É uma boa ideia a proposta de estabelecer mandatos fixos para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e de dar ao Congresso Nacional mais poder na escolha dos indicados, assim como estavam no caminho certo os senadores que aprovaram uma mudança constitucional para limitar as decisões individuais na corte. Mas essas e outras tentativas de controlar o poder desmedido e a excessiva politização da atuação dos ministros terão efeito nulo ou limitado caso não seja feita a reforma do STF que realmente importa: acabar com o foro privilegiado dos políticos.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, pretende colocar para votação na casa, em 2024, a proposta de definição de mandatos limitados para o STF. Atualmente, os ministros ficam no cargo até a aposentadoria compulsória, aos 75 anos. Isso significa que, quanto mais jovens forem indicados para a corte, mais tempo permanecerão no topo do Judiciário brasileiro, moldando a jurisprudência e temas vitais para a nação por um longo período — muito além, provavelmente, da janela de influência política que os presidentes que os indicaram tiveram ou terão. O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, foi nomeado para a corte por Fernando Henrique Cardoso e está aí até hoje, ditando os rumos do país em inúmeros temas por meio do seu voto em julgamentos de última instância e até ajudando o Congresso a legislar.
A reforma do STF que realmente importa é o fim do foro privilegiado para parlamentares.
Foram apresentadas três PECs no Senado com o propósito de estabelecer mandatos para o STF. A primeira, de autoria do senador Angelo Coronel, cria um mandato de oito anos, renovável, e define a idade mínima de 55 anos para os indicados (atualmente é de 35 anos). A proposta também dá ao Senado e à Câmara dos Deputados a atribuição de indicar, cada um, três dos onze ministros do STF. Já a PEC do senador Plínio Valério propõe mandato de oito anos e idade mínima de 45 anos. A proposta de Flávio Arns, por sua vez, sugere mandato de quinze anos e idade mínima de 50 anos.
Em seu ótimo livro O Supremo: Entre o Direito e a Política (História Real), lançado este ano, o jurista Diego Werneck Arguelhes argumenta que o estabelecimento de mandato fixo para os integrantes do STF pode ser uma forma de corrigir disparidades no número de ministros que cada presidente consegue indicar ao longo de sua gestão e evitar que o critério de escolha seja a idade do nomeado (atualmente, quanto mais jovem, mais tempo poderá ficar na corte). Com mandatos fixos, a renovação da corte ocorre com mais frequência. Além disso, esse é o sistema adotado na maioria dos tribunais constitucionais ao redor do mundo.
Mas essa mudança não reduz a motivação política ou, o que é mais grave, o interesse próprio do presidente e dos parlamentares na escolha e na aprovação dos indicados para o Supremo. Enquanto o STF for a instância exclusiva de julgamento de ações penais contra parlamentares, ministros de Estado e presidente da República, os políticos vão privilegiar para o STF a nomeação e a aprovação de indicados com os quais possam ter uma relação de proximidade e de influência ou que sejam cautelosos na análise de casos que possam atingi-los. Esse é o real motivo pelo qual políticos eleitos depois se sentem reféns de juízes que detêm um enorme poder sem ter recebido um único voto popular.
A reforma do STF que realmente importa é o fim do foro privilegiado para parlamentares. Que possam sem julgados como qualquer outro cidadão, começando na primeira instância. Outras mudanças podem ajudar a aperfeiçoar o funcionamento da corte. Mas pouco ou nada vão atingir enquanto o STF for o único foro capaz de iniciar, cumprir todas as etapas, julgar e dar a palavra final, inapelável, em processos envolvendo os mesmos políticos que os colocaram nessa posição suprema.
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