Pela segunda vez em quase dois anos, apoiadores de Jair Bolsonaro, um tanto iludidos com a realidade, pedem que seja concedido ao ex-presidente o Prêmio Nobel da Paz. A mais recente foi ao longo dos últimos dias quando as três dezenas de moradores da Faixa de Gaza com cidadania brasileira entraram na lista de pessoas que poderiam cruzar a fronteira com o Egito para fugir da região do conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas. A repatriação, dizem alguns de seus apoiadores, ocorreu porque Bolsonaro se encontrou com o embaixador de Israel no Brasil na terça-feira passada e pediu que fosse dada celeridade à saída dos brasileiros.
A outra ocasião em que Bolsonaro foi "cogitado" para o Nobel da Paz por seus militantes digitais foi em fevereiro de 2022. Na ocasião, o então presidente brasileiro desembarcou em Moscou para um encontro com o ditador Vladimir Putin em meio aos temores de que a Rússia estava prestes a atacar a Ucrânia.
No dia seguinte, Bolsonaro disse que “por coincidência ou não, parte das tropas deixaram a fronteira", referindo-se a notícias sobre uma possível retirada das forças russas da região, que Bolsonaro considerou uma "grande sinalização de que um caminho para a solução pacífica se apresenta no momento para Rússia e Ucrânia". Dessa forma, Bolsonaro tentou atribuir a si próprio algum tipo de influência sobre Putin e sobre sua disposição de iniciar uma guerra. Seus apoiadores inundaram as redes sociais com postagens dizendo que ele havia evitado a Terceira Guerra Mundial. Mas, rapidamente, o Bolsonaro negociador de conflitos virou piada, porque uma semana depois a Rússia começou a bombardear a Ucrânia.
Bolsonaro é tão responsável pela repatriação dos brasileiros de Gaza quanto teria sido se Putin de fato tivesse desistido de invadir a Ucrânia. Ou seja, não é; e não faz nenhum sentido conceder a ele os louros da chegada do grupo de palestinos-brasileiros ao Brasil nesta segunda (13).
Dias antes do tal encontro de Bolsonaro com o embaixador, o governo israelense já havia informado ao chanceler de Lula, Mauro Vieira, que os brasileiros estavam na fila para deixar Gaza. A saída do grupo atrasou por outros motivos, relacionados principalmente a questões de segurança que exigiram o fechamento da fronteira algumas vezes ao longo da semana. Além disso, a embaixada de Israel em Brasília emitiu nota dizendo que Bolsonaro não havia sido convidado para a reunião com os parlamentares. Ele apareceu lá de penetra (o que não impediu o embaixador de se deixar filmar e fotografar com ele, no que foi entendido pela diplomacia lulista como uma provocação).
Mauro Vieira, como era de se esperar, disse ontem que a repatriação dos brasileiros é mérito das gestões feitas pela diplomacia do atual governo junto a Israel e a outros países com influência no conflito.
Sem dúvida existiu um esforço por parte da chancelaria brasileira. Mas é um enorme exagero atribuir a repatriação dos palestinos-brasileiros a alguma capacidade extraordinária de negociação da diplomacia lulista junto a Israel, ao Egito ou a outros países da região (Lula ligou até para o presidente do Irã, financiador do Hamas, na crença vã de que ele pudesse mexer alguns pauzinhos nesse sentido).
Afinal, outros países com uma relação muito mais próxima com Israel, como a Alemanha, ainda não conseguiram repatriar todos os seus cidadãos retidos em Gaza. Por outro lado, a Indonésia, que sequer mantém relação diplomática com Israel, foi um dos primeiros países a conseguir a liberação dos seus cidadãos que viviam no território palestino. Ou seja, não há um padrão claro nas nacionalidades que já conseguiram liberação para deixar a Faixa de Gaza. Isso sugere que não há nem favorecimento a países amigos, nem punição àqueles que tiveram posicionamentos críticos em relação às ações militares de Israel em Gaza. O mais plausível é que cedo ou tarde os palestinos-brasileiros seriam liberados para repatriação.
Bolsonaro nada fez para merecer os louros da repatriação. Lula, ainda que a influência da sua diplomacia tenha sido limitada, poderá reivindicar o mérito para si porque é quem ocupa a presidência e comanda a política externa. É do jogo.
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