Há algum tempo, li uma pesquisa na revista Veja em que se afirmava que 94% dos professores da rede particular de ensino e 60% dos docentes da rede pública do Brasil consideravam a escola atual como ótima ou boa. Em outra pesquisa, realizada pelo INEP, em 2011, os pais que tinham filhos na escola pública foram perguntados sobre que nota atribuiam à escola dos seus filhos. A média obtida foi 8,6. Perguntado aos mesmos pais sobre as razões para uma nota tão alta estes passaram a detalhar as qualidades da escola: tem professor, merenda, sala de aula e, em alguns casos, até computador.
Voltando à pesquisa da Veja a qual me referi acima, o índice de pais da rede privada que consideram a escola ótima ou boa é de 92%. No mesmo levantamento, quando perguntado a esses pais as razões que os levaram a avaliar tão positivamente a escola, a maioria justificou sua ótima avaliação porque a escola particular é melhor do que a pública.
Ou seja, se analisarmos esses dados, a partir da avaliação de pais e professores, a grande maioria está muito satisfeita com o nosso sistema atual. Mas eu questiono: será mesmo? Acho que em termos de números pode ser. No entanto, no fundo não é o que observo no semblante dos nossos professores. Não vejo em muitos deles o brilho nos olhos que outrora via. E acredito que parte desse brilho tenha ido embora por realmente questionarem e verificarem a pouca eficácia do nosso sistema de ensino atual.
Os pais estão distantes e têm muita dificuldade em avaliar o sistema. Quando o fazem, geralmente comparam com o seu sistema, com a escola que tiveram – outro agravante desta pouca consciência de avaliar o sistema. No caso dos pais das escolas públicas, segundo dados do IBGE, cerca de dois terços deles não chegaram a concluir o ensino fundamental. Então, pela lógica, por sua experiência, a escola dos seus filhos com sala de aula, professores e merenda acaba sendo uma referência positiva se comparada ao que tiveram.
No caso dos pais das escolas privadas, para a maioria, o critério de boa escola está associado à quantidade de conteúdos ministrados, aulas dadas e infraestrutura compatível. Isso é atendido por praticamente todas as escolas. Mas será que esses são indicadores de qualidade?
Não é o que mostram os resultados de avaliações como as realizadas pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, em inglês). Quando analisados, estes resultados apontam para uma verdadeira crise no sistema educacional brasileiro. Os dados do Saeb 2017, divulgados pelo Ministério da Educação, mostram que 70% dos alunos do 3º ano do ensino médio têm nível insuficiente em português e matemática. Em verdade, apenas 4% destes alunos têm o aproveitamento adequado nestas disciplinas. Além disso, em pleno século 21, 14,3% das escolas brasileiras não possuem energia elétrica, esgoto, água e banheiro dentro do prédio, e 55,2% não possuem biblioteca ou sala de leitura. Com estes indicadores, não espanta que o Brasil figure entre os últimos colocados em todos os rankings divulgados pelo Pisa até o presente momento.
O professor e renomado pesquisador Cláudio de Moura Castro, um amigo com quem tenho a oportunidade de dividir ideias e algumas inquietudes sobre nosso sistema educacional, certa vez me disse: “o que pode salvar a nossa educação é só mesmo uma crise muito profunda. Sem ela não teremos força para mudar o modelo”.
Essa frase me incomodou muito e me fez pensar. Será que é preciso crise maior do que essa? Será que precisamos piorar ainda mais nossos já tão insignificantes resultados educacionais? Carregamos a lanterna da avaliação internacional do Pisa e aí vamos para onde?
Parece-me que precisamos de uma nova consciência social sobre o que seja educação de qualidade. Pais, professores, gestores, enfim, todos os cidadãos precisam desconstruir modelos ainda arraigados em suas mentes e que já não respondem mais às necessidades do contexto contemporâneo. Neste caso, muito mais do que apenas ter professor, infraestrutura, merenda e outros recursos, precisamos rever nossos modelos educacionais e desenvolver mentes capazes de pensar, de refletir, onde os estudantes sejam autores da sua história e capazes de resolver problemas sempre novos, com ética para a vida.
Urge, portanto, rever nossos referenciais. Se não o fizermos, iremos pagar um preço alto por termos parado no tempo e, inclusive, com um certo comodismo, termos influenciado negativamente na formação dos nossos filhos e alunos.
*Renato Casagrande é presidente do Instituto Casagrande. É conferencista, palestrante, escritor, pesquisador e consultor em Educação, Gestão e Liderança no Ambiente Educacional. Também é autor de livros e artigos publicados no Brasil e no exterior. Doutorando em Educação, é mestre e bacharel em Administração e licenciado em Matemática. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.
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