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Tempo e Posteridade:

No tempo, todos vivemos. Coisa meio evidente, acho eu, Kant e Einstein que me desculpem. Daí o tempo passa, para muitos um pouco, para outros um pouco mais, e deixamos de viver. Procuramos não pensar nisso nunca, o que é uma besteira sem tamanho, mas é assim.

Fato: há o tempo e  estamos imersos nele e é só isso. Um tempo médio de 75 anos para os brasileiros e brasileiras. Três cavalos, como diz um ditado, não sei de onde. Gastamos um cavalo juntando conhecimento para daí gastar o outro cavalo ganhando dinheiro na esperança de que o terceiro cavalo possa pastar na sombra. E então o tempo passa a passar sem nós ou, pelo menos, sem a nossa presença como consideramos sermos nós.

Penso essas coisas banais sobre existir e deixar de existir diante da notícia da morte do Mandela. Aos noventa e tantos anos, já estava na hora de morrer, embora sempre queiramos que esse relógio meio que quebre ou, ao menos, atrase um pouco. Mas a hora chega, mais anos, como o Niemeyer, ou menos, como o menino que o padrasto matou, maldito. E chegou para esse homem.

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Aproveitou a vida o Mandela? Passou o tempo que lhe coube do jeito que achou o mais conveniente? Parece que não, muitos diriam. Mais de vinte anos na cadeia e antes, luta e perseguição. Depois, ainda, os desafios de uma vida pública desgastante. E os desgostos de um avanço milimétrico diante de uma desigualdade de perder no horizonte de tão grande.

E nós que lamentamos a morte dele, elogiamos a vida dele, louvamos sua existência, como vivemos nesse tempo que nos cabe ( ainda)? Se a dele é exemplo, não é razoável querermos imita-la?

Mandela, é fato, “desperdiçou” sua vida de shoppings e consumo, de aventuras e baladas, de investimentos e empreendimentos, de viagens à Disney e aos outlets de Orlando ou aos cassinos de Las Vegas ou, que seja, aos bubicos suspeitos  da tríplice fronteira. Desperdiçou, não há outra palavra. Poderia ter saído da prisão muito cedo, tivesse aceitado as condições dos afrikaners. Justificativas não faltariam, afinal, “uma andorinha só não faz verão”, “Roma não foi feita em um só dia”, “não adianta malhar em ferro frio” ou ( a que eu prefiro!) “ele não era um santo, um herói. Queriam que ele fosse quem, um Gandhi?”

Então, imitar a vida dele não parece uma boa. Mas então, por que tantos elogios?

Quem sabe porque o líder africano descobriu uma outra forma de estar no tempo. Descobriu que o tempo não acaba para nós necessariamente quando acabamos. A existência pode ficar reverberando nos corações e mentes por anos, séculos, milênios. É o que se chama de posteridade.

Essa parece ser, para mim,  a forma mais incrível de intensificar a vida. Tornando-a memorável. Mandela, o comunista, terrorista, prisioneiro, líder conciliador, presidente e agora mito que o diga. E nós que o admiramos também.

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