A Gazeta do Povo publicou, nessa semana, dois artigos com duas opiniões sobre financiamento do Carnaval pelo Estado. Os artigos são de autoria de Dario Luiz Dias Paixão, professor da Universidade Positivo e da UFPR e de Wagner Vargas, sócio-diretor da Chicago Boys Investimentos e especialista do Instituto Liberal.
Wagner Vargas protestou, pois “centenas de milhões de reais são empenhados todos os anos para custear essa festa tipicamente brasileira, sendo grande parte desses recursos advindos dos nossos impostos. Vale lembrar que o Estado não gera riquezas, mas apenas extrai os recursos, compulsoriamente, de quem produz e sob pretexto de que serão devolvidos em formato de serviços públicos ‘gratuitos’ para a população. Se a grosso modo parece aceitável tal extração, não soa tão simples encaixar essa bela festa de nossa cultura, que é o carnaval, como algum serviço essencial, por maior que seja o esforço retórico.” (clique aqui)
Afirma que as despesas com a festa não são prioritárias e que, se fosse rentável, por que aplicar recursos dos contribuintes? E é lucrativo para quem? Em síntese, o autor defende que, como são os impostos que sustentam o Carnaval, e como nem todos gozam do evento festivo, então não há razão para que o Estado a financie. Trata-se de “punição a quem mais depende da verba pública”.
Dario Luiz Dias Paixão, em outro artigo (clique aqui), defende que Carnaval é “um patrimônio público nacional”, pois assim definido em Decreto-Lei (de 1937). Que festas de Carnaval famosas “têm dificuldades de se manter sem o apoio financeiro governamental” e que a “a tradição não pode ser abandonada, pois o carnaval é a festa do povo. E, se é bom para o povo, é bom para quem nos visita”.
Em primeiro plano, em suas essências, são opiniões conflitantes sobre o uso de recursos públicos. Wagner Vargas critica, fundamentalmente, o uso de recursos de impostos, custeados por todos, para propiciar o evento. Enquanto que Dário Paixão afirma se tratar de uma tradição, por isso é justificável a aplicação de recursos públicos.
A questão em tela foge da dicotomia certo/errado. Despesas públicas são resultantes de decisões políticas e a alocação de recursos, desde que não conflite com a Constituição ou com a lei, é discricionária e compete ao governo. Portanto, o que se denota de ambos os artigos é que o assunto foge da esfera jurídica.
De um lado, tem razão Dário Paixão ao afirmar que o Carnaval integra a cultura brasileira. Ademais, frutos são colhidos, ocorrendo o incentivo ao turismo. Por outro enfoque, também procede a opinião de Wagner Vargas, sobretudo pela afirmação de que os impostos, ao serem aplicados para o evento festivo, penaliza a parcela da população que não participa ou não aprecia o festival. Porém, creio que faltam, às duas opiniões, alguns elementos cruciais.
O primeiro é a transparência. As despesas públicas voltadas ao Carnaval devem ser divulgadas com detalhes e com simplicidade, com o fito de realizar controle e permitir conhecer como o dinheiro do contribuinte é gasto. As críticas poderão surgir e o povo terá melhores condições de avaliar se a festa é válida, do ponto de vista de gestão de recursos escassos.
O segundo elemento é o mais relevante. Cuidemos das prioridades. Wagner Vargas diz que o dispêndio para a finalidade ora analisada não é prioritário. A afirmação, hoje correta, carece de contextualização. Prioridade é definição política. E depende do contexto histórico e econômico. Na atual senda, o Brasil enfrenta crise econômica grave, com fortes impactos nas finanças dos Estados. No meu juízo, prioridades são as políticas de saúde, as de educação – nem todos, talvez, pensam assim. Portanto, num cenário de escassez de recursos, saúde e educação vêm primeiro.
Se houver dinheiro suficiente para sustento das prioridades, não haverá, a priori, problema de o governo escolher despender em comemorações populares. Como dissemos, trata-se da cultura brasileira. Mas, se insuficiente o caixa, é preciso realizar escolhas difíceis e trágicas, com o objetivo de preservar direitos constitucionais. O outro caminho – a inversão das prioridades – trará prejuízos, sobretudo aos menos abastados.
Para que se conheça a real definição de prioridades dos governos, a transparência é imprescindível. Então, deve-se deixar bastante clara a aplicação dos recursos nas festas carnavalescas. Somente dessa forma será possível afirmar se o governo pode ou não despender recursos públicos, dinheiro dos contribuintes, com manifestações populares não prioritárias.
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