Herman Melville é para os americanos mais ou menos o que Machado de Assis é para os brasileiros. Foi o escritor que criou o romance fundamental de seu país; foi um dos responsáveis por levar a literatura de sua nação a um novo nível no século 19; e foi o responsável por criar alguns dos contos mais importantes de sua língua.
Se Moby Dick seria mais ou menos o equivalente de Dom Casmurro, os contos de Melville também têm importância semelhante aos de Machado para os brasileiros. Billy Bud e Bartleby, por exemplo, são clássicos que continuam sendo lidos e editados ano após anos nos Estados Unidos. Todo aluno de Ensino Médio corre o risco de topar com eles.
Benito Cereno é um desses contos geniais. Como no caso de Moby Dick, também se passa no mar, em um navio. Mas, dessa vez, o conflito não se dá entre o homem e a natureza. E sim, entre homens e homens. Mais precisamente, entre escravos e homens livres.
A história do livro (um conto bem grandinho, com mais de 100 páginas) é a de uma rebelião de escravos em um navio espanhol. Um navio americano se aproxima e o capitão Amasa Delano, que conta a história, se oferece para ajudar, sem saber o que está acontecendo ao certo.
Delano pensa que o navio espanhol teve apenas problemas técnicos, e não faz a menor ideia de que o capitão, Don Benito Cereno, está sendo mantido como refém pelos escravos e que só está interpretando um papel, para não ser morto.
O livro já causou muita polêmica. Foi visto como sendo a favor da escravidão. Foi visto como sendo contrário à escravidão. Depois se disse que não é a favor enm contra, e que nem é sobre escravos.
Como em Moby Dick, Melville não parece interessado em fazer uma metáfora simples, que diga respeito a apenas uma coisa. Não quer ser “interpretado”. A ideia é mostrar uma história forte, intrigante, que mostre como funciona a cabeça do ser humano. Como nos comportamos. Como somos.
É algo muito mais amplo do que uma história de duplo sentido, em que você deve ler uma coisa e entender a outra. Não é o tipo de história em que você termina e diz algo como “Ah, entendi”. O objetivo não é entender. E, sim, pensar.
Serviço: Existe no Brasil uma tradução de Daniel Piza, editada pela Imago, que pode ser encontrada em sebos.
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