Eu adoro uma boa história. E sabe por que? Porque muitas delas possuem o incrível poder de inspirar seres humanos a mudarem, a serem melhores, a evoluírem para outros patamares. O Storytelling, além de ser encantador em sua própria essência, traz consigo uma definição espetacular: é o ato de enquadrar uma ideia em uma narrativa que informa, esclarece e inspira. E ela, a inspiração, é valorizada de forma especial em qualquer processo criativo. Ela mostra que o ser humano precisa sair das suas diversas bolhas, engessamentos e verdades pré-concebidas, a fim de aprender constantemente com outras pessoas e com o mundo à sua volta.
A partir dessa premissa, e sendo a Educação constituída e materializada por conexões e aprendizados entre pessoas, teria ela deixado de ser referência em inspirar pessoas? Será que a Educação perdeu o “fio da meada” e não conseguiu mais acompanhar a conversa sobre as coisas do mundo real?
Vale ressaltar aqui que a expressão “fio da meada”, que acabei de utilizar, surgiu no período da revolução industrial quando algumas empresas começaram a utilizar máquinas para a fabricação de tecidos, com a devida assistência e interferência da mão humana. Essas máquinas tinham uma espécie de gancho que sustentava o rolo de fio (meada) e, também, um operário responsável pelo seu bom funcionamento. A principal função desse trabalhador era pegar a ponta do fio (o fio da meada) e colocar em uma posição bem específica, onde a máquina começava a puxar o rolo e fabricar o tecido. Tal função exigia extrema concentração porque o orifício que a máquina usava para puxar o fio era muito pequeno.
Porém, nessa atividade aparentemente simples, residia uma grande dificuldade: os rolos passavam, um a um, a uma velocidade considerável e, por várias vezes, o operário perdia o “fio da meada” por falta de concentração, cansaço, ou pela falta de interesse naquele processo repetitivo e sem graça.
Será que diante do barulho da máquina, e do movimento frenético das suas peças, sobrava ao operário algum tempo para a inspiração e criatividade? Talvez aquilo que a empresa mais precisava – ideias para otimizar e melhorar o fluxo da produção – estavam bem ali encarceradas diante do fio, do pequeno orifício e da máquina.
Preciso agora lhes contar uma outra história: a educação ainda possui características análogas àquelas apresentadas no parágrafo anterior. Saibam que a educação padronizada e pasteurizada em suas diversas meadas, acabam por destruir a criatividade e a inovação, que são exatamente os ingredientes e qualidades primordiais para as questões estratégicas de saúde e economia vividas por todos os seres humanos do planeta na atualidade. Ecossistemas saudáveis, nas mais diversas áreas do comércio, da indústria e da prestação de serviços (e aqui está a educação), dependem de pessoas com boas ideias, que se adaptam de forma criativa às mudanças e que estão constantemente buscando soluções inovadoras mesmo diante de cenários de crise.
Diante disso, e provocando os leitores que de alguma forma estão envolvidos com educação, quero lhes apresentar três caminhos possíveis para o cenário educacional da atualidade: faça mudanças rápidas no sistema, pressione por mudanças impactantes no sistema ou assuma a dianteira para soluções fora do sistema.
As estruturas e processos de educação que são executados hoje, na sua grande maioria, não foram planejados tendo em mente o mundo em que vivemos hoje. Em função disso, estamos carentes de um número expressivo de seres humanos que, em conjunto e de forma harmoniosa, encontrem soluções criativas para os problemas complexos que nos afetam agora.
Há 50 anos a população do mundo era de 3,6 bilhões de pessoas e hoje temos pouco mais que o dobro disso. Nunca antes, na história da humanidade, tivemos tanta gente vivendo ao mesmo tempo na superfície do planeta e isso está em franco crescimento. Assim como estão crescendo de forma exponencial as tecnologias digitais que transformam, sem pedir licença, a forma como trabalhamos, compramos, vendemos, sentimos, nos relacionamos e aprendemos. E essa revolução mal começamos a experimentar de fato. O que conseguimos ver é só a ponta do icerberg das incríveis disrupções que baterão à porta de todos em breve.
Pelos quatro cantos do mundo temos observado instituições de ensino, por meio dos seus professores, experimentarem e testarem um novo jeito de fazer a aprendizagem continuar, apesar das portas das escolas estarem fechadas. Com isso, não será possível admitir a hipótese de que, quando a vida voltar ao normal, a educação não tenha evoluído para um próximo nível. Esse legado de descobertas, de encontrar novos caminhos, de criar novidades para resolver os velhos problemas, de fazer juntos e de compartilhar para que o outro melhore, de misturar o melhor dos seres humanos com ingredientes tecnológicos como ferramentas para potencializar o aprendizado, de entregar carinho e afeto junto com o conteúdo curricular ainda que por meio de uma vídeo-aula, precisa permanecer e melhorar a cada ano letivo.
Caso isso não aconteça, perderemos uma incrível oportunidade de mudança. Perderemos, mais uma vez, o “fio da meada” da Educação.
*Texto escrito pelo Professor José Motta, engenheiro, gestor educacional, especialista em Principles of Technology, Mestre em Tecnologias Emergentes em Educação e Consultor em Metodologias Ativas de Ensino, Inovação Educacional e Tecnologias Educacionais. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no Blog Educação e Mídia.
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