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Daniel Lopez

Daniel Lopez

Jornalista e teólogo, autor de ‘Manual de Sobrevivência do Conservador no Séc. XXI’. É doutor em linguística pela UFF

Geopolítica da barbárie

Lágrimas em Israel: como explicar o inexplicável?

Israelense ferido é levado por soldados e paramédicos até um helicóptero, após ataques do Hamas contra a cidade de Beersheba. (Foto: Abir Sultan/EFE)

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Na última sexta-feira (7), o mundo foi impactado por cenas de crueldade que circularam o planeta. Observamos atônitos o nível de maldade e frieza de psicopatas caçando pessoas comuns (incluindo idosos, mulheres e crianças) com um requinte de psicopatia difícil de acreditar. O que teria motivado isso? Poderia ter sido evitado? Alguém falhou? Quais serão as consequências? Tentarei responder algumas dessas perguntas.

Ali Barakeh, um dos líderes do Hamas exilado no Líbano, explicou recentemente, que a “Operação Tempestade Al-Aqsa” teve como motivação algumas atitudes recentes do primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Principalmente as incursões israelitas consideradas "provocadoras" na mesquita de Al-Aqsa, o terceiro local mais sagrado para o mundo islâmico. Daí o nome da operação. Além disso, ele citou a prisão de milhares de palestinos sem qualquer acusação nem julgamento e uma forte convicção de que os israelenses estariam planejando eliminar os líderes do Hamas. Ele também explicou que os reféns americanos serão usados como moeda de troca com palestinos que estão presos em Israel e até mesmo nos Estados Unidos.

O resultado foi tão prejudicial para o Hamas, que fica difícil acreditar que eles fariam algo tão grotesco, insano, irracional e maligno assim.

Porém, eu fico me perguntando se eles calcularam bem as consequências dessa atitude asquerosa. Será que eles não perceberam que as crueldades inomináveis realizadas (e documentadas) colocariam o mundo totalmente contra eles? Eles não entenderam que a resposta de Israel seria sem precedentes, proporcional ao nível de maldade de suas ações? Não cogitaram a hipótese (agora já confirmada) de que os Estados Unidos saíram em defesa de Israel? Cui bono? Ou seja, quem se beneficiaria disso? Parece que foi uma grande “tiro no pé”. Ou talvez fosse exatamente isso que eles queriam: fazer algo tão absurdo para que funcionasse como uma grande provocação contra Israel.

Isso porque, agora, o mundo está contra eles, e Benjamin Netanyahu conquistou o apoio da opinião pública local, internacional e até mesmo da oposição israelense para criar um governo emergencial de coalizão e quebrar as bases de seus opositores regionais, principalmente o Hamas, autor dos atos inomináveis. Conclusão: o resultado foi tão prejudicial para o Hamas, que fica difícil acreditar que eles fariam algo tão grotesco, insano, irracional e maligno assim. É algo que totalmente desafia a razão humana. A maldade foi propositalmente planejadas, para gerar as graves consequências que estamos vendo. Tudo muito bem orquestrado. Um plano diabólico, sinistro, macabro e profundo em suas repercussões.

É algo que totalmente desafia a razão humana. A maldade foi propositalmente planejadas, para gerar as graves consequências que estamos vendo.

A gestão de Netanyahu, recheada de escândalos e polêmicas, que enfrentava uma baixa popularidade, agora está com vigor renovado. Se o objetivo era derrubar o Bibi, o plano falhou miseravelmente. Mas parece que tudo faz parte de um objetivo maior.

Agora, porém, assistindo a uma entrevista com o israelense Shai Danon, ele trouxe algumas informações que me surpreenderam. Primeiro, ele afirmou que apenas a polícia e membros das forças armadas têm porte e posse de armas em Israel. Confesso que eu imaginava que seria algo contentamento liberado. Segundo, ele disse que a invasão do Hamas aconteceu em 16 pontos diferentes, e que os terroristas teriam agido por cerca de 5 a 8 horas no país sem praticamente qualquer resistência maior por parte do sistema de defesa israelense. Algo difícil de acreditar. Obviamente que alguns policiais e soldados entraram em confrontos com o Hamas, mas uma resposta de maior repercussão somente viria horas depois. Tudo estranho demais.

Por essa estranheza, começaram a surgir informações de que Israel teria sido avisado pelo Egito de que uma ação do Hamas estava sendo preparada, mas teriam ignorado. Muitos veículos da mídia tradicional noticiaram isso. Obviamente, o primeiro ministro israelense negou a informação. Caso confirmasse algo dessa natureza, as consequências seriam drásticas para ele. Mas é realmente difícil de acreditar que um sistema de defesa e de inteligência tão eficaz, com espiões espalhados por todo o mundo, com uma vigilância que detecta até mesmo um rato se movimentando próximo à fronteira, poderia ter falhado de forma tão gritante. Tudo muito confuso.

Por isso, apareceram na internet teorias mirabolantes de que Israel poderia ter “deixado” o inimigo agir para conseguir uma justificativa perante a opinião pública nacional, internacional e junto ao parlamento israelense para lançar uma ofensiva total contra o Hamas. Outras especulações delirantes postularam que Benjamin Netanyahu teria interesse em iniciar uma guerra para abafar os seus muitos escândalos, recuperar sua popularidade e permanecer no poder. Loucura.

Apareceram na internet teorias mirabolantes de que Israel poderia ter “deixado” o inimigo agir para conseguir uma justificativa perante a opinião pública.

Numa entrevista recente, a ex-oficial de inteligência do Exército Israelense Efrat Fenigson afirmou que, quando ela serviu na fronteira de Israel com a Faixa de Gaza 25 anos atrás, até mesmo um gato se aproximando do muro faria acionar o sistema de defesa e trazer as forças de defesa imediatamente para o local. Imagine hoje, com toda a tecnologia disponível, depois de quase 30 anos, as cercas serem invadidas em 16 pontos distintos e sem acionar os alarmes,  e nem trazer imediatamente todo o sistema de defesa, com força total, para frear o avanço dos inimigos. Fenigson chegou a explicar que as cercas contam até mesmo com um sistema de defesa automatizado, uma espécie de robô que atira automaticamente quando um objeto se aproxima. Por que esses robôs também não funcionaram? E os drones? E as câmeras, telefones, alarmes?

Alguns especulam que um ataque cibernético iraniano teria derrubado a infraestrutura tecnológica do sistema de defesa israelense. Isso seria muito improvável. Uma vez que, uma ofensiva cibernética dessa magnitude, e acontecendo exatamente na data de 50 anos da Crise do Yom Kippur, faria com que todo sistema de defesa ficasse em alerta máximo, com todo o efetivo de segurança de prontidão, impedindo o massacre de acontecer. Fora os sistemas de backup que existem, a própria excelência e vanguarda de Israel na área cibernética. Se o sistema de defesa tivesse sido derrubado, como a rede civil continuou funcionando normalmente? Tudo especulação.

Minha resposta é: isso é coisa de filme. Lembrei-me daquela cena em que, no filme O Jogo da Imitação, a equipe de Alan Turing, no contexto da 2ª Guerra Mundial, consegue quebrar a criptografia da máquina alemã Enigma, e descobre que eles estavam preparando uma ofensiva contra uma embarcação dos aliados. Eles ficam muito felizes com a oportunidade de saber antecipadamente da ofensiva e salvar seus amigos. Entretanto, Turing percebe que, caso as embarcações mudassem suas rotas e os aliados atacassem os submarinos alemães, eles perceberiam que a Enigma estava comprometida, e mudariam a programação da máquina, fazendo com que os Aliados talvez nunca mais pudessem ler as mensagens secretas de seus oponentes. Portanto, a equipe precisou tomar a difícil decisão de não avisar seus amigos, e deixá-los morrer. Imagine o tamanho do dilema, do sofrimento, da angústia. Um sacrifício por um bem maior. Triste demais.

Um filme sobre a 2ª Guerra Mundial sempre nos leva a temer uma 3ª. Mas, graças a Deus, isso se trata apenas de um filme, uma produção ficcional hollywoodiana. Apesar de que, pensando melhor, o filme é baseado em fatos reais…

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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