Mudança do Instagram estimula discussão a respeito do valor do conteúdo. Outro ponto de reflexão é o quanto os professores sabem sobre os interesses dos alunos nas redes sociais.
Os chamados “biscoiteiros” estão em polvorosa: desde o dia 17 de julho, o Instagram ocultou os likes das postagens dos usuários no Brasil. Agora, o número de curtidas naquela selfie da academia, nos registros fotográficos das good vibes — trips, picos e baladas — e nos vídeos irados feitos nos shows não poderá ser mais visualizado, exceto pelo próprio administrador do perfil.
A repercussão das alterações foi tamanha, que o assunto entrou no trending topics do Twitter e chegou a figurar no 12º lugar do Google Trends daquela fatídica quarta-feira. Mesmo que a empresa tenha argumentado que o objetivo principal é valorizar o conteúdo das postagens frente à cultura da “lacração” – na qual ganham os que acumulam mais corações —, houve quem viu a medida como mais um sinal de que o Instagram comunga da “cartilha ideológica progressista”.
Polêmicas virtuais à parte, propomos uma reflexão sobre os impactos destas novas formas de relação, das interações e dos afetos que os meios digitais ajudam a perpetuar na escola e nos processos educativos.
Os alunos são assíduos usuários da internet e postam, curtem e compartilham textos, imagens e sons, não raro, em sala de aula. Mas a lógica de interação nas redes, que se baseia em métricas e potencial de audiências impactadas, tende a jogar para o segundo plano aquilo que, em tese, deveria ocupar papel de destaque: o tema, o assunto, o argumento, as ideias, a abordagem, o nível de profundidade, a veracidade…, enfim, o valor das informações disponíveis nas publicações que circulam por estas mídias.
A pesquisa Inter-Relações Comunicação e Educação no Contexto do Ensino Básico, que foi aplicada no segundo semestre de 2018 pelo Grupo de Pesquisas Mediações Educomunicativas (MECOM-USP) e envolveu 3,7 mil alunos e 509 professores, de 23 estados da federação, traz informações que reforçam este entendimento. Os dados preliminares indicam que os estudantes utilizam prioritariamente o smartphone (86,4%) para acessar a internet e apenas 5,4% dos participantes, matriculados entre a 6º série do fundamental e o 3º do médio, não dispunham de um aparelho pessoal.
Em uma das questões, os jovens foram convidados a indicar o que mais gostavam de acessar quando se conectam à internet. De uma lista com nove opções, dentre as quais constavam alternativas como jogos, e-mails, sites de busca (Google, Bing etc) e ler notícias e e-books, redes sociais (76,1%) foi a segunda mais assinalada, atrás apenas do Youtube (81,4%). Quando observado apenas os estudantes do ensino médio, Instagram, Facebook, Twitter e companhia saltam para o primeiro lugar, alcançando 88,5% da amostra.
O número expressivo de smartphones e de conexões nas redes sociais revela que o acesso à internet agora é feito sem os limites do desktop. O celular acompanha os jovens em diversas situações, criando vínculos permanentes. Não há mais a distinção de on ou off-line.
Qualquer tipo de alteração nesta dinâmica tende a ser sentida pelos estudantes. Podemos supor que a retirada da exibição de likes do Instagram provavelmente terá impactos nas formas de sociabilidade desenvolvidas pelos jovens. Afinal, eles reproduzem a prática social de publicar e navegar pela web para saber "quem viu, quem curtiu, quem comentou" e assim por diante.
O universo das tecnologias digitais, que ocupa papel de centralidade no contexto infanto-juvenil, é complexo e acelerado, com atualizações e novidades disponibilizadas todos os dias. Conhecer o universo cultural dos alunos e desenvolver propostas pedagógicas antenadas com o mundo contemporâneo requer um mergulho nos conteúdos e nas representações presentes em ambientes como o Instagram, Facebook e Whatsapp, entre outros.
O fato de os estudantes consumirem redes sociais é um dado conhecido do cotidiano das escolas. Pesquisas como a desenvolvida pelo grupo de pesquisa MECOM não apenas colaboram no entendimento da extensão e da profundidade de tais conexões virtuais, como também nos ajudam a refletir sobre o real alcance dessas tecnologias para forjar sociabilidades e percepções do mundo.
Se o Instagram muda, os jovens reagem, comentando, criticando e elaborando novas formas de relação com amigos e amigas. As mudanças e reações podem ser um meio valioso para conhecer as linguagens, os afetos e as dinâmicas que mobilizam os estudantes.
*Texto escrito por: Douglas Calixto, jornalista, mestre e doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP. A dissertação “Memes na Internet – entrelaçamentos entre Educomunicação, cibercultura e “zoeira” de estudantes nas redes sociais” rendeu o prêmio de melhor mestrado da ECA-USP em 2017 e o prêmio de melhor mestrado do Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (Intercom) em 2018. É atualmente supervisor de Comunicação do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) e pesquisador do MECOM (Grupo de Pesquisa Mediações Educomunicativas).
* Rogério Pelizzari, Doutor e mestre em Ciências da Comunicação, especialista em Gestão de Processos Comunicacionais pela ECA-USP. Jornalista e publicitário, atua há 20 anos com comunicação pública e desde 2010 é professor universitário. Pesquisador pelo Grupo de Mediações Educomunicativas (MECOM), desenvolve trabalhos voltados à cultura juvenil e, em especial, ao papel da música no processo de formação de estudantes da educação básica.
O MECOM colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no Blog Educação e Mídia.
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