Posso estar enganado, claro, mas eu percebo certa tendência a combatermos alguns extremismos com tanta força que muitas vezes vamos parar lá no outro extremo. Há ideologias que pregam que o estado deve ter absoluto controle das coisas (um extremo), e isso é combatido com ideias de autorregulação, total e irrestrita liberdade de mercado (outro extremo). Os estados totalitários desvirtuaram a noção de coletivo e fizeram dele uma massa homogênea, matando a individualidade (um extremo). Já o neoliberalismo leva ao paroxismo a ideia de indivíduo, que perde referências políticas coletivas (outro extremo).
Tudo isso para falar de educação e do uso das chamadas novas mídias. Em um dos lados, está a escola tradicional, feita de giz, livros, quadro-negro e saliva, professor no centro, tal qual televisão, emitindo sinais para receptores desatentos.
Como desestabilizar essa noção tão século XVIII de escola?
As opções são muitas e fascinantes, mas tenho observado uma tendência de pensamento que julga que as novas mídias vieram para substituir todas as mídias tradicionais. Achamos que mídias tradicionais são sinônimo de velharias ultrapassadas. Porém, “mídia” não significa apenas internet, computador. “Mídia” é “meio” e, dessa forma, o livro, por exemplo, é uma mídia, na qual a escola precisa continuar a investir, pois não tem sido competente para formar leitores.
Falar em equilíbrio às vezes parece um recurso para ficar bem com todo mundo, não desagradando nenhuma ala. Mas nesse caso, tomar partido de uma escola modelo século XVIII é assinar seu atestado de óbito (assumi-la como um morto-vivo), assim como cair no outro extremo, o de encher a sala de aula com parafernálias hi-tech, pode fazer com que nos esqueçamos das relações pessoais, artificializando-as. Há ainda o perigo de não prepararmos o professor para usar tudo isso, fazendo-o, em vez de navegar, naufragar junto com seu aluno. A euforia multimídia e a sua simultaneidade de estímulos e linguagens podem embotar a capacidade de abrirmos um livro de 400 páginas e mergulharmos nele. Só nele. Embarcando no trem fantasma da velocidade contemporânea, a escola não tem tempo de avaliar a si mesma e a seus processos educativos, e age apenas de acordo com os sustos-reflexos das demandas da moda. Quer impressionar a comunidade alardeando a compra de muitos equipamentos modernos, mesmo que não saiba muito bem o que fazer com eles.
Não sou contra o uso destas mídias mais recentes (muito pelo contrário), mas às vezes parece que elas chegaram para resolver todos os problemas da educação, num tom salvacionista e redentor. Se a escola continuar com a mesma cabeça conteudista (preocupação exclusiva com a ideia de transmitir e “vencer” os conteúdos dispostos em grades), nada vai mudar, a não ser a constatação de que o Google faz isso muito mais bem feito e, nos moldes tradicionais, ele é mesmo o melhor professor do mundo. As tecnologias devem ampliar possibilidades educativas e não apenas representar a troca de um suporte por outro. Também não podem se esquecer de dialogar com mídias tradicionais e igualmente potentes pedagogicamente.
Entre uma escola que só pensa, mas não muda, e uma escola que só muda, mas não pensa, eu marcaria: nenhuma das alternativas.
>> Cezar Tridapalli é coordenador de Midiaeducação do Colégio Medianeira, instituição de ensino associada ao Sindicato das Escolas Particulares do Paraná – Sinepe/PR. Formado em Letras, especialista em Leitura de múltiplas linguagens e mestre em Estudos Literários. É escritor, autor do romance Pequena biografia de desejos (Ed. 7Letras).
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