Noite dessas, ao voltar de um restaurante, fui abordado num semáforo pelo motorista do carro ao lado. O condutor e o passageiro pediam informação pela janela, em português carregado de sotaque (não identifiquei exatamente a origem): “Por favor, como fazemos para chegar à Praça Tiradentes”? Cansado depois de um dia cheio, no curto intervalo do sinal vermelho, não consegui traçar mentalmente um caminho facilmente explicável do ponto em que estávamos até a praça. Olhei para minha esposa, que saíra do restaurante passando mal, mas já dormia. Bondosa, ela certamente não se importaria se desviássemos do nosso caminho para ajudar alguém. Quando o sinal abriu, respondi que me seguissem. Eu os levaria até lá.
Depois de algumas voltas e ajustes de rumo, sempre cuidando para que os visitantes não ficassem muito para trás, chegamos à rua que leva diretamente à praça. Era só seguir reto. As torres da Catedral já podiam ser vistas, ao fundo. Eles emparelharam o carro e agradeceram. Senti-me um bom samaritano, um exemplo de que o curitibano é cordial, um afável anfitrião que, mesmo cansado e com a esposa passando mal, desvia do caminho de casa para garantir que os visitantes não caiam em mãos erradas e cheguem ao destino com segurança. “Mais um tijolinho em minha morada no Céu”, quase cheguei a pensar alto.
Eu já sonhava com as recompensas póstumas à minha boa ação, quando notei que, em vez de seguir até a Praça Tiradentes, os distintos senhores encostaram o carro diante de uma “boite” – com luz vermelha e tudo. Fiquei indignado. Nada exatamente contra a “boite” (numa próxima oportunidade eu explico o que penso sobre esse tipo de estabelecimento), mas me senti tapeado. Fiquei com uma sensação parecida com a que tenho quando vejo que boa parte dos tributos que pago, que deveriam seguir para hospitais, escolas e até praças, acabam parando nas mãos de políticos corruptos e afins – que costumamos chamar de algo como “filhos de trabalhadoras de ‘boites’”, nos raros momentos de revolta (o que, diga-se, é muito injusto com tais trabalhadoras, que dão duro por seu sustento).
Em ambos os casos (no dos gringos que levei para a “boite” e no dos tributos que são embolsados por governantes corruptos e afins), reconheço que boa parte da culpa é minha. Fui inocente. Não parei para pensar nos motivos que levariam dois estrangeiros de meia-idade à procura de uma praça à meia-noite – a uma missa na Catedral é que eles não estavam indo. Da mesma maneira, às vezes não paramos para pensar para onde vai o dinheiro dos tributos que pagamos.
A solução para tais desvios não é deixar de ser um bom samaritano para com visitantes estrangeiros, nem deixar de ser um bom contribuinte para com o Estado brasileiro. A solução é ser mais cauteloso ao distribuir votos de confiança – nas ruas e nas urnas. O que os senhores pretendem fazer em uma escura praça vazia de gente? E o que os senhores pretendem fazer com um escuso malote cheio de dinheiro? Temos de ficar atentos. Afinal, segundo o Impostômetro, o povo brasileiro já pagou R$ 1,1 trilhão em tributos neste ano. E o número cresce a cada segundo. Daria para construir e equipar mais de 4 milhões de postos de saúde, mais de 1 milhão de quilômetros de estradas asfaltadas, mais de 24 milhões de postos policiais e 84 milhões de salas de aula! Ora, se a Saúde está em estado terminal, o Transporte está parado, a Segurança está dando medo e a Educação está reprovada, é preciso que cobremos: em que “boite” está indo parar o nosso dinheiro?
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