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Adoro a frase do formalista russo Victor Shklovsky que diz – “Todas as palavras boas estão pálidas de exaustão.” Está impressa na obra Não sobre o amor – adaptada para o teatro pelo diretor paranaense Felipe Hirsch – e traduz um pouco do nosso mal-estar em tratar do mais entranhado dos sentimentos. Falar de amor soa piegas. Religioso. Uma apelação. Serve para resolver qualquer problema. E para dar a sensação de que não dissemos nada. O que, afinal, ainda não foi dito sobre esse assunto…

Mas a maré do amor parece estar mudando, o que pode favorecer para que nos livremos dessa vergonha romântica que nos persegue. Basta olhar nas prateleiras – e não propriamente nas gôndolas de romances açucarados, mas na dos livros de filosofia, sociologia e antropologia.
Suponho que desde o pós-Guerra, quando cidadãos de um mundo desiludido se recuperavam lendo o delicioso A arte de amar, do existencialista cristão Erich Fromm, não se via nada parecido. O amor está em alta. E se impõe como um assunto da grandeza do meio ambiente ou da saúde pública. Confesso que me emocionei ao ler a entrevista do nonagenário pensador francês Alain Badiou.

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Seu último trabalho, ainda sem tradução no Brasil, é o testamento de um homem no outono da vida. E trata, ora veja, do amor conjugal. Badiou afirma que aquelas pequenas [e grandes] negociações conjugais ensinam as pessoas as lições do tolerância, da convivência e da autoridade. Não fosse o casamento – tenha lá ele a forma que queira – teríamos uma sociedade ainda mais individualista e autoritária. Simples como isso. Difícil discordar que nos lapidamos em contato com outro.

O vovô Badiou usa da filosofia para nos levar agradecer pelas lições de paciência que nos são dadas pela panela de pressão, pela escola que é respeitar a escala de lavagem de louça. Como se não bastasse, outro francês, Luc Ferry, lança A revolução do amor, no qual chuta nossa canela e chacoalha nossos ombros.
Ora, atire a primeira pedra quem não diz que tudo piorou. Pois é. Ferry até concorda, mas não em 100%. De acordo com seus ensaios, realmente há poucos homens dispostos a dar a vida pela pátria, deixar-se matar para defender ideologias e coisa e tal. Mas haveria algo de profundamente humano nesses tempos sombrios em que nos metemos: defendemos, em qualquer situação, que amar o outro, cuidar de alguém, dedicar-se a um que precise, vale uma vida. E esse é o princípio da civilização.

Ferry nos deixa sem chão, pois pede de nós que olhemos com mais atenção para os que estão ao nosso redor, mesmo para aqueles que parecem dispostos a vender os rins da própria mãe. E pensando bem, acho que ele tem razão.

Em miúdos, nós, professores, falamos de amor com parcimônia. Geralmente dizemos “silêncio, pelo amor de Deus” ou “faça essa lição com amor, senão…” O amor não é um tema, pois o julgamos um valor moral ou uma fatalidade das químicas hormonais. A depender de Badiou e Ferry, podemos dar aula sobre a mais gasta das palavras, colocando-a no tempo e no espaço, tais como as guerras e as fórmulas.

A propósito, caso alguém se arvore falar de amor, não esqueçam de Amor líquido, de Zygmunt Bauman. E História do amor no Brasil, da hiperativa Mary Del Priore. Valem uma vida.

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>> José Carlos Fernandes é jornalista, doutor em Literatura Brasileira, professor nos cursos de Jornalismo da PUCPR e UFPR.

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