São onze e meia da noite de uma sexta-feira de primavera em Moscou. Os pais levam o menino de menos de cinco anos à praça para praticar na minúscula bicicleta, sem rodinhas de apoio. O garoto se empacota após a rampa de calçamento, protegido pelo capacete. Levanta-se com a ajuda paterna e segue para a descida menos íngreme.
Além dessa pequena família, várias outras passeiam pelo iluminado centro da capital russa. Dividem espaço com estrangeiros de diversas origens, senhoras de idade, casais de namorados e grupos de amigos. O ponteiro do Kremlim chega perto da meia noite e algumas lojas de rua seguem abertas, portas escancaradas.
Na escuridão da alameda, o motorista desce e deixa o carro ligado enquanto compra o cartão de rua para estacionamento. Casais se embalam em balanços duplos, a cobertura de um dos inúmeros teatros pisca e as estátuas e monumentos estão impávidos, destacados pelo céu escuro. Mulheres rumam sozinhas para o lar na solidão do início da madrugada. A capital é segura, limpa e encontra-se serena.
O cenário colorido pelas luzes revela o bom gosto de uma nação que um dia já esteve fechada ao mundo. Sem os excessos do neon, brilham em harmonia as construções históricas e religiosas, nesse importante centro político, econômico, cultural, financeiro e científico.
Tá, se você realmente circular por Moscou vai encontrar bêbados pedindo dinheiro e até homens de meia idade, sacolas à mão, trajados melhor do que este viajante, esmolando com insistência e talvez com alguma agressividade repentina ao falar. Certo incômodo, mas esporádico. Irrelevante em um lugar dos mais bonitos que já conheci.
Esta época começa a esquentar, mas o ar permanece fresco e a temperatura, durante o dia, fica em torno dos vinte graus. Bastante agradável para descobrir a cidade, costumeiramente gelada. Como o sol se põe bastante tarde há claridade até oito e meia da noite, pelo menos.
O mês de maio é de comemorações. Há um intenso festival de Páscoa e celebrações pela vitória do país sobre a Alemanha nazista na Segunda Guerra Mundial. A metrópole se apresenta enfeitada com flores e adornada por guirlandas.
Moscou é a terra do ballet Bolshoi e de diversos teatros; da gigantesca Praça Vermelha e do mausoléu de Lênin. Tem pelo menos 60 museus de conteúdos variados: história, guerra, literatura, artes, teatro e música, carros, robótica, técnicos e científicos. O catolicismo ortodoxo é forte, então é comum encontrar igrejas e catedrais em toda parte, frequentadas por mulheres de cabeça coberta. Aliás, quanto à beleza todos sabemos ser muito difícil rivalizar com a mulher brasileira, mas, me desculpem, as russas são fenomenais.
O metrô é outro espetáculo. Nos primeiros momentos apresenta apenas seus rudes ares soviéticos, é cinza e lembra o passado comunista. Aos poucos descortina a beleza de estações decoradas com pinturas e murais, adornadas com destaques em gesso e lustres requintados, revestidas em mármore e pavimentadas com granito. É o mais profundo do mundo, boas dezenas de metro baixo terra.
Enquanto nossa Curitiba se debate entre a polêmica e a incapacidade de construir eficiente transporte público subterrâneo, o metrô de Moscou passa dos 80 anos com 182 estações e linhas que permitem o deslocamento por toda a cidade. A maior parte do atendimento nos guichês é realizada por pessoas de certa idade, boa oportunidade de ocupação e permanência no mercado de trabalho.
O caminhão passa repetidamente lançando água no asfalto e praças. É metrópole limpa, de 12 milhões habitantes, a segunda mais populosa da Europa. Logo acima a furgoneta aciona esfregões sobre as calçadas. As lixeiras respeitam a arquitetura secular.
A capital russa tem extensa malha ferroviária, é equipada com quatro aeroportos e concentra centros comerciais e prédios fabulosos, em formatos ousados. A moeda local, o rublo, tem cotação média de 65 para um dólar.
Apesar do tamanho, é uma cidade prática. Sim, já estive nas principais e mais charmosas cidades do mundo, das de visitação obrigatória como Paris, Londres, Roma e Nova Iorque: exóticas como Atenas e Cairo; contemporâneas como são Vancouver, Milão e Chicago: até à requintada Viena; à imensa Cidade do México e à inteligente Barcelona, para citar algumas.
Será que me esqueci da magia das outras ou a capital da Rússia é mesmo extremamente cativante?
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