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Loucura, fanatismo, brutalidade, intolerância. Muitas palavras podem servir para descrever o ato cometido em Foz de Iguaçu neste sábado (11) pelo policial penal federal Jorge José da Rocha Guaranho. Segundo o boletim de ocorrência, ele invadiu uma festa e disparou com sua arma contra o aniversariante, o guarda municipal Marcelo Aloizio de Arruda, que revidou. Arruda morreu. Guaranho foi internado.
Guaranho era bolsonarista. Arruda, petista. A orientação política dos dois é relevante para compreender o crime. Guaranho, segundo os relatos, entrou na festa, que tinha o PT e Lula como tema e para a qual não havia sido convidado (consta que sequer fosse conhecido do aniversariante), gritando "aqui é Bolsonaro!" e fazendo ameaças.
Não é possível fingir que esse tem tudo para ser um episódio isolado de violência política, provocado por um louco, fanático, bruto ou intolerante. Não será um episódio isolado se os principais candidatos à Presidência na campanha eleitoral deste ano — Lula e Bolsonaro, portanto — não colocarem a mão na consciência e resolverem, daqui para frente, moderar o discurso.
O tom do discurso dos candidatos tem, sim, influência sobre os ânimos e a disposição à violência de seus apoiadores.
Episódios trágicos como o de Foz de Iguaçu podem ocorrer mesmo sem falas acirradas dos candidatos, é claro. Mas tornam-se mais prováveis se o tom for semelhante ao de um chamado para a guerra, de um tudo ou nada, de ódio ao adversário, de relativização das agressões mútuas.
Lula, por exemplo, precisa evitar declarações como a de sexta-feira (8), quando fez um agradecimento a um ex-vereador do PT que em 2018 foi preso por empurrar um manifestante antipetista, fazendo com que ele batesse a cabeça contra o para-choque de um caminhão, sofrendo traumatismo craniano. A agressão ocorreu em frente ao Instituto Lula, em São Paulo.
Lula disse que o ex-vereador, conhecido como Maninho do PT, foi preso por defendê-lo, para "não permitir que um cara ficasse me xingando na porta do Instituto". Trata-se do tipo de declaração que legitima atos de violência política.
Bolsonaro, por sua vez, vem adotando cada vez mais um discurso de incitação ao uso da força como meio para resolver disputas políticas. Obviamente, não se trata de dizer explicitamente que os apoiadores ataquem petistas na rua, mas de fazer constantes menções a um possível cenário de guerra civil caso as eleições não sejam "limpas" (ou seja, implicitamente, se o resultado das urnas não for o que ele espera), de exortar seus apoiadores a se armar (não como uma medida complementar de segurança pública, mas como garantia de "liberdade") e de incentivar a intolerância política ao descrever a campanha eleitoral como uma "guerra do bem contra o mal".
A retórica de Bolsonaro é propositalmente vaga quando usa tais expressões bélicas, mas, para bons entendedores entre os apoiadores, é o que basta.
Sem uma moderação no discurso dos candidatos, a campanha de 2022 pode se tornar a mais violenta desde a redemocratização. Potencialmente violenta tanto para os eleitores, como para os próprios candidatos.
Não podemos nos esquecer que Bolsonaro já foi vítima de um atentado a faca, do qual saiu vivo por muito pouco, durante a campanha de 2018.
E que, no mesmo ano, em março, uma caravana de ônibus em que viajava Lula foi atacada a tiros. Por sorte, neste caso, ninguém se feriu.
Que os episódios do passado não sirvam de justificativa para uma campanha ainda mais violenta este ano.
É preciso que os candidatos parem de lavar as mãos para a brutalidade que é cometida em nome deles e condenem essa forma de resolver disputas políticas. A responsabilidade para evitar uma campanha violenta também é deles.