O presidente Lula está insatisfeito com o Aerolula, o avião oficial da presidência, um Airbus 319CJ, desde o final do seu segundo mandato, em 2010, quando preparava-se para transferir o bastão para Dilma Rousseff. E isso que o Aerolula, como o apelido da aeronave indica, havia sido comprado por encomenda do próprio Lula, em 2005, ao custo de 56,7 milhões de dólares.
O Aerolula tem baixa autonomia, o que significa que precisa ser reabastecido antes de completar doze horas no ar. Em uma viagem à Ásia, por exemplo, são necessárias pelo menos duas escalas, algo que Lula classificava já em 2010 como "humilhante". Dilma Rousseff não mandou comprar outro avião. Já havia sido um desgaste político grande quando seu antecessor e mentor decidiu trocar de aeronave poucos anos antes.
Lula, pelo visto, considera que comprar ou adaptar um novo avião "não é gasto, é investimento".
O Aerolula continuou em uso nos anos seguintes, servindo tanto a Michel Temer quanto a Jair Bolsonaro. Temer, porém, chegou a alugar por três anos um Boeing 767-300ER capaz de voar por 11.000 quilômetros sem reabastecer, contra os 8.500 quilômetros do Aerolula. Mal completou o primeiro semestre do seu terceiro mandato, e Lula já iniciou as tratativas para substituir o Aerolula por um avião maior, com mais autonomia e... com mais conforto para o casal presidencial.
Além da "humilhante" baixa autonomia do A-319CJ, Lula agora reclama que o avião precisa ter uma suíte com cama de casal maior e banheiro com chuveiro para ele e a primeira-dama Janja poderem rodar o mundo. Também quer um pequeno escritório e uma sala de reuniões, além de cerca de 100 poltronas semileito para os ministros e assessores. Uma das alternativas colocadas para a Aeronáutica é adaptar um dos dois Airbus 330 comprados na gestão de Jair Bolsonaro para uso militar. O custo ainda está sendo estudado.
O que pretende Lula com tanta viagem internacional, se enfrenta tanta dificuldade no âmbito doméstico?
Em um momento em que o governo está sob pressão para demonstrar responsabilidade fiscal e é suspeito de querer equilibrar as contas públicas com aumento de impostos, em vez de corte de despesas, qualquer gasto adicional que pareça supérfluo ou não emergencial pode representar um ônus político. Mas Lula, pelo visto, considera que comprar ou adaptar um novo avião "não é gasto, é investimento". O desejo de ter um equipamento para voar com mais conforto sinaliza claramente que Lula pretende fazer do seu terceiro mandato o recordista em viagens internacionais.
O recorde já está sendo estabelecido: 13% do mandato atual de Lula já foi gasto fora do país, contra 11% de Bolsonaro nos primeiros meses de governo, 10% de Temer e 8% do início do primeiro mandato de Dilma Rousseff e 5% do segundo. Lula 3 também já está viajando mais do que Lula 1, que passou 8,5% do início do mandato no exterior, e Lula 2, com 10%.
Também quando se faz a comparação do número de viagens em todo o mandato, Lula foi recordista entre os presidentes desde o fim da ditadura militar. E caminha — ou voa — para bater o próprio recorde. Até agora, Lula já foi para Estados Unidos, Argentina, Uruguai, China, Portugal, Espanha, Reino Unido, Emirados Árabes Unidos e Japão. E já tem previstas viagens este ano para França, Argentina novamente, Colômbia, Bélgica, São Tomé e Príncipe, África do Sul, Índia e de novo para os Estados Unidos. Também há a possibilidade de que ele vá ao Vaticano para visitar o papa Francisco.
O que pretende Lula com tanta viagem internacional, se enfrenta tanta dificuldade no âmbito doméstico, por exemplo na aprovação de projetos de interesse do seu governo no Congresso — onde já se demonstrou que não possui uma base sólida?
A ênfase nas viagens é resultado da pretensão que Lula tem de marcar seu terceiro mandato por conquistas na arena internacional. Para isso, ele recorre à diplomacia presidencial, que consiste em deslocar o processo decisório em política externa do Itamaraty para a presidência. Esse deslocamento tem por objetivo promover mudanças mais rápidas nas relações externas, contornando a burocracia ou a "tradição" diplomática dos funcionários de carreira do Ministério das Relações Exteriores. É uma forma de colocar preferências ideológicas e partidárias do presidente acima de políticas de Estado, de continuidade diplomática.
Outro efeito da diplomacia presidencial é o papel de caixeiro viajante assumido pelo presidente, o que o aproxima de setores empresariais interessados em negócios no exterior. Em resumo, a diplomacia presidencial favorece a absorção da ideologia e a influência do lobby empresarial na política externa. Já sabemos onde isso vai dar, certo?
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