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A vida está corrida e acelerada. Quais as consequências para a escola?

Cada vez mais temos a impressão de que a vida passa rápido demais. Os dias estão mais curtos, falta tempo para realizar todas as tarefas e o cansaço parece inevitável. O ritmo acelerado das grandes cidades força todos a trabalhar com prazos apertados, ajustar a agenda e, sobretudo, correr e correr… para não ficar atrasado.

No mesmo dia, recebemos centenas de mensagens no Whatsapp, somos bombardeados por informações no Facebook, Twitter, Instagram e, claro, ao mesmo tempo estamos estudando, trabalhando e fazendo malabarismos para lidar com as dívidas, os boletos, as relações pessoais e tantas outras tensões que produzem ansiedade.

Essa realidade tem nome e conceito próprio: aceleração social do tempo. A ideia de que é preciso aproveitar cada segundo e, sempre que possível, alargar os limites da capacidade contribuíram para a sensação generalizada de que “tempo é dinheiro”. As mudanças repentinas, que muitas vezes representam a simples descontinuidade de mercados, profissões e padrões culturais desestimulam qualquer planejamento de longo prazo.

Não é por acaso, que os tradicionais cursos de graduação e de pós-graduação estão perdendo espaço para modelos como os speed learning. O conhecimento aprofundado e longínquo concorre com recortes mais enxutos, direcionados e específicos.


Se quiser saber mais sobre o fenômeno da aceleração, confira o vídeo aqui.


Como a escola deve reagir ao ritmo acelerado?

Se o tempo acelerado já afeta o mercado de trabalho e a própria vida pessoal, com depressões, estresse e diversas doenças psicossociais, no ambiente da educação a pressa traz graves preocupações, afinal a construção do conhecimento exige, em diversos níveis, uma relação íntima com a calma e a paciência.

No ensino formal, os efeitos destas transformações ganham feições próprias. O descompasso entre o tempo da educação e do cotidiano acentua a situação de crise, que se desdobra, por exemplo, nos altos índices de evasão de sala de aula e no baixo desempenho nas provas nacionais e internacionais que medem os níveis de alfabetização e aprendizagem.

No livro Comunicação e educação: os desafios da aceleração social do tempo discutimos esta questão ao lado de outros pesquisadores ligados aos estudos de Educomunicação. Dentre os resultados obtidos, observamos que os jovens dedicam uma quantidade maior de horas a atividades como assistir televisão, ouvir rádio e acessar as redes sociais se comparado ao período que se preparam para provas, fazem o dever de casa ou os trabalhos escolares.

Enquanto 90% das quase duas centenas de alunos ouvidos disseram investir entre zero e uma hora aos estudos quando estão fora da sala de aula, 70% admitiram que navegam na internet quatro horas ou mais todos os dias.

Outro ponto de destaque foi o percentual de jovens que reconheceu fazer outras coisas simultaneamente às tarefas escolares. Cerca de 85% dos participantes afirmaram que mexem no celular e ouvem música enquanto estão debruçados sobre seus cadernos, livros e apostilas.

Mesmo o desenvolvimento da linguagem é afetado pela pressa: mensagens curtas e efêmeras, que logo desaparecem na timeline, despertam mais interesse que textos longos e mais aprofundados. Em outras palavras, jovens estudantes têm mais engajamento com memes, emojis e as dinâmicas das redes sociais do que com “textões” — ou seja, construções discursivas que superam os 140 caracteres.

O ensino formal pressupõe um tempo desacelerado, dedicação exclusiva e de longo prazo, com calendários anuais e um ciclo de formação inicial de quase uma década e meia. O tempo do cotidiano é fragmentado, curto, de pressão por resultados e atravessado por inúmeras experiências, não raro, simultâneas e que se renovam rapidamente.

O aumento exponencial do uso de aparelhos celulares e de smartphones entre os estudantes é um dos símbolos deste paradoxo. De acordo com o levantamento mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 70% dos jovens entre 10 e 19 anos e que moram nas cidades brasileiras de maior densidade populacional já contavam com um dispositivo de comunicação móvel para uso pessoal em 2015.

Familiarizado à realidade acelerada, das atividades sobrepostas, contínuas e não-lineares, os alunos sentem dificuldade de se adaptar à estrutura formal de educação, com seus modelos pouco flexíveis e estratégias pedagógicas tradicionais. Ficar desconectado, por vezes, parece castigar os estudantes com a sensação de que a “aula não acaba nunca”.

O distanciamento entre as linguagens da escola e do estudante colaboram para a acentuação de outros fatores inibidores do ensino, como a falta de concentração e o desinteresse. Alguns dos reflexos mais conhecidos deste cenário são a impaciência frente à leitura e o desejo cada vez maior por conteúdos mastigados.

O grupo de pesquisa Mediações Educomunicativas (MECOM), da ECA-USP, aplicou um amplo estudo no final de 2018, que buscava observar a relação de professores e alunos com os meios de comunicação — o seu papel no ambiente escolar — e com o tempo. Os dados, cujo levantamento envolveu mais de 3,5 mil pessoas de diferentes estados da Federação, estão em fase de tabulação e análise.

Os resultados preliminares, contudo, reforçam a ideia de que o desenvolvimento de um projeto de ensino consistente e adequado às particularidades do País passa pela compreensão do ecossistema educacional, incluindo as práticas juvenis, uma vez que nelas estão registrados alguns dos novos códigos — alguns binários, outros  não necessariamente — utilizados para apreender, compreender e aprender o, a partir do, e sobre o mundo.


*Texto escrito por: Douglas Calixto, jornalista, mestre e doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP. A dissertação “Memes na Internet – entrelaçamentos entre Educomunicação, cibercultura e “zoeira” de estudantes nas redes sociais” rendeu o prêmio de melhor mestrado da ECA-USP em 2017 e o prêmio de melhor mestrado do Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (Intercom) em 2018. É atualmente supervisor de Comunicação do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) e pesquisador do MECOM (Grupo de Pesquisa Mediações Educomunicativas).

Rogério Pelizzari, Doutor e mestre em Ciências da Comunicação, especialista em Gestão de Processos Comunicacionais pela ECA-USP. Jornalista e publicitário, atua há 20 anos com comunicação pública e desde 2010 é professor universitário. Pesquisador pelo Grupo de Mediações Educomunicativas (MECOM), desenvolve trabalhos voltados à cultura juvenil e, em especial, ao papel da música no processo de formação de estudantes da educação básica.

Os profissionais colaboram voluntariamente com o Instituto GRPCOM no Blog Educação e Mídia.

 

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