O aiatolá Ali Khamenei, autoridade máxima do Irã| Foto: EFE/EPA/Iranian Supreme Leader Office
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Para entender a resposta da diplomacia lulista ao atual estágio do conflito Irã-Israel, vale a pena olhar para a história. Nos anos anteriores e iniciais da II Guerra Mundial, durante o governo de Getúlio Vargas, o Brasil adotou em relação aos Estados Unidos e à Alemanha uma postura de "equidistância pragmática", conforme termo cunhado pelo historiador Gerson Moura. "Equidistância", obviamente, significava que o país procurava se colocar a uma distância igual entre as duas nações em disputa, nem muito para o lado de uma, nem para o da outra. Aproximava-se alternadamente entre elas, procurando tirar proveito do fato de que isso levava americanos e alemães a fazer concessões para angariar o apoio brasileiro.

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Pouco a pouco, porém, as circunstâncias obrigaram o Brasil a adotar um lado. Havia um imperativo moral para ficar contra os nazistas, mas no fundo foram os compromissos políticos assumidos pelo Brasil com os Estados Unidos nos anos anteriores que nos colocaram no campo dos Aliados, conforme explica Letícia de Abreu Pinheiro no livro Política Externa Brasileira (1889-2002).

O que se vê é a política externa lulista apenas fingindo equidistância. Cada vez fica mais claro que o Brasil assumiu um lado — e é o lado das ditaduras da China, da Rússia e do Irã.

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Cerca de 80 anos depois, o mundo vive novamente o fantasma de um conflito global com potencial para colocar em lados opostos os Estados Unidos e uma superpotência emergente, a China, obrigando as nações a se posicionar para um lado ou para o outro. O Brasil poderia estar adotando, se não desde já a escolha pelo lado das democracias ocidentais, ao menos, por enquanto, uma postura de equidistância. Mas o que se vê é a política externa lulista apenas fingindo equidistância. Cada vez fica mais claro que o Brasil assumiu um lado — e é o lado das ditaduras da China, da Rússia e do Irã.

A nota do Itamaraty sobre os últimos desdobramentos do conflito Irã-Israel é um dos exemplos dessa equidistância mal disfarçada. E nem tanto por não condenar explicitamente o ataque com centenas de drones e mísseis promovido pelo Irã contra Israel neste fim de semana. O problema maior está naquilo que a nota omite: o motivo original pelo qual Israel atacou uma representação diplomática do Irã na Síria, matando integrantes das Forças Quds, o braço externo da Guarda Revolucionária iraniana que ajuda a armar combatentes no Líbano e na Faixa de Gaza para matar israelenses; a pirataria por procuração que o Irã promove contra embarcações de Israel, por meio dos rebeldes hutis do Iêmen; o risco de que o Irã esteja mais uma vez tentando obter um arsenal atômico.

As declarações de Celso Amorim, assessor para assuntos internacionais de Lula, horas após os ataques repelidos pelo sistema de defesa antiaérea de Israel, foram menos fingidas. Ele disse que é difícil avaliar quem começou a briga, que o ataque do Irã foi um "gesto" em resposta à morte dos integrantes da Guarda Revolucionária na Síria e que a escalada do conflito na região depende das ações de Israel. O atual estágio da inimizade Irã-Israel é mais complicado do que isso.

O governo de Israel estava de fato cada vez mais isolado em suas ações na Faixa de Gaza, inclusive por parte dos Estados Unidos. O ataque iraniano refaz os laços de apoio americano a Israel, mas não é exatamente correto afirmar que Jerusalém "atraiu" o Irã para a guerra contra o Hamas. O Irã sempre esteve envolvido nessa guerra, pelo simples fato de que o grupo terrorista palestino não teria sido capaz de realizar o ataque que matou 1404 pessoas em Israel em outubro passado sem alguma ajuda do Irã. O Irã tinha vários motivos para incitar o governo extremista de Benjamin Netanyahu a retaliar contra o Hamas, atacando a Faixa de Gaza, e um deles era melar a aproximação de Israel com a Arábia Saudita, o seu maior rival na região.

O Brasil pende para o lado de ditaduras como a Rússia, a China e o Irã pelo mesmo motivo que o IBGE de Lula resolve distribuir para as escolas um mapa-múndi com o Brasil no centro de tudo: trata-se de "reposicionar o Brasil" como consequência da "emergência do Sul-Global", conforme explicou Marcio Pochmann, presidente do IBGE. Ou seja, o governo Lula acredita que a nova ordem geopolítica em construção terá como protagonistas as nações emergentes (em especial aquelas que compõem o Brics) em substituição às potências ocidentais, e isso exige um "reposicionamento do Brasil", seja na representação do globo terrestre, seja na política externa.

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O posicionamento diante do conflito Irã-Israel está inserido nessa lógica. Não tem nada a ver com a defesa pragmática dos interesses nacionais, com neutralidade diplomática ou com a preocupação com valores universais.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]