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A cerimônia de Lula, dois anos depois do 8 de janeiro, tinha um objetivo, mas não era o objetivo oficial. Oficialmente, o objetivo era comemorar o “abraço à democracia” que teria vencido o abraço à ditadura bolsonarista.
Informalmente, contudo, todos sabiam que o tal “plano golpista” não passou de cogitações ou preparações nunca levadas a execução e abortados antes do 8 de janeiro. Todos sabiam também que os manifestantes desarmados do 8 de janeiro não tinham qualquer chance de assumir o poder.
Num surto raro de lucidez, o Ministro Gilmar Mendes disse em 18 de janeiro de 2023 a uma TV portuguesa: “não houve, de forma muito clara se pode dizer, uma tentativa de golpe, não houve quem quisesse assumir o poder, ocuparam o Supremo Tribunal Federal, ocuparam o palácio do planalto e ocuparam parte do Legislativo.”
Então, o que Lula comemorou no 8 de janeiro? Afinal, não houve ataque à democracia: os manifestantes do 8 de janeiro não prenderam pessoas em cativeiro sem ordens de prisão válidas ou para além do prazo legal. O STF fez. Os manifestantes não fizeram pescarias probatórias invadindo domicílios. O STF fez.
Com uma mão diz que apoia a democracia, com a outra censura críticos e opositores políticos, busca restringir a liberdade de expressão nas redes e apoia ditaduras
Os manifestantes não censuraram a voz de cidadãos nas redes sociais, cassando perfis inteiros, em violação à Constituição e ao Marco Civil da Internet. Adivinhem? Mais uma vez, o STF fez. Os manifestantes não perseguiram a direita “usando a criatividade”, diferente do STF.
Como é que o STF, com os ataques à democracia que partem dele, tem o despeito de “celebrar a democracia”? No âmago da ideia da democracia está o respeito aos direitos fundamentais que são vilipendiados diariamente, num inquérito sem fim, e está a separação de poderes, cancelada por uma corte ativista que manda no país.
Os manifestantes do 8 de janeiro devem ser responsabilizados pelos crimes que cometeram, como os crimes de dano e eventualmente incitação ao crime, a depender da prova que existir contra cada um, mas definitivamente não são eles que estão atacando a democracia.
E o que dizer do governo Lula? Com uma mão diz que apoia a democracia, com a outra censura críticos e opositores políticos, busca restringir a liberdade de expressão nas redes e apoia ditaduras, chegando a reconhecer a eleição fraudulenta do ditador Maduro. Lula tem a democracia por “amante”, como disse ontem, mas é casado mesmo é com o arbítrio.
É irônico que o governo e o STF posem de “salvadores da democracia”. São os fariseus da era moderna, contra os quais Jesus disparou: raça de víboras, hipócritas! Como sepulcros caiados, vestem-se com pompa, mas estão podres por dentro.
Então, o que o 8 de janeiro comemorou na verdade, se não era a democracia? Sem entrar na intenção de cada um, objetivamente, ela foi uma celebração do sucesso do contragolpe contra a direita, dado com base em uma narrativa de golpe.
O contragolpe supremo-lulista é o verdadeiro golpe contra a democracia e tem promovido a maior violação massiva de direitos fundamentais e políticos desde a ditadura.
Entretanto, as pessoas estão entendendo melhor do que nunca como a roda do sistema gira e a popularidade supremo-lulista está derretendo, apesar das medidas desesperadas que vão de troca de Ministro da Comunicação e populismo fiscal até ações contra críticos e pressão sobre as redes sociais.
As últimas pesquisas do PoderData e do Paraná Pesquisas mostram que mais brasileiros acham o governo ruim/péssimo do que ótimo/bom. A avaliação positiva do STF também despencou segundo o PoderData: já era pequena (31%), mas caiu mais de 60% em apenas dois anos, indo para 12%.
Pois é, parece que a narrativa supremo-lulista não está colando. Nesse contexto, nunca foi tão importante reforçar a narrativa de golpe. Uma cerimônia com pompa e circunstância é muito conveniente, pois dá palanque para se autodeclararem heróis e desviarem a atenção do que realmente está acontecendo: a asfixia progressiva da nossa democracia.