária horizontal e coloque os dois conceitos político-econômicos antagônicos nas pontas: Esquerda e Direita.

Publicidade

Não vou me estender falando sobre eles, até porque eu já publiquei uma coluna só sobre esse tema, que você pode ler clicando aqui. Mas vale lembrar de algumas características atreladas ao conceito que está em cada uma dessas pontas para não haver dúvidas de que os ideais de país são mesmo bem diferentes conforme a visão política.

A visão de esquerda prega um Estado mais intervencionista, o que significa um Estado cheio de empresas estatais, que empregam muita gente e atuam em todas as áreas. O Brasil, depois de quase duas décadas de governos de centro esquerda e esquerda chegou a um nível de intervencionismo que tem estatal até para fabricar preservativos.

Já a visão de direita prega um Estado de economia liberal, um Estado mínimo, dono de apenas algumas poucas empresas de serviços essenciais para fomentar o desenvolvimento. Nesse modelo o Estado pode, por exemplo, levar energia para áreas rurais, que não atraem empresas e, assim, estimular a iniciativa privada a gerar e distribuir riquezas naquela região.

São ideias diferentes para se administrar um país, ambas buscando o bem estar social. Há exemplos de sucesso no mundo inteiro tanto de liberalismo econômico quanto de intervencionismo estatal, mas os modelos só são bem sucedidos quando estão atrelados a um pilar chamado Estado Democrático de Direito e não ao seu extremo oposto, que é o populismo, o personalismo, a pessoa acima da lei. E aqui a gente precisa traçar outra linha imaginária, agora vertical.

Imagine, então, que cruzando aquela linha horizontal, com Direita e Esquerda nos extremos, há uma linha vertical, com Estado Democrático de Direito e populismo em pontos opostos. Por que são opostos? Simples: porque, de novo, são conceitos antagônicos. Mas aqui há uma separação muito importante, porque, ao contrário de Direita e Esquerda, que buscam, através de caminhos diferentes, o bem estar social, populistas não têm o mesmo objetivo de quem preza pela segurança jurídica embasada em leis.

Publicidade

Em um Estado de Direito as liberdades civis são respeitadas, assim como os direitos humanos e as garantias fundamentais estabelecidas na Constituição. População e autoridades políticas estão sujeitas às mesmas leis e respeitam as regras jurídicas.

Quem respeita o Estado Democrático de Direito, respeita, portanto, o equilíbrio fiscal e a propriedade privada, entre tantas outras regras. Há uma clara separação entre o que é público e o que é privado. Não se admite invadir, apropriar-se ou roubar o que não lhe pertence. Respeita-se também as instituições, os prédios, os cargos públicos e as leis. Todas elas. Ninguém está acima da lei.

Não é porque um governante foi eleito pela maioria dos eleitores que ele pode sair gastando dinheiro que não tem no orçamento, remanejando verbas entre bancos públicos a seu bel prazer para acobertar desvios de recursos de empresas estatais – como as famosas pedaladas fiscais que derrubaram Dilma -, ou interferir no trabalho de uma instituição como a polícia federal, como é o caso da denúncia contra o presidente Bolsonaro.

O populismo está no extremo, porque o governante imagina estar acima da lei e age buscando benefício próprio ou do seu grupo político. É importante lembrar que isso acontecia nas monarquias absolutistas do passado, em estados totalitários, onde a nobreza podia tudo e o homem comum era obrigado a aceitar os privilégios dos nobres e até a pagar por eles. Foi justamente para combater isso que surgiram as leis e o conceito do Estado Democrático de Direito.

O populismo, praticado por governantes que desrespeitam as normas vigentes no país, é uma releitura do absolutismo.

Publicidade

Conhecimento liberta

Ter em mente a imagem dessa cruz, separando os conceitos de Direita e Esquerda e contrapondo populismo a Estado Democrático de Direito é de extrema importância para não cair na armadilha de associar necessariamente Esquerda a populismo e Direita a Estado Democrático de Direito. Até porque está claro que, no Brasil, o emaranhado é grande.

E antes de finalizar este artigo quero lembrar que há mais uma grande confusão conceitual a ser desfeita: entre liberalismo econômico e conservadorismo nos costumes. Um conservador, que valorize a família e a vida, pode achar que o melhor caminho para o bem estar social seja através de políticas de um Estado intervencionista, dono de muitas estatais. Por que não?

E quem acredita nesse modelo de Estado não precisa necessariamente ser progressista pró-aborto, favorável à liberação das drogas, ou seja, liberal nos costumes. Não há relação direta entre liberalismo econômico e a pauta conservadora nos costumes ou entre intervencionismo estatal e progressismo.

Cada um é livre para ser do jeito que quiser. Pode pensar e se expressar como quiser, desde que haja respeito aos outros e às leis. O Estado Democrático de Direito é o norte de toda a sociedade desenvolvida e é esta a ideia que deve ser defendida de forma conjunta por todos que querem um país melhor. Defenda políticos que não deem as costas para as leis nem para as instituições que garantem o respeito a elas. Não se apegue a pessoas e sim, a ideias.