“A terra é redonda. Ninguém vai dar like. Isso não vai ter impulsionamento. O que dá like? O mundo é plano!”
“Porque, infelizmente, a maioria das pessoas torcem (sic) nos filmes pelo bandido, e não pelo mocinho.”
“Nós podemos entender que aquilo que aquele policial fez em São Paulo na ponte é uma liberdade de expressão? Se nós levarmos a liberdade de expressão ao absoluto, ele estaria protegido pela liberdade de expressão!”
“O marido que bate na mulher dentro de casa, isso é liberdade de expressão?”
“Se um cidadão ou uma pessoa jurídica for fazer o registro de uma página, pedofilia.com.br, a NickBR não tem capacidade de impedi-la? A morteademocracia.com.br seria registrado? [Sim] seria registrado!”
Essas são apenas algumas das pérolas proferidas pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante o julgamento do Marco Civil da Internet. Esse julgamento caminha para se tornar mais um episódio em que o STF, extrapolando suas atribuições constitucionais, legislará no lugar do Congresso Nacional. O objetivo declarado? Regulamentar as redes sociais – o que, na prática, no contexto atual, deve significar censura.
Na semana passada, o destaque foi para o ministro Alexandre de Moraes, que deu um verdadeiro show de horrores, conforme detalhei em minha última coluna para a Gazeta do Povo. Parece que Toffoli, ao testemunhar a performance do colega, ficou com inveja e decidiu superá-lo em declarações absurdas. Se esse era o objetivo, Toffoli conseguiu: sua comparação sugerindo que a liberdade de expressão absoluta protegeria um policial militar que jogou um homem de uma ponte ou um marido que espanca sua esposa é simplesmente delirante.
Toffoli poderia invocar os referidos exemplos numa discussão sobre outra liberdade, a de locomoção ou de ação. Ainda assim, seria impertinente: não proibimos pessoas de se locomover ou de agir porque elas podem cometer algum crime, mas punimos eventuais abusos. Mesmo nesse âmbito, a solução não seria a restrição do direito à liberdade, equivalente à censura que Toffoli quer promover sobre a liberdade de expressão. Contudo, os exemplos não têm nada, nadinha, a ver com a liberdade de expressão.
Liberdade de expressão é um direito relacionado ao uso da linguagem para manifestar opiniões, ideias e crenças. Jamais foi cogitado que esse direito abarcasse jogar pessoas de pontes ou cometer atos de violência. Ninguém até hoje usou esse tipo de caso para exemplificar eventuais abusos da liberdade de expressão, aliás, porque seria “nonsense”. Na expressão americana, Toffoli comparou "apples to oranges" – ou seja, maçãs com laranjas –, violando a lógica e o bom senso.
De fato, o que Toffoli fez foi uma distorção grotesca: comparou possíveis discursos que abusam da liberdade de expressão com atos violentos que são abusos de outras liberdades e infringem diretamente direitos fundamentais como o direito à vida e à integridade física. É difícil imaginar algum abuso da liberdade de expressão que faça isso - talvez um grito muito alto no ouvido de alguém que o torne surdo, mas certamente não é por conta desse risco que o STF quer censurar as redes sociais.
Atos de violência física nunca foram – e nunca serão – exemplos de abusos de liberdade de expressão. Essa discussão sequer existe, pois ninguém antes havia cometido tamanha distorção conceitual. A realidade é clara: Toffoli não dispõe de argumentos jurídicos sólidos para justificar seu desejo – e o de outros ministros – de censurar as redes sociais. Seu discurso é apelativo, no mau sentido desta palavra.
Atos de violência física nunca foram – e nunca serão – exemplos de abusos de liberdade de expressão
Alguém poderia dizer: mas seria razoável esperar algo diferente de um ministro que reprovou duas vezes em concursos para juiz? Que foi apelidado de "office boy jurídico do PT" quando advogava para o partido de Lula, como já noticiou a imprensa? Ou que seria chamado de “estagiário” nos corredores do STF devido ao seu notório despreparo jurídico? Sim. Essas falas desbordaram o bom senso até de pessoas leigas, que ridicularizaram o ministro nas redes sociais - talvez esteja aí, aliás, a verdadeira razão para querer regulá-las.
O problema se torna mais grave quando, ao despreparo, soma-se o abuso. Esse é o mesmo Toffoli que instaurou o infernal inquérito das fake news, dando a Alexandre de Moraes carta branca para transformar o Brasil, nos últimos cinco anos, em uma tirania judicial. É também o ministro que trabalha diligentemente para destruir a Lava Jato, embora afirme fazê-lo com “muita tristeza”.
A ironia chegou ao auge quando Gilmar Mendes, colega de Toffoli tanto na toga quanto na destruição da Lava Jato, afirmou nesta última semana que Curitiba tem “má fama” por causa da operação. Gilmar é o exemplo perfeito de quem critica o cisco no olho alheio sem enxergar a trave no próprio. Quem tem má fama, ministro? Quem envergonha o Brasil? “Saia à rua, ministro Gilmar”, diria Joaquim Barbosa.
Ministros como Toffoli, Gilmar e Alexandre de Moraes dão má fama mundial ao Brasil. Não surpreende que veículos de renome internacional, como The New York Times, The Wall Street Journal, The Economist e Financial Times tenham dedicado páginas e mais páginas aos desmandos dessa turma, com destaque para o ministro conhecido globalmente como "the friend of my father’s friend."
Vossas Excelências estão destruindo a Justiça deste país, parafraseando Joaquim Barbosa. O jurista Dalmo Dallari, professor da USP, já dizia que “Gilmar Mendes é a degradação do Judiciário”. Pelo andar da carruagem, Toffoli pode rapidamente roubar esse título. Felizmente, para ele, não corre risco de punição por esse "roubo". E, caso o risco surja, sempre poderá contar com Gilmar para anular o processo.
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