O presidente Lula deixou claro, ao falar aos seus correligionários petistas no final de 2023, que esperava que as eleições municipais deste ano fossem um repeteco da sua polarização com Jair Bolsonaro na presidencial de 2022 e um prenúncio de 2026. Errou, e errou feio. Não foi a disputa Lula versus Bolsonaro, nem mesmo petismo versus bolsonarismo, o que deu a tônica dessa eleição. Os eleitores estavam mais preocupados com seus problemas imediatos, do cotidiano.
Ainda assim, seria possível dizer qual dos dois levou a melhor nas disputas deste ano, pensando no capital político que conquistaram para 2026, quando acontece a próxima eleição presidencial e para a renovação do Congresso Nacional?
As eleições municipais deste ano deram impulso à corrida por um substituto para Bolsonaro no campo da direita. Ele bate o pé e diz que vai sair candidato. Mas o único caminho para isso é via anistia no Congresso
Se for pensar em número de candidatos eleitos pelo partido de cada um, Bolsonaro levou a melhor. O PL conquistou 516 prefeituras, o quinto melhor desempenho, atrás de partidos do centrão, como PSD, MDB e PP. O PL também foi a legenda que mais emplacou prefeitos em municípios com mais de 200 mil eleitores. Foram 16, à frente do PSD, com 15. No geral, portanto, o partido de Bolsonaro foi bem, mas não cumpriu a meta de seu presidente Valdemar Costa Neto, que era de conquistar 1.000 prefeituras.
O PT, por sua vez, só conquistou 252 prefeituras, menos da metade do número do PL. O desempenho dos petistas foi pior que o esperado. O prêmio de consolação foi ganhar a prefeitura de Fortaleza (CE), a primeira capital sob comando do partido desde 2016.
A derrota de Guilherme Boulos em São Paulo mostrou que o PT não consegue sair do lugar na cidade. Alguns quadros do partido criticam a escolha de Boulos, dizem que deveriam ter tido candidato próprio. Mas quem? A verdade é que falta um nome forte na cidade para a esquerda.
Esses resultados mostram que a vitória de Lula contra Bolsonaro em 2022 não representou uma reabilitação do PT depois dos anos do auge do antipetismo e dos escândalos de corrupção. Lula venceu porque era o único líder político capaz de rivalizar com Bolsonaro, que inflou a própria rejeição com sua gestão desastrosa da pandemia e com seu discurso golpista. Foi o que garantiu a vitória apertada de Lula. Não os méritos próprios do petista ou de seu partido.
O que isso significa para os planos de reeleição de Lula em 2026? Que, sozinho, só com o PT e sua coalizão de esquerda, ele não leva. Mesmo que o candidato da direita não seja Bolsonaro, que está inelegível. Lula terá que atrair o centrão para o seu lado.
A mesma coisa vale para a direita bolsonarista, com ou sem Bolsonaro nas urnas. A eleição municipal deste ano marcou um fortalecimento do centrão e da direita. Isso, em tese, beneficia o campo político de Bolsonaro. Mas significa também que Bolsonaro, para se manter relevante politicamente, precisa ser capaz de se aliar ao centrão. E ele tem dificuldade de se aliar com quem não é do seu núcleo duro de apoio, quem não é 100% fiel e obediente a ele.
Bolsonaro também enfrentou algumas duras derrotas nessas eleições. No segundo turno, só sete dos 25 candidatos apoiados por ele venceram o pleito. Considerando apenas as capitais, Cuiabá teve um bolsonarista vencedor, Abilio Brunini. Adriane Lopes, prefeita eleita de Campo Grande, é bolsonarista, mas é do PP. E tem Emilia Correia, do PL, em Aracaju. Mas Emília nem citou Bolsonaro na campanha.
Os bolsonaristas de carteirinha, mesmo que em alguns casos sem ter tido o apoio aberto de Bolsonaro, perderam em Belém, Curitiba, João Pessoa, Manaus, Palmas, Porto Velho, Goiânia, Fortaleza e Belo Horizonte.
A vitória em São Paulo, por sua vez, não pode ser creditada a Bolsonaro, mas a Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo que apostou pra valer na continuidade da gestão de Ricardo Nunes (MDB). Bolsonaro só apareceu a poucos dias da eleição para um day-use com Nunes. E mais falou de si próprio e de seus planos para 2026 do que dos méritos do candidato.
Além de Tarcísio, também saíram fortalecidos com a vitória de seus aliados os governadores Ronaldo Caiado (União), de Goiás, e Ratinho Júnior (PSD), do Paraná. Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, ficou no zero a zero, já que apoiou o mesmo candidato derrotado que Bolsonaro para Belo Horizonte.
Ou seja, pensando em 2026, as eleições municipais deste ano deram impulso à corrida por um substituto para Bolsonaro no campo da direita. Ele bate o pé e diz que vai sair candidato. Mas o único caminho para isso é via anistia no Congresso. As chances são baixas devido às negociações para a sucessão nas presidências da Câmara e do Senado.
O bom desempenho de Pablo Marçal (PRTB) junto ao eleitorado bolsonarista em São Paulo, mesmo sem o apoio de Bolsonaro, mostrou que o ex-presidente não é tão indispensável assim quando se trata de endossar e alavancar candidaturas. Que ninguém pense que os outros potenciais presidenciáveis não entenderam a mensagem. No momento certo, vão colocar as mangas de fora.
Não importa quem vai despontar como sucessor de Bolsonaro na corrida presidencial de 2026, uma coisa é certa: terá de começar a costurar desde já alianças com o centrão, que também sofrerá o assédio de Lula. O desafio será fazer isso enquanto Bolsonaro insiste que o seu próprio nome vai estar nas urnas em 2026.
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