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Deltan Dallagnol

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Justiça, política e fé

Quantos Roger Dias vão morrer até acabarmos com as saidinhas?

Morte PM
O sargento Roger Dias, de 29 anos, foi baleado na cabeça por um criminoso que deixou a prisão beneficiado pela "saidinha" de Natal. (Foto: divulgação/Polícia Militar)

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Parte da esquerda brasileira comemorou que 95% dos presos voltaram à prisão depois da “saidinha de Natal”. A “saidinha”, concedida pela Justiça com base na Lei de Execuções Penais, permite que presos do regime semiaberto saiam por até 7 dias da cadeia, até 5 vezes por ano, usualmente em datas comemorativas como o Natal. Há alguns requisitos e condições, por exemplo, o cumprimento de um sexto da pena se o réu for primário ou de um quarto se for reincidente. 

Quem defende as saidinhas diz que são um passo necessário para a ressocialização, para a reinserção do apenado na sociedade. Contudo, ela é uma política efetiva ou acirra a crise na segurança pública? O debate voltou à tona depois de um criminoso, que usufruía de uma saidinha de Natal, matar a tiros o sargento Roger Dias, da Polícia Militar de Minas Gerais, no último 5 de janeiro. O policial tinha apenas 29 anos e deixou esposa e um bebê de 5 meses. 

Vamos aos números mais recentes: 56.924 presos receberam o benefício da saidinha em 18 estados brasileiros, sendo que 2.741 deles não regressaram ao sistema prisional ao usufruir do benefício. A esquerda, que tem uma visão ideológica de que criminosos são vítimas de sistemas e estruturas de opressão da sociedade, enxerga os dados como positivos, apontando que 95,2% dos presos retornaram à prisão.

A direita vê os números com outros olhos. Se 5% dos presos em saidinha não retornam ao sistema prisional, e se o benefício é concedido 5 vezes ao ano, isso quer dizer que, na prática, a saidinha tem servido para cerca de 25% dos criminosos que estão no regime semiaberto como uma oportunidade de fuga. Eles só precisam esperar até a próxima data comemorativa para saírem da prisão e não voltar nunca mais. Na ponta do lápis, quase 14 mil detentos voltam às ruas a cada ano sem cumprir suas penas.

O não retorno - a fuga - transforma o condenado em um foragido da Justiça, sinalizando que não pretende cumprir as leis. Há uma indicação muito forte, ainda, de que a esmagadora maioria dessas pessoas vai voltar a cometer crimes, até porque sua condição de foragidos os impede de serem inseridos no mercado de trabalho e de atuar em profissões lícitas. Só resta a esses foragidos, portanto, retornar ao mundo do crime, onde vão praticar furtos, roubos, tráficos de drogas, estelionatos, estupros, homicídios, latrocínios e toda sorte de crimes graves que vitimam os brasileiros. 

Eles só precisam esperar até a próxima data comemorativa para saírem da prisão e não voltar nunca mais

Se cada um deles praticar um crime por semana, estamos falando de 728 mil novos crimes por ano na sociedade. Além disso, os milhares de foragidos que tiveram as portas das cadeias abertas para fugirem por meio das saidinhas se tornam mão-de-obra fácil para as facções criminosas que dominam regiões inteiras do país. Só no Rio de Janeiro, 253 apenados não retornaram da saidinha de Natal, num estado que concentra as maiores operações do narcotráfico e de milícias do Brasil. 

Um exemplo claro disso, e que também teve grande repercussão, foi a fuga de três grandes chefões do tráfico de drogas do Rio de Janeiro: David da Conceição Carvalho, vulgo DVD, Saulo Cristiano Dias, conhecido como SL, e Paulo Sérgio Gomes da Silva, conhecido como Bin Laden. Esses dois últimos são líderes da maior facção de tráfico de drogas do Rio e todos os três são considerados de alta periculosidade pelas autoridades, tendo sido condenados a penas que vão de 18 a 28 anos de prisão por crimes como homicídio qualificado, tráfico de drogas e associação para o tráfico.

A saidinha produziu muitas outras mortes. Neste fim de ano, por exemplo, vitimou também a cozinheira Renata Teles em um hotel de Campinas. Gerou ainda outras cenas grotescas e irônicas que indignaram a sociedade, como as saidinhas de Dia das Mães ou dos Pais de Suzanne Von Richtofen, condenada pelo homicídio dos genitores, e aquelas do casal Nardoni, condenados pelo homicídio da pequena Isabella Nardoni.

Nosso sistema não ressocializa e sua frouxidão aprofunda a crise na segurança. Há tantos benefícios para criminosos e condenados que grande parte deles acaba cumprindo uma parcela pequena da pena. Segundo o World Justice Project, temos a 8ª justiça criminal mais inefetiva do mundo. Assim, a pena acaba não servindo nem para desestimular crimes, nem para neutralizar aqueles que oferecem perigo à sociedade. E as saidinhas só agravam esse sério problema. Se queremos enfrentar a criminalidade, seja de rua, seja do colarinho branco, precisamos de um sistema de justiça que funcione. 

Segundo o World Justice Project, temos a 8ª justiça criminal mais inefetiva do mundo

Depois do triste assassinato do sargento Roger Dias, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), prometeu que o Senado vai analisar o PL 2253, que acaba com as saidinhas, determina o exame criminológico para a progressão de regime de pena e possibilita o monitoramento eletrônico dos presos que passam aos regimes semiaberto e aberto. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados com 311 votos a favor e 98 contra. Ele está atualmente na Comissão de Segurança Pública do Senado e já recebeu parecer favorável do relator, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

Ainda estamos em janeiro de 2024 e, portanto, há bastante tempo para que o Senado não só aprove o PL 2553 e acabe de vez com as saidinhas, mas também trabalhe para reduzir a ineficiência e a impunidade brasileiras. Já basta o descrédito gerado pelo STF na sociedade. A confiança da população na Justiça depende da redução da percepção acertada de que criminosos perigosos são reiteradamente soltos e voltam às ruas, sem cumprirem sequer metade das penas a que foram condenados pela Justiça.

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Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima

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