Imagine por um momento se as pessoas que convivem com você não expressassem mais nenhuma linguagem corporal. Você saberia que sua mãe está brava? Você saberia se seu marido ou sua esposa está triste? Se está feliz? Pense quantas coisas deixamos de dizer de forma clara, por palavras objetivas, acreditando quase que inconscientemente que o outro está apto a interpretar o que está além de nossa linguagem falada.
A maioria das pessoas com autismo tem profunda dificuldade de interpretar expressões corporais. Assim, talvez uma expressão de tristeza, de alegria, um esgar de descontentamento nada signifiquem para seu filho/filha. Vivenciamos então dois desafios: ensinarmos crianças autistas a ler as expressões corporais e repensarmos a forma como nos comunicamos com nossos filhos.
É um desafio em qualquer relação expressar verbalmente o que sentimos de forma clara e concisa. Se eu disser aqui: “fale o que sente para seu filho de forma concisa”, pode parecer uma incumbência fácil, mas certamente não é. Quando eu acordo e tenho todo meu dia pela frente, fazer isso não é difícil, pois me concentro nessa meta. Porém, na milésima vez que uma das crianças faz alguma traquinagem, eu já estou exausta e fica muito difícil não utilizar apenas linguagem corporal ou um discurso de uma hora.
Não estou dizendo para abandonar a linguagem corporal, pelo contrário, mas, que tal utilizá-la com alguma legenda? Por exemplo, quando você está bravo com seu filho, é importante que mostre a ele qual é a expressão de uma pessoa brava, mas também é importante que diga “eu estou bravo”, para que ele possa relacionar aquela expressão facial com o sentimento correspondente. Da mesma forma, quantas vezes você pontua a seu filho quando está feliz? Não é uma coisa que costumamos fazer, não é?
Quando fizer uma expressão facial para seu filho, lembre-se sempre de uma dose de exagero, pois é difícil para uma criança autista aprender por meio de uma expressão que consiste em uma pequenina mudança. Por exemplo, não basta erguer levemente uma sobrancelha e entender que isso vai transmitir o conceito de não estar feliz. É preciso “servir” de forma completa. Pense em como os palhaços extrapolam em suas expressões faciais quando em uma apresentação infantil, e pense em como as crianças mais facilmente interpretam aquela expressão facial por ser exageradamente clara em sua mensagem.
É muito comum que crianças autistas tenham pouca expressão facial, causando uma monotonia em sua forma de expressão (poucas expressões, poucas modulações no tom de voz ao falar etc.). Porém, é possível aos poucos trabalhar para melhorar essa capacidade de interação. Saber a correlação entre expressão da face, tom de voz e sentimento correspondente vai fazer com que a criança aos poucos replique esses conceitos a terceiros, ou seja, generalize o comportamento.
É um trabalho longo e diário, mas vale a pena. A Gabriela aos poucos começou a mimetizar aquelas expressões para demonstrar seu descontentamento e também compreender as caras e bocas que faço. Inclusive, uma das coisas mais fofas do mundo é quando ela fica brava e começa a imitar a minha voz de brava, porque eu tenho uma voz de taquara rachada quando estou nervosa. Ela fica parecendo uma mini caricatura.
Esse processo também ajuda a nos expressarmos com mais facilidade com as pessoas que nos cercam, porque, se pararmos para pensar, a vida fica muito mais fácil se aprendemos a expressar objetivamente o que estamos sentindo. Talvez devêssemos refletir sobre como as pessoas neurotípicas não se comunicam com clareza e como é preciso que apresentemos de forma clara na face, na fala, o que está em nossos corações.
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS