Surpreso, mostrei meus respeitos ao rei. Sim, estava no cinema em Bangkok quando exibiram na tela um aviso e começaram a entoar uma música sentimental, seguida de ilustrações, algumas dramáticas. Era o hino real da Tailândia. O pequeno público presente na imensa sala do Siam Paragon, sofisticado shopping center da capital, se colocou de pé por aqueles instantes. Divertido, obedeci.
Descobri mais tarde que não se levantar para a execução do hino é crime de Lesa-Majestade, previsto no Código Penal e passível de prisão que varia de três a cinco anos. A lei não é flexibilizada para estrangeiros.
Ainda que a Tailândia ter deixado de ser uma monarquia absoluta há quase um século, a figura do rei está por toda parte em Bangkok: em grandes avenidas, em lojas, nas casas ou, é claro, em gigantes painéis nos prédios públicos. Apesar de já estar com 88 anos e a saúde debilitada, o rei Bhumibol, ou Rama IX, aparece sempre mais jovem nas imagens.
O monarca ganhou o respeito do povo e tem autoridade moral. É visto como uma figura paternal que atuou com sabedoria em momentos de crise. Possivelmente a crença budista, predominante no país, faça com que seja venerado como semideus.
Chamado publicamente de “O Grande”, é o indivíduo que há mais tempo reina no planeta, desde 1946. Considerado o rei mais rico do mundo, ele cumpre função social e financia diversos projetos de desenvolvimento em áreas rurais do país. A revista Forbes estimou a fortuna da realeza em US$30 bilhões, em 2011.
Um dia depois, aconteceu novamente. Exatamente às seis da tarde eu estava atravessando uma passarela, no centro da cidade, quando vi todo mundo parado. Estranhei, não me parecia ponto de transporte. Todos congelados, como num filme de ficção científica ou em uma novela de Saramago.
De súbito, escutei a canção, trazida pelo vento. Era o hino novamente. Algumas pessoas me olhavam, parei ao lado de um casal. Depois perguntei o que acontecia para que me confirmasse o que já imaginava. Todos os dias a capital para no final da tarde para reverenciar o rei. Não é uma lei, disseram, apenas questão de respeito.
Hoje o país tem uma estrutura política em que o primeiro-ministro é o chefe de governo enquanto que o rei é chefe de Estado, o que se denomina uma monarquia constitucional. O poder executivo está atualmente nas mãos do Exército e o país não superou a instabilidade desde o golpe militar de 2006, apoiado pela realeza. Leva algum tempo para entender toda a agitação política e institucional da última década.
Nos últimos 10 anos, uma nova Constituição foi promulgada; eleições gerais com a vitória dos oposicionistas foram realizadas; a primeira ministra eleita foi deposta e indiciada; novo ministro ocupou interinamente o posto de chefe do Estado; outro golpe foi dado pelos militares em 2014, com lei marcial, toque de recolher e censura; a nova Constituição foi suspensa, exceto o capítulo sobre a monarquia; os militares prometeram e depois adiaram novas eleições gerais; e, por fim, talvez o país compareça às urnas no ano que vem.
O julgamento da ex-primeira-ministra tailandesa, Yingluck Shinawatra, acabou de começar em Bangkok, em meados de janeiro. Em um movimento considerado político, ela foi acusada de negligência num programa de cultivo de arroz. O processo deve levar todo este ano, as alegações da defesa estão previstas apenas para novembro.
A junta militar é acusada de tentar afastar definitivamente do cenário político a família de Shinawatra, vitoriosa nas últimas eleições nacionais. Ela é irmã do também deposto ex-primeiro-ministro Thaksin, exilado no Reino Unido desde o golpe de 2006.
As Forças Armadas, formadas pelo Exército, Marinha e Aeronáutica, sempre ocuparam espaço representativo na história do país. Criadas durante a monarquia absolutista – como defesa contra os interesses colonialistas de países da Europa – foram modernizadas com o passar dos anos, até o estabelecimento de um Ministério de Defesa.
A criatura se voltou contra o criador e os militares derrubaram o sistema monárquico hegemônico em 1932, com apoio de movimentos civis. O rei passou a ter mais um papel de representação, uma figura simbólica. A partir daí as Forças Armadas não deixaram mais de intervir em assuntos políticos. Apenas nos últimos 100 anos a Tailândia sofreu 12 golpes de Estado e teve 17 Constituições.
Neste momento não há protestos nas ruas de Bangkok. A capital segue o ritmo do agitado cotidiano, dos engarrafamentos e do movimento de milhões de turistas estrangeiros que visitam o país, principalmente na alta temporada, de novembro a fevereiro.
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