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Se existe um cartaz da época da escola que eu me lembre até hoje, esse cartaz era um baita papel que ficava na parede da biblioteca da Escola Estadual Ayrton Senna da Silva, em Foz do Iguaçu (PR). Consigo lembrar exatamente da minha sensação de espanto e impacto que senti ao ler a principal mensagem: ‘Você é o que você come’. O texto vinha acompanhado das ilustrações de duas garotas brancas, com diversos desenhos de alimentos em seus corpos. A garota gordinha estava recheada com pirulitos, bolos, bombons, biscoitos, balas, pudins, pizzas, hambúrgueres, refrigerante e toda lista das coisas que eu mais sentia prazer em comer naquela época. No corpo da menina mais magra, frutas, verduras, legumes e outros alimentos de origem animal, mineral e vegetal, itens que não consigo lembrar em detalhes. Na ocasião, interpretei a mensagem que aquela peça tentara me passar, muito rapidamente. E me achei um cara de sorte, pois comia absolutamente de tudo que a gordinha comia e ainda assim era magrão.

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Só mais tarde, depois de uma graduação em jornalismo, pesquisas e práticas em educomunicação e atuação com as interfaces comunicação e direitos humanos é que fui me dando conta do quanto aquele tipo de comunicação era questionável e pouco adequado. Aquela bendita mídia impressa, o cartaz infeliz da biblioteca, não estava acompanhado de nenhuma discussão sobre os casos de pessoas que tem predisposição genética para engordar, metabolismo que funciona com ritmo diferente a depender de cada organismo ou que doenças hormonais poderiam estimular a produção e armazenamento de gordura no corpo. Tampouco que a dinâmica biológica de mulheres era diferente da dos homens em termos de formação de massa magra, retenção de líquidos etc. Só tinha um lado da história: ‘mude a alimentação e seus problemas com sobrepeso/obesidade estarão automaticamente resolvidos’.

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Agora, imagine você que o coitado do cartaz foi só um nano exemplo de como aquele pedaço de papel mexeu com a minha maneira de interpretar o motivo de algumas pessoas serem gordas ou magras. O grosso da informação, de fato, tem seu fundamento: alimentos saudáveis tendem a construir corpos mais saudáveis. Entretanto, a complementação daquelas informações me vieram depois de muito tempo, por outras vias…

Para além do cartaz, a mídia que mais esteve presente no meu cotidiano era a TV aberta. Muito da minha educação também foi construída através dos conteúdos que eu consumia por lá. E o pior de tudo isso é que sempre se tratou de um consumo não consciente. Assistia por entretenimento, sem que ninguém me dissesse para confrontar as ‘verdades absolutas’ dos telejornais, suspeitar e identificar as atitudes racistas, machistas e homofóbicas das ‘brincadeiras’ dos programas de ‘humor’ ou ainda que, apesar de não ser reflexo da realidade, as telenovelas teriam papel importante na construção de imaginários sociais de quem as assiste.

Faltou comentar, por fim, que a maioria de tudo o que eu consumia era fruta de produções advindas do eixo Rio-São Paulo. Ou seja, a comunicação não era pra todos: não era democrática! E dá pra afirmar que ainda não é. Por conta disso, os movimentos sociais que lutam pela democratização da mídia, criaram um Projeto de Lei de Iniciativa Popular (Plip), para propor aos governantes que mudem a formar de financiar, difundir e fiscalizar a comunicação no país. Esse desejo ficou ainda mais evidente durante a realização das Conferências locais, estaduais e nacional da Comunicação, evento realizado em 2009, quando a população pôde dar ideias sobre políticas públicas de comunicação.

A seguir, vou listar só cinco das dezenas de coisas boas que a democratização da comunicação pode trazer para a nossa sociedade e que, acredito eu, deva ser pauta nos processos de educação para a leitura crítica da mídia. Vamos lá?

 

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    Se toda a grana de publicidade advinda dos cofres públicos for destinada para os grandes veículos de comunicação, como ficam as mídias comunitárias e com incidência local e regional? Esse círculo vicioso existente atualmente faz os veículos já consolidados continuarem a crescer e as mídias alternativas a permanecerem à margem da utilização de um recurso que, em teoria, seria para viabilizar comunicação para todos(as), inclusive médios e pequenos veículos de mídia.

     

      Tem hora que cansa assistir novela onde a trama só acontece no Leblon ou num bairro nobre de São Paulo, né? De vez em quando até aparece alguma coisa numa periferia ou algum lugar do nordeste, mas é basicamente isso. E os telejornais nacionais que nunca ou muito pouco noticiam acontecimentos de Roraima, Acre, Alagoas, Tocantins e Sergipe, hein?  Para fomentar a produção audiovisual que retrate os cenários, as pessoas e as situações fictícias ou reais dos 26 Estados brasileiros e Distrito Federal, é preciso políticas que estimulem os canais a acolherem essas produções e, por outro lado, que financie e mantenha a capacitação para produtores(as) criarem conteúdos que revelem as outras caras, paisagens e histórias do Brasil.

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        Quem já assistiu a um programa policialesco bem bagaceira, que expõe as pessoas antes que possam ter o direito de se defender ou serem ouvidos pela justiça? Ou aquela reportagem que expõe o rosto ou a voz de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual ou, supostamente, autoras de ato infracional? Abusos da mídia não devem ser censurados, mas práticas reiteradamente violadoras dos direitos humanos precisam ser identificadas e os veículos de comunicação que promovem esses crimes precisam ser responsabilizados.

         

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          Comunicação, assim como a saúde e a educação também precisa ser compreendida como um direito de todos(as), como de fato o é. E se todos(as), hoje, têm direito a poder utilizar um hospital, unidade básica de saúde ou escola pública, por exemplo, também precisam ter direito  ao acesso à comunicação em suas formas mais essenciais, como a radiodifusão (acesso à sinal de TV e rádio), serviços de voz e à rede em alta velocidade (internet banda larga, sobretudo). Ou você acha justo que comunidades rurais, ribeirinhas, indígenas e quilombolas não tenham acesso a nenhum desses serviços e vivam isoladas de se comunicar com o mundo?

           

            Não sei se vocês sabem mas as rádios comunitárias, por exemplo, só podem propagar o seu sinal pela distância de 1 km. Uma pessoa caminhando em ritmo normal consegue andar 6 km em uma hora! Ou seja, 1km de alcance é muita pouca coisa! Para fortalecer esses veículos, essa limitação arbitrária de cobertura (que também tem que seguir parâmetros de potência e número de estações por localidade) precisa mudar. Afinal, qual é o motivo do medo diante desses veículos de finalidade sociocultural serem geridos pela própria comunidade, sem fins lucrativos, hein?

             

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            Haveria muito mais coisas pra gente tratar, mas meu limite de caracteres já chegou ao fim, rs! Quem quiser esticar o papo tem que visitar o site www.paraexpressaraliberdade.org.br e navegar pelos materiais que tem por lá. E só pra você saber: Outubro foi o mês da Democratização da Comunicação. Dia 17/10 é considerado do “Dia C – Dia da Juventude Comunicativa” e “Dia Nacional da Democratização da Comunicação”. Dia 18 é o “Dia Mundial pela Democratização da Comunicação”. Foi por conta disso que nasceu a ideia para este post 😉

             

            Super abraço e bora refletir sobre a importância da educomunicação/educação para a leitura crítica da mídia pra não achar que o cartaz da escola ou a programação da TV são conteúdos inocentes e desprovidos de intenções políticas e sociais.

            *Artigo escrito por Diego Henrique da Silva Alves , jornalista e educomunicador do coletivo Parafuso Educomunicação e idealizador do portal Universo Educom. Parafuso Educom é colaborador voluntário do Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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