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Meu filho autista: 5 dicas para 2017

Imagem disponível do google imagens com marcação para reutilização livre

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Se a virada de ano tivesse uma música de fundo, tal qual um filme de comédia romântica, com certeza seria “Lua de Cristal”, da Xuxa. Já imagino os fogos no céu e ao fundo “tudo que eu fizer/ eu vou tentar melhor do que já fiz/ esteja meu destino onde estiver/ eu vou tentar a sorte e ser feliz”. Nesse clima de renovação, mil matérias na televisão: “10 metas para reorganizar suas contas”, “Como sair do vermelho nesse ano”, “Simpatias para encontrar o amor de sua vida em 2017” etc.

Infelizmente, não houve pautas na televisão direcionadas para pais de autistas. Seria o máximo uma televisão direcionada só para pais de autistas, não seria? Com certeza, conteúdo não ia faltar!

Acho que nós, pais de autistas, também merecemos uma pauta sobre “Ano Novo e autismo”, algo que nos dê uma diretriz de renovação através de metas e ações palpáveis. E agora, ao final da primeira semana do ano, precisamos pensar em nos programar sobre como serão nossas ações em 2017. Algo como: nossas “metas de Ano Novo no que se refere ao autismo”! Que tal? E é esse o objetivo dessa postagem. Vou trazer aqui 10 dicas (ou metas) para 2017. Espero que gostem e que sejam úteis!

DICA 1. O QUADRO DE TAREFAS: Muitos autistas têm um grande apego à rotina, isso não é novidade. Um quadro de tarefas ajuda a criança a se planejar e lidar de forma mais adequada ao que está por vir (inclusive crianças que não tem autismo).

Na busca do quadro de atividades perfeito, eu tive uma longa jornada. Primeiro fazer no computador e imprimir toda semana. O problema é que isso levava tempo, pois todo domingo eu tinha que sentar, fazer o quadro e imprimir; então, durante a semana, ela pintava o quadro ou usava para colar adesivo, aí eu tinha que fazer de novo; ou mesmo eu programava uma atividade fora de casa e aí chovia e eu tinha que alterar o quadro. Isso sem falar quando a tinta da impressora acabava, e eu tinha que sair correndo para comprar, desesperada, chateada, xingando a HP por tudo que ela fez e faz. Depois de algumas semanas, eu odiava fazer o quadro de atividades. E isso não é bom.

Então, eu decidi fazer um quadro em EVA, com velcro. Basicamente, o que você vai precisar é de uma folha de EVA para servir de base, mais umas quatro folhas de EVA para fazer os cartões de atividades, uns dois metros de velcro, papel, cola quente e algum meio para imprimir as atividades.  Na folha base, eu escrevi os dias da semana e colei em cada dia uma das faces do velcro; depois, imprimi no computador cartões das atividades em folha sulfite e colei em quadradinhos de EVA que recortei e, por fim, atrás dos quadrados, a outra parte do velcro. Então, eu montava o quadro no domingo e, caso necessário, alterava durante a semana, sempre comunicando a Gabi das alterações com o máximo de antecedência possível.

O bom desse quadro é o custo, que, para a montagem, gira em torno de R$ 30,00 com todos os materiais (e mais uns R$ 12,00 a R$ 25,00, caso não possua pistola de cola quente). O problema desse quadro é que suja fácil, o velcro cai de vez em quando e demora cerca de cinco horas para uma montagem legal. Outra questão é quando você decide fazer uma atividade nova sobre a qual não fez o cartão ainda – você terá que imprimir essa atividade, cortar EVA, colar o velcro, enfim, montar o cartão de novo, o que é um empenho.

Depois, troquei os cartões de velcro com uma folha base (aquela que tem os dias da semana) por uma folha impressa plastificada. Ficou melhor, mais bonitinho. Mas mesmo assim dava uma boa mão de obra para fazer os cartões. O custo fica em torno de uns R$ 30,00 também. Ainda é possível fazer tudo plastificado, cartões e folha base. Mas aí recomendo que tenha uma máquina de plastificação (para quem mora em Curitiba, vi para vender na loja Kalunga do Shopping Estação). Particularmente, eu acho um trabalhão! E fico pensando em ter que plastificar cada atividade nova… Enfim, acho meio enlouquecedor.

Acervo pessoal

Acervo pessoal

O quadro que melhor funcionou para mim foi o de madeira. Eu mandei fazer e custou uns R$ 120,00, o que considero que valeu a pena porque a durabilidade é maravilhosa. Tem local para encaixar um cartãozinho com a atividade. Aí, comprei uma folha mais grossa e imprimi todas as atividades mais comuns que ela faz. Fiz blocos de cartões com as terapias, com as atividades de lazer mais comuns, com os locais que saímos para comer, com as atividades de vida diária. Deu uns 140 cartões. Imprimi do tamanho do encaixe, recortei. E deixei uma base salva em meu computador. Quando tem uma nova atividade, imprimo e recorto. Aos poucos, a necessidade de imprimir foi diminuindo.

A Gabriela já está lendo, então hoje só escrevo o nome da atividade. Mas, caso seu filho ainda não leia, é muito importante que se indique a atividade por uma imagem. Então, por exemplo, se a atividade que quer indicar é “dormir”, coloque a imagem de um desenho de uma criança dormindo. Aqui o google imagens salva a gente. Vale colocar foto do terapeuta ou da sala de terapia ou foto do local aonde se vai. Caso seu filho já leia, lembre-se de escrever os nomes dos terapeutas e não das terapias – afinal ele não vai entender se você colocar que, na quarta-feira pela manhã ele vai, por exemplo, para psicomotricidade relacional.

Não cometa o erro que eu já cometi: não vai deixar o quadro e os cartões ao acesso de seu filho. Aqui em casa eu dei bobeira um minuto e a Gabriela alterou todas as atividades do quadro. Basicamente, segundo a montagem dela, não haveria momento para dormir e tomar banho e a vida seria uma sequência de pula-pula, comer guloseimas e assistir Dora Aventureira.

O tamanho do quadro deve ser suficiente para que a criança enxergue a atividade a uma certa distância. E não adianta apenas fazer o quadro, tem que lembrar de reiteradamente ir com a criança até o quadro, remetendo quais serão as atividades do dia.

Para quem mora em Curitiba, indico o local Mr. Laser Cut (41 99738-1504; é na rua Tibagi, bem pouco depois de passar a transversal Benjamin Constant) para realização desse quadro de madeira. Lá, eu dei as indicações e eles fizeram como eu pedi (como disse, custou R$ 120,00). Perguntei para vários pais, mas ninguém soube indicar outro local. Se você conhece empresa que faça, peço que deixe nos comentários (aí haverá mais opções aos pais que quiserem um similar).

 

DICA 2: Trace metas que envolvam ações suas e não resultados que não podem ser previstos.

É comum fazermos uma lista de metas para o ano que se inicia, seja de forma escrita ou mentalmente. Isso é excelente, mas temos que tomar cuidado. Teve uma vez que eu fiz a seguinte meta: esse ano a Gabi vai aprender a falar e vai sair falando que nem uma criança sem autismo, e tenho dito. Bom… Ela aprendeu a falar no referido ano, mas não é da mesma maneira que uma criança que não tem autismo. Metas como essa são perigosas.

A primeira questão é saber diferenciar nossos desejos de nossas metas. Desejar que seu filho venha a falar como uma criança sem autismo é válido! Você deve cultivar esse desejo e ter fé nele. Esse desejo deve impulsionar você a tomar atitudes que ajudem a alcançar esse objetivo, como, por exemplo, inserir seu filho em uma terapia, ou mesmo seguir com mais determinação as orientações dos terapeutas. Mas esse desejo não pode ser uma meta, sob pena de você depositar uma responsabilidade imensa nos ombros de seu filho.

Então, pontue quais são os seus desejos e, com base nesses desejos, pontue metas que só envolvam você. Por exemplo: eu quero que meu filho venha a falar. A terapeuta falou que, para isso, eu tenho que estimulá-lo de forma intensa, dizendo o nome dos objetos – meta de reservar duas horas por dia para focar exclusivamente em estimular meu filho a falar. Veja que esse só foi um exemplo, mas existem um milhão de metas, mais específicas que podem ser seguidas. É muito importante incluir os terapeutas na hora de traçar as metas.

Vou dar um exemplo de algumas metas que eu coloquei para mim:

1.. Desejo que a Gabriela durma mais cedo. Meta: às 20h, eu começarei a aplicar com ela uma rotina para o sono, em qual seguiremos uma ordem de tarefas que irá fazendo ela perceber que está chegando a hora de dormir. Dificuldade da meta: Vou ter que me esquematizar para desacelerar meu ritmo (deixar a casa mais calma) a partir das 20h; e, levando em conta que fico acordada geralmente até as 3h com energia total, terei que me policiar bastante, o que exige um alto grau de organização pessoal e profissional de minha parte.

2.. Desejo que a Gabriela pare de colocar tudo o que vê na boca. Meta: Realizar à risca todas as orientações da terapeuta ocupacional da Gabriela, o que inclui atividades a serem feitas em casa. Dificuldade da meta: disponibilizar tempo e energia para realizar essas atividades durante todo ano sem perder a motivação.

3.. Desejo que a fala de Gabriela fique mais fluida e espontânea. Meta: aplicar todas as orientações da psicoterapeuta sobre isso, o que inclui estimulá-la de meia em meia hora e dizer o que alguém está fazendo e anotar qual foi a resposta dela (e o tipo de intervenção que foi necessária para qual ela desse a resposta correta).

Veja que são coisas que até parecem simples, mas que, para serem aplicadas, demandam grandes mudanças pessoais nossas. Para cumprir essas metas, é necessário organização e determinação pessoal.

O mais importante é que foquemos em cumprir as metas durante o ano, mas que não coloquemos um prazo para o desejo. O desejo deve ter nossa fé eterna que irá se realizar e, por isso, não pode ter um prazo. Já a meta é uma adequação pessoal nossa, que não envolve a resposta da criança ou do meio externo. Cumprir a meta é possível e extremamente satisfatório.

 

DICA 3: Lembre-se que você é um ser humano.

Envolva-se do espirito de renovação, mas não coloque para você mesmo objetivos sobre-humanos. Na hora de pensar tudo que quer fazer “pelo” e “para” seu filho, lembre-se de reservar tempo para tomar banho, comer, dormir e ter um lazer. Essa dica pode parecer algo bobo, mas é extremamente relevante. Eu já tracei objetivos pessoais que, na tentativa de cumprir, fiquei dois dias sem tomar banho e quase sem comer. Se situações como essa estão acontecendo com você, algo na sua vida não cheira bem! Provavelmente você mesmo, porque banho é algo necessário.

É preciso aprender a se colocar limites. E, acredite, às vezes é um processo extremamente difícil. Eu ainda não sou boa nisso, mas estou melhorando. Eu sei que você quer fazer o possível e o impossível pelo seu filho, mas isso não pode leva-lo a adoecer, a passar mal. Seu filho precisa de você bem, saudável, sorrindo. Seja aberto com os terapeutas quando algo for muito difícil de ser feito, pois, por vezes, eles podem ajudar a achar outra alternativa.

 

DICA 4: Mapeie previamente o que vai ler sobre autismo. Procure fontes confiáveis.

Uma das coisas mais importantes para ajudar seu filho a lidar com os sintomas do autismo é estar sempre lendo e se atualizando. Só que é muito importante procurar leituras e vídeos confiáveis sobre o tema. Esses dias, uma mãe chegou para mim e falou que leu na internet que comer muita abóbora cura autismo. Se abóbora curasse autismo, essa notícia estaria no Jornal Nacional e não só em um site na internet, haveria pesquisas sobre o tema, alguém por aí ganharia um prêmio Nobel por causa disso. Pode parecer tentador acreditar nessas coisas, mas temos que ser ponderados.

Agora, com licença, fico por aqui. Eu preciso terminar de cozinhar a abóbora que está no forno! Brincadeira!

 

DICA 5: Compre prateleiras.

Acervo pessoal

Acervo pessoal

Tão simples e mágicas. Embora eu tenha um casamento alegre e pleno, eu realmente gostaria de beijar na boca a pessoa que inventou a prateleira. O “como fazer” é simples, instale as prateleiras e coloque brinquedos que a criança ama lá em cima, fora do alcance dela. Com isso, seu filho vai se esforçar para conseguir o brinquedo. Vai tentar apontar ou falar. Claro que o nível de exigência sobre como seu filho se manifesta deve ser gradual. Não coloque o brinquedo lá em cima e exija que do dia para noite seu filho fale: “mamãe, eu gostaria muito que a Sra., se não fosse incômodo, pudesse me alcançar a Galinha Pintadinha, pois eu adoraria fazer uma brincadeira lúdica”. Eu disse “prateleiras” e não “visita do Espírito Santo”.

Um apontar, uma sílaba, uma palavra, uma frase. As coisas vêm aos poucos. Para saber o quanto exigir, sempre converse com os terapeutas. Mas, de qualquer forma, como ajudam as prateleiras! Acho que, com o diagnóstico de autismo, deveríamos ter acesso gratuito a prateleiras e estoque de café! São itens imprescindíveis!

Que 2017 traga quadro de tarefas, com muitas tarefas divertidas. Que no ano que se inicia você tenha prateleiras e alegria em sua casa. Que a gente tenha mais e mais autistas plenamente incluídos na sociedade! Um grande beijo.

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