Os candidatos outsiders José Luiz Datena e Pablo Marçal vinham, como de costume, desempenhando muito mal no debate da TV Cultura para a prefeitura de São Paulo, neste domingo (15) quando, por fim, protagonizaram a cena da cadeirada, um momento lamentável que ofuscou tudo o que tinha sido discutido de útil até ali pelos adversários. Marçal, inseguro para tratar de propostas e na falta de oportunidades para usar sua estratégia de lacração em cima de Ricardo Nunes e Guilherme Boulos (com Tabata Amaral ele evita mexer), focou em Datena, que já havia quase ido às vias de fato em debate anterior. Com base em uma acusação de assédio sexual de quatro anos atrás contra o apresentador, chamou-o de estuprador, usando gírias da cadeia e o trecho de uma música dos Racionais MC's. Depois de algumas trocas de farpas e de explicações dadas por Datena que foram ignoradas pelo influenciador, Marçal chamou Datena de "arregão" e disse que ele não era "homem" para brigar.
A assessoria de Marçal depois soltou nota afirmando que o candidato do PRTB havia sido "covardemente" agredido. Com certeza Datena está muito errado de ter partido para a violência física e merece ser responsabilizado pelo destempero. Mas "covardemente" não se aplica. Marçal literalmente chamou-o para a briga, desafiando-o à pancadaria. Deveria estar preparado para a possibilidade de a provocação dar resultado. A relação de causa e efeito está claríssima, mas o ex-coach que enriqueceu prometendo riqueza instantânea a quem o ajudasse a enriquecer, obviamente, se fez de vítima. E chegou ao cúmulo de comparar a cadeirada à facada sofrida por Jair Bolsonaro em 2018 e ao atentado contra a vida de Donald Trump, nos Estados Unidos, em julho passado. Não há comparação possível.
A cadeirada de Datena em Marçal não muda um fenômeno cada vez mais evidente: a rejeição crescente aos aventureiros e amadores que querem comandar a maior cidade do Brasil
Fato é que Marçal precisava desesperadamente de cenas como essa para recuperar fôlego na campanha, depois de uma ascensão meteórica seguida de um movimento de queda nos últimos dias. Seu estilo de candidato "contra-tudo-o-que-está-aí" rendeu fãs, mas também elevou sua rejeição. Sua candidatura perdeu tração quando o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, passou a aparecer na propaganda de rádio e TV de Nunes pedindo antecipação de voto útil no prefeito para evitar a vitória de Guilherme Boulos em um eventual segundo turno contra Marçal (as pesquisas mostram que Nunes tem mais chances contra o psolista).
É bastante improvável que a cadeirada favoreça Marçal tanto quanto seus estrategistas esperam. O seu eleitorado, predominantemente masculino, conhece o código do boteco ou da pelada de futebol de que quem provoca a briga divide a culpa. Não se descarta a possibilidade de que Datena ganhe alguns pontinhos nas pesquisas por ter feito algo que, infelizmente, muitos paulistanos gostariam de fazer, ao menos metaforicamente. Essa era a tônica dos comentários sob os vídeos da cadeirada que foram postados no Instagram por veículos de comunicação logo após o debate: muita gente parabenizando o apresentador e apenas uma minoria defendendo Marçal, o que é surpreendente, já que ele tem um séquito fiel de seguidores digitais.
Marçal e Datena são os dois candidatos em São Paulo mais identificados com a antipolítica. É a primeira vez que ambos vão adiante com candidaturas para cargos eletivos. O primeiro quer que o segundo desista de concorrer (e foi essa uma das provocações que antecedeu a agressão). De fato, se o apresentador sair do páreo, é possível que muitos dos seus votos, de eleitores cansados com a política tradicional, sejam transferidos para Marçal.
Mas a cadeirada de Datena em Marçal não muda um fenômeno cada vez mais evidente: a rejeição crescente aos aventureiros e amadores que querem comandar a maior cidade do Brasil. Para os eleitores que têm discernimento, a política tradicional, com todos os seus inegáveis defeitos, ainda é melhor do que briga de bar.
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