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Convidado a debater sobre os chamados jovens “nem nem”, isto é, aqueles que nem estudam nem trabalham, sinto, em um primeiro momento, o comichão de atribuir-lhes a responsabilidade por sua condição: “isso é falta de vontade, essa juventude não quer saber mais nada nos dias de hoje”, etc e tal. Mas foi só um comichão. Lembro-me de mim mesmo, jovem e entediado com a incrível lentidão das horas sob o céu azul leitoso de Fortaleza, entrecortado pelas andorinhas voando às tontas. Lembro-me de olhar para o nada da tarde que se arrastava como cágado e meus cadernos de escola a me esperar, a caneta estufada de tinta, os livros com enxaqueca de informações a lhes pestanejar.

CARREGANDO :)

Fui salvo de um destino de afasia por um amigo e um livro. Em uma conversa besta de portão –  o fim da tarde apontando a longa noite de novelas e filmes dublados – fiquei, sem saber por qual razão, curioso com algo que meu amigo dissera. Não tanto pelo conteúdo do que ele falara, mas pelo estilo que sabia não ser o dele, velho  conhecido das partidas de botão e perseguições aos calangos nos muros do seminário que ficava ao lado de minha casa.

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Ele então me falou que lera um livro. E gostara tanto do autor que agora lia um outro livro. “O cara é ótimo, precisa ver!”

E foi assim que me livrei, lenta mas inexoravelmente, de uma vida de desertos sem oásis, arco íris sem potes de ouro, apertos de mãos sem beijos na boca, aniversários sem presentes, loterias sem prêmios, velhice sem amigos. Eu havia descoberto a palavra que , como diz Calvino, é um fato que existe concretamente para mostrar a você o que deve ser imaginado.  Tudo o mais deixou de ser o que eu até então temera para se tornar o que eu nunca havia sequer sonhado.

Hoje, discutindo sobre os jovens que não estudam nem trabalham, para quem a vida não parece ter sentido nem esperança, penso em uma saída simples e redentora: dê um livro para eles. E depois outro e outro e outro…