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Por que? Por que? Por que?

(Foto: Acervo) (Foto: )
(Foto: Acervo)

(Foto: Acervo)

Em uma caminhada de aproximadamente meia hora com uma criança de 5 anos muito curiosa, imaginativa e observadora, é possível perceber claramente como o mundo delas está imerso nas perguntas e não nas respostas.

Passeando com a minha filha caçula Giovanna – Nana, fomos até a praça com o Jack – nosso cão – e tanto na ida, quanto na volta ela me surpreendia com perguntas e comentários dos mais curiosos e estimulantes.

Pai, você viu que tem bambus novos nascendo ali naquele mato, e com certeza deve ter sacizinhos junto? Sabia que eles nascem ali? Pai, Por quê o rabo do Jack flutua na grama? (observando o Jack descansado na grama alta). Flutua filha? Sim, olhe lá como o rabo não entra na grama como a pata dele, porque eu acho que ele é bem leve, pois os pelos são leves, né?! Puxa é verdade filha, tem razão. Mas pai, será que os nossos pelos flutuam na grama também? (e lá foi ela testar seus cabelos). Pai, venha ver essa abelha em perigo com as formigas. Onde? Aqui, tem um monte de formigas vermelhas atacando a abelha. Mas como que elas conseguem se a abelha é maior e tem ferrão? Pois é filha, o que você acha? Hummm, eu acho que é porque elas estavam com ciúme da abelha e se juntaram pra atacar ela. E aí a abelha perdeu porque as formiguinhas se juntaram. Pai, olha que flor curiosa essa. Veja lá, parece peninha de pássaro. Como será que se planta uma dessa lá em casa? Acho que vou ter que falar com o Vovô Silvio, porque ele é especialista em plantas.

Em apenas alguns minutos, uma criança é capaz de disparar perguntas que nos tiram do chão. Sem medo, sem preocupação com o erro, com a exposição ou com o julgamento. Dessa maneira exercitam sua curiosidade e aprendem naturalmente. Não se colocam acima de ninguém e testam possiblidades. E a medida que crescemos somos condicionados a limitar nossas possibilidades. Nos tornamos mais céticos, calculistas e deixamos de explorar. E o pior, deixamos de transmitir aos nossos filhos, e professores aos seus estudantes, que perguntar faz bem e que sim é possível irmos muito além das respostas óbvias e expandirmos conhecimento através das perguntas. Aliás, nosso potencial criativo se desenvolve muito mais em cima de perguntas do que necessariamente respostas prontas. Por que? Por que não? Será que não seria melhor se…? E se fizéssemos de outro jeito? E se por acaso fosse o contrário? Simples perguntas, mas que podem desvendar várias respostas criativas para resolver um único problema. Assim muitos inventores e inovadores já o fizeram. Já dizia meu amigo, Eloi Zanetti, com quem fundei a Escola de Criatividade: “Para sermos mais criativos precisamos inclusive nos permitir a fazer perguntas fora de contexto, idiotas ou impertinentes, pois muitas delas quando nos arriscamos a fazer, são justamente aquelas que destravam processos e encontram novos caminhos, além de não serem nada idiotas e se revelarem ousadas no final”.

Em outro episódio, a pequena Giovanna começou a cuidar de um tatu bolinha que havia encontrado no gramado. Levava seu pequeno amigo pra cima e pra baixo, pra escola e pra casa. Fazia anotações, desenhos e numa caminhada para a escola em uma rua em declive, carregando seu tatu-bola, ela parou, olhou bem a rua e perguntou: – Pai, Como será que esse tatu bolinha pode atravessar essa rua? Ao invés de dar uma resposta qualquer para ela, simplesmente devolvi a pergunta: Por que filha? O que você acha? E ela disse: – Bem eu acho que se ele virar bolinha vai ser mais fácil de atravessar essa rua. Por que filha? Porque como bolinha ele fica mais liso e pode escorregar mais rápido pra atravessar sem ser atropelado e ainda agora está ventando muito. – Legal filha, interessante. – Algo mais? – Sim pai, nessa rua assim em descida ele terá que atravessar em diagonal pra ir mais rápido né?

Essa série de perguntas em cima de como eventualmente um tatu-bolinha poderia atravessar uma rua, nos mostra grandes lições. Se nesse caso, como adultos, pais ou professores, nos precipitamos em apenas responder prontamente a indagação de uma criança, limitamos seu próprio potencial de explorar e descobrir por conta própria. Ao estendermos perguntas e ampliarmos as possibilidades, damos a elas autonomia. E quando damos autonomia, sentem-se desafiadas a pensar e a criar mais. Damos liberdade, mas também responsabilidade do pensar. Ao pensar o problema do tatu-bolinha, a Nana não apenas se colocou no lugar do outro, como também exercitou algo essencial para o aprendizado e para a criatividade, seu poder de intuição. Pela intuição é possível até afirmar que ela chegou a intuir sobre atrito por dizer que ao virar bolinha, ele ficaria mais liso e atravessaria mais rápido. E que para atravessar uma rua em declive talvez em diagonal poderia ser mais fácil. Mesmo estando longe de aprender qualquer coisa da física em sua forma acadêmica, a pequena curiosa utilizou-se de sua imaginação e intuição.

Precisamos, portanto, como pais e educadores, reaprender com as crianças, a perguntar mais e a deixar-se perguntar. Perguntar de forma curiosa, sem nos preocuparmos tanto com o simples, o óbvio ou com o que os outros vão pensar. Por que será que nos apegamos tanto a poucas perguntas apenas, quando sabemos que há várias possíveis para solucionar um problema ou criar algo novo? E a ouvir apenas uma única resposta, como se fosse a única verdade, sem deixar espaço para outras que podem abrir portas para novos mundos? Acontece em casa, na escola e acontece também no trabalho. Nos conformamos com respostas confortáveis, que nos colocam no menor risco possível.

Deveríamos gastar mais tempo questionando e perguntando para obtermos mais repertório, mais criatividade e essencialmente mais possibilidades. Crianças não restringem possibilidades, se alimentam delas. Acho que, talvez, deveríamos seguir dois caminhos inspirados nos pequeninos: gastar mais tempo perguntando para chegar a melhores respostas e ampliar nossas oportunidades, e também permitir e estimular que outros perguntem.  E porque não se lembrar no momento em que uma criança nos fizer perguntas, de ter a paciência e a sabedoria para ouvir e estimulá-la a continuar perguntando? Quem sabe assim, no futuro, tenhamos adultos menos sisudos, mais curiosos, criativos e com muito mais possibilidades que nós. Por que não?

*Artigo escrito por Jean Sigel, especialista em Marketing, Comunicação e Inovação, e co-fundador da Escola de Criatividade. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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