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A vida vem em ondas como o mar… O relato do parto dos gêmeos

Bento e Miguel tiveram de passar pelo banho de luz por causa da icterícia, muito comum em prematuros. (Foto: )
Bento e Miguel tiveram de passar pelo banho de luz por causa da icterícia, muito comum em prematuros.

Bento e Miguel tiveram de passar pelo banho de luz por causa da icterícia, muito comum em prematuros.

Logo depois que tive o José Fernando, esse verso da música de Lulu Santos e Nelson Motta ficou martelando na minha cabeça. Passou o tempo e esqueci. Eis que entrei em trabalho de parto dos gêmeos, e ele voltou à minha mente. A cada contração, eu lembrava do verso. Porque, em geral, é assim que uma nova vida chega, em ondas… de dor.

Começa tudo tranquilo, com ondas baixinhas e espaçadas. Com o passar das horas, as ondas vão ficando mais intensas e próximas. É como o mar passando da calmaria para a influência de uma forte tempestade. O que consola é saber que depois de raios e trovoadas, o mar bravio se acalma.

Mas toda assa história de mar e ondas é porque quero contar hoje sobre a chegada dos gêmeos ao mundo. Estou devendo esse relato aqui há algum tempo. Espero inspirar algumas pessoas.

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Gêmeos de parto normal? Sim, é possível.

Na reta final da gestação, eu mais parecia um balão. Estava inchada, com uma barriga enorme, pés doloridos e tornozelos tão roliços que calça alguma ficava confortável. Eu sabia que era cedo para os meninos nascerem. Ainda faltavam 15 dias para chegarmos às 36 semanas, a idade gestacional mínima para os bebês nascerem bem e não precisarem ficar em UTI neonatal. Mas essas duas semanas parecia muito tempo. Estava cansada, irritada e ansiosa. Eu não aguentava mais carregar a mim e aos bebês.

Na madrugada do dia 3 para 4 de dezembro, acordei sentindo contrações leves. Sai do meu quarto, deitei na caminha do quarto dos gêmeos e passei o resto da noite cronometrando as contrações. Cochilei um pouco entre uma onda e outra de dor. Elas vinham leves, a cada 15 minutos.

Acordamos cedo naquele dia. Arrumei o José, o levamos para a creche. Como o Emerson tinha um exame numa clínica próxima ao consultório da minha médica, fomos juntos. Lembro de falar no carro enquanto estávamos indo para a clínica: “Acho que dessa semana não passa”.

O Emerson ficou na clínica, eu liguei para a médica, que disse que poderia me atender logo. Deixei o Emerson fazendo o exame e fui andando – sim, uma maluca – até o consultório. Chegando lá, logo a Dra. Carla me atendeu e confirmou o que eu já imaginava: estava em trabalho de parto, com 4 cm de dilatação e contrações ritmadas.

Mas o ideal era que os bebês ficassem, pelo menos, mais umas duas semanas dentro da barriga. Começou a operação segura. Minha médica receitou hormônios, injeção para amadurecer o pulmão dos bebês e me encaminhou para a maternidade. Eu deveria ficar em repouso.

Fomos para casa, pegamos minhas coisas e fomos para a maternidade. Fui examinada pelo médico de plantão, tiraram minha pressão – que estava nas alturas – fiz exame de sangue e de urina. Depois de muita espera, quando achei que seria internada, nada feito. Como não havia vaga na UTI neonatal, me mandaram para casa – sim, um absurdo.

Como eu não estava muito animada com a internação, fui para casa sem drama. Falei com a minha médica, passei na farmácia, comprei os remédios receitados e tomei a primeira injeção de corticoides para ajudar a amadurecer o pulmão dos meninos.

Na quinta-feira pela manhã, senti as contrações diminuírem, mas elas ainda estavam presentes. A tarde, voltei para a maternidade para saber se a dilatação havia evoluído. Lembro que estava muito calor naquele dia e muito, muito, muito, abafado. Depois de esperar quase duas horas, fui atendida. A dilatação continuava em 4 cm e as contrações tinham sumido. Na hora de ir para a casa, o mundo desabou em chuva.

Passamos na farmácia, tomei a segunda e última injeção de corticoide. Pegamos o José na creche e fomos para casa. No fim da noite, resolvi olhar os resultados dos exames que havia feito na quarta-feira. SURPRESA: eu estava num quadro de pré-eclâmpsia.

Depois de muito chorar porque não queria passar por uma cesárea, fui dormir. O Emerson me tranquilizou, afinal, não havia o que fazer naquele momento. O plano era ligar pela manhã cedinho para minha médica e ir até o consultório para ela me ver. Esse era o nosso plano, não o dos bebês.

Hora da ação

Fomos para a cama um pouco depois da meia-noite. Assim que eu deitei, senti uma pontada forte na barriga. Não dei muita bola, achei que era o Bento se acomodando, como sempre. Dormi um pouco. Acordei com uma contração muito muito muito muito forte. Fui até o banheiro, o tampão mucoso havia saído. Levantei, senti mais uma contração forte — dessas que paralisam a gente –, consegui chegar ao quarto e avisar ao Emerson: “Acorda, estão nascendo”.

Troquei de roupa em segundos. Por Deus a minha sogra estava dormindo lá em casa. Então, pude ir tranquila para a maternidade. As dores vinham em ondas… isso aí, como o mar. Eram fortes, mas ainda espaçadas.

Na maternidade, logo fui atendida. A médica de plantão fez um toque, eu estava com 6 de dilatação e com contrações ritmadas. Agora, elas vinham a cada cinco minutos. Ligou para a minha médica que pediu para tentar interromper a evolução do trabalho de parto com progesterona. Fui medicada e segui para a sala de pré-parto para observação.

Pensei que ia demorar e falei para o Emerson ir embora. Porém, assim que ele entrou na sala para se despedir, as dores aumentaram muito. Eu sabia que eles estavam nascendo. Pedi para o Emerson ficar.

A bolsa estourou e as dores ficaram realmente fortes. A cada onda, eu esmurrava a parede e falava um palavrão baixinho – essa é a minha maneira de lidar com a dor.

A médica residente me disse para evitar fazer força porque os bebês não podiam nascer pois não havia vaga na UTI neo-natal e eles poderiam morrer — sim, foi isso mesmo que ela falou. Assim que a residente concluiu esse raciocínio genial, veio mais uma dor muito forte, a qual me obrigava a fazer força involuntariamente. Era a natureza mandando aquele primor da medicina calar a boca.

Chamei novamente a médica e disse com todas as letras: “Eles estão nascendo, chame a minha médica.”

Pouco depois, a Dra. Carla chegou. Eu já estava com 10 de dilatação. Fui para a sala de parto implorando por uma anestesia. Nada feito. Na hora, a médica me disse que não daria tempo — depois soube que ela resolveu não me dar a anestesia para não correr o risco de diminuir a capacidade respiratória dos meninos. Mandou eu me concentrar e fazer força.

Eu sei que senti dor, mas não lembro ao certo da intensidade. Tenho muito nítido na minha memória todo o esforço que fiz, lembro bem de sentir os ossos do meu quadril abrindo e de ter muita sede. Entre uma contração e outra, pedia água. Prometeram um copo após o parto. Esse foi um baita de um incentivo. Quanto mais sede, quanto mais dor, mais força eu fazia.

O Emerson ajudava apoiando as minhas costas e empurrando a cada contração. A “maravilhosa” residente ficou ao meu lado. Avisava que a contração estava vindo, como se isso fosse necessário. A Dra. Carla me orientava sobre a força que eu deveria fazer e aguardava tranquila pela chegada dos bebês.

Não sei quanto tempo durou. Mas não foi muito. Às 3h54 do dia 6 de dezembro o Miguel nasceu. Não era tão pequeno (46 cm), era magrinho (2,230 kg), mas estava com os pulmões plenos, chorando muito alto. Felicidade. É a palavra que define esse momento.

Como o Miguel era prematuro, ele foi logo para a sala da pediatria para ser avaliado e aquecido. Enquanto isso, na sala de parto… As dores passaram. Ficamos cerca de 5 minutos ali, aguardando o Bento resolver nascer. Eu senti o movimento dele na minha barriga. E pouco depois veio a primeira, e muito forte, contração. Duas ou três dores depois, o Bento nasceu – eram 4h11 da manhã, ele mediu 45 cm e  pesou 2 kg.

Veio ao mundo dentro das bolsa de líquido amniótico, que a médica estourou pouco depois. Não chorou. Estava muito ocupado fazendo xixi – quase molhou a Dra. Carla. Acho que só depois percebeu que havia chegado ao mundo. Pois terminou de fazer o xixi e aí abriu o bocão. Chorava alto. Sinal de bons pulmões. Plenitude. Agora a palavra era essa.

Assim como o Miguel, logo o Bento foi levado para ser avaliado na pediatria. Enquanto isso, a placenta nasceu – mais duas contrações, dessa vez, bem leves. Logo depois, os dois chegaram para mim. Mamaram um pouco do colostro que meu corpo já produzia naquele momento e foram encaminhados para o berçário, onde ficaram em incubadoras para serem monitorados. Eu fui para o quarto. Antes recebi medicação para dor e a tão prometida água.

Lembro de, antes de dormir, fazer uma oração. Agradeci, pedi muito por eles e, por algumas horas, descansei. O Emerson não. Passou o resto da madrugada de olho nos meninos. Não sossegava no quarto. Eu dormi até umas 7h. Acordei, tomei banho e então fui ver meus filhos. Eram tão frágeis, pequeninos, mas valentes.

Passamos apenas cinco dias no hospital. No domingo à noite, eles dormiram comigo no quarto. Na quarta-feira, recebemos alta. A nova e maior aventura das nossas vidas começava para valer.

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Eu amo relato de partos. Então, que tal você contar como foi o nascimento do seu filho — ou filhos. Se interessar, deixa um recadinho lá nos comentários com o seu contato de e-mail para conversarmos. Quero publicar, pelo menos, um relato por mês.

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