“Para você criar som é preciso agredir o silêncio”. A frase é do curitibano Angelo Esmanhotto, um dos maiores nomes da música indiana no Brasil. O Cwb Live teve o prazer de entrevistar esse talento paranaense que, além dos tradicionais violão e guitarra, toca um instrumento pouco conhecido no país, o Sarod.
O início
Angelo se apaixonou pela música logo na infância, mas de forma inusitada. Quando estudava no Colégio Estadual do Paraná, ele procurava todas as atividades relacionadas com a arte, menos a que se tornaria o seu ofício. “Tinha uma salinha com bateria guitarra, violão, mas eu ia lá só para ouvir. Nas outras salas eu mexia em tudo e, de repente, o que eu escolhi para me expressar foi a música”, relembra. O aprendizado começou quando sua mãe o matriculou na escola do professor Waldomiro Prosdócimo, o Conservatório de Música Villa-Lobos, em Curitiba, onde passou quatro anos estudando violão clássico.
As responsabilidades da vida chegaram mas, depois de três anos cursando economia, ele decidiu que o seu caminho seria dedicado à música. Ao tomar essa decisão, como em um golpe do destino, Angelo foi convidado para tocar alaúde no Grupo Renascentista de Curitiba, no final dos anos 1970.
O período na Europa
A prática e a dedicação são primordiais para tocar, e entender, qualquer instrumento. Sabendo disso, em 1986, Angelo foi para a Suíça estudar na Musik Akademie der Stadt Basel, na Basiléia. Todos os dias, no caminho para o seu emprego, ele passava em frente a uma loja para “namorar” uma cítara, tradicional instrumento de cordas indiano. Certa vez ele resolveu entrar no estabelecimento e não foi atendido.
Dias depois ele acabou se inscrevendo para fazer o curso de música indiana na Musik Akademie, com o professor Ken Zuckerman. No primeiro dia de aula, Angelo se deparou com um Sarod no chão da sala de aula. “Foi amor à primeira vista. Quando vi o instrumento eu fiquei apaixonado”, relembra. Esse contato com a música indiana lhe mostrou outras possibilidades. “Era uma coisa bem fora do que eu estava fazendo, até então. Iria exigir de mim outro posicionamento como músico, como intérprete”, conta. Essa adaptação ao instrumento exigiu um esforço mais mental do que técnico. “O músico indiano quando toca é, ao mesmo tempo, intérprete, compositor e maestro”, explica.
O Sarod que Angelo toca é mais recente, historicamente, que o violão. Ele foi criado pelo músico indiano Allaudin Khan, no começo do século 20, e tem 25 cordas, das quais quatro são usadas para fazer a parte melódica. As 21 restantes são chamadas de “cordas simpáticas”, pois vibram de acordo com a melodia tocada.
A adaptação dos “ragas” à música brasileira
De volta ao Brasil, o músico procurou uma forma de incorporar a música indiana ao habitat brasileiro. Ele acreditava que não conseguiria passar o sentimento que os indianos transmitem ao tocar os “ragas”, espécie de tema usado em cada canção, pois o sentido que eles externam não é o mesmo para pessoas de outras nacionalidades. “Eu não iria conseguir, como brasileiro, interpretar, de uma forma consistente, a mesma linguagem, ou usar os mesmo artifícios de um indiano que nasceu na Índia”, explica.
Para resolver esse problema, Angelo adaptou as cantigas de roda brasileiras, como “Cai, cai, balão” e “Terezinha de Jesus”, transpondo o “raga” indiano para a nossa realidade. “O que eu quero com a música é isso, fazer as pessoas irem um pouco além de somente sonoridade e performance”, afirma.
O músico tem nove trabalhos lançados. O mais recente é o DVD “Solo”, com imagens do designer gráfico e fotógrafo Daniel Chaves. Com toda essa experiência acumulada em anos de estudo, Angelo tem procurado passar essa bagagem cultural trabalhando em um projeto onde se apresenta para crianças das 7º e 8º séries da rede municipal de ensino, mostrando um panorama da música medieval.
Confira a entrevista em vídeo com o músico Angelo Esmanhotto e a canção “Peixe vivo”, adaptada para o “raga” indiano.
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